Falta de zelo da defesa quase custa R$ 32 milhões à CEEE
De R$ 32 milhões para R$ 250 mil. Uma redução que só foi possível porque a Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho aplicou os princípios de ordem pública da proporcionalidade e razoabilidade ao julgar ação em que o advogado de um sindicato receberia honorários milionários, a serem pagos pela Companhia Estadual de Energia Elétrica – CEEE. Relator do recurso de revista da CEEE, o ministro Barros Levenhagen apresentou proposta de reforma de decisão regional aceita unanimemente pela Turma.
Tudo começou há cerca de vinte anos. Em junho de 1988, o Sindicato dos Trabalhadores de Energia Elétrica no Estado do Rio Grande do Sul - Sinergisul ajuizou, como substituto processual, ação de cumprimento, com pedido liminar de pagamento do acordo normativo que previa o reajuste de 26,06%, índice da inflação de junho de 1987 (conhecido como Plano Bresser). Pleiteou também o pagamento de honorários advocatícios, alegando que os trabalhadores não dispunham dos meios para responderem pelos ônus econômicos decorrentes da demanda.
A CEEE, na sua defesa, deixou de atacar o pedido de honorários advocatícios do sindicato. Ao analisar a ação, a 15ª Vara do Trabalho de Porto Alegre (RS) julgou procedentes os pedidos e condenou a empresa ao pagamento dos honorários, por não ter havido contestação quanto a esse aspecto. A CEEE recorreu, então, ao Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, inclusive contra a condenação em honorários advocatícios.
Nessa fase recursal, houve acordo parcial quanto ao reajuste salarial. Empresa e o sindicato estabeleceram também que a base de cálculo dos honorários seria o valor do acordo, mas deixaram a questão da condenação aos honorários para o TRT decidir. Nessa mesma hora, o sindicato cedeu o crédito dos honorários ao advogado que o assistia. O acerto foi homologado, e o Tribunal Regional, quando apreciou o recurso ordinário da CEEE, negou-lhe provimento, mantendo, assim, a sentença quanto à condenação dos honorários, que não foram objeto de composição entre as partes.
A CEEE, então, interpôs recurso de revista ao TST, embargos à SDI e recurso extraordinário (para o STF), todos sem sucesso. Agora, na fase de execução, o caso volta novamente ao TST. Em 2002, o valor da condenação em honorários advocatícios estava em R$ 32 milhões. O relator, ao analisar que as partes se acertaram sobre os direitos pleiteados na ação de cumprimento, salvo em relação aos honorários advocatícios, deixados de fora e transferidos ao advogado do sindicato, com a base de cálculo ali previamente estabelecida, concluiu que a deficiência da defesa da CEEE atentou contra o princípio da moralidade administrativa do artigo 37, caput, da Constituição Federal.
Ficou delineada, assim, a possibilidade jurídica da atividade cognitiva complementar sobre os critérios a serem observados para o cálculo da verba honorária. O ministro Barros Levenhagen pôde, então, aplicar o parágrafo quarto do artigo 20 do CPC, onde se estabelece que nas causas em que for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, “os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz”. Para o relator, a CEEE se enquadra nessa lei por ser concessionária de serviço público na área de distribuição de energia elétrica, embora seja sociedade de economia mista.
Para fixar os honorários, o ministro considerou o grau de zelo do profissional, a comodidade do lugar da prestação de serviço (em Porto Alegre) e a constatação de não lhe ter sido exigida desmesurada atividade jurídica. Afinal, a ação de cumprimento envolveu questão exclusivamente de direito e, principalmente, por ter sido firmado acordo. Com base nesse entendimento, a Quarta Turma conheceu do recurso de revista e deu-lhe provimento para reformar o acórdão recorrido e fixar os honorários advocatícios em R$ 250 mil, valor atualizado até a data do julgamento.