TST afasta litispendência entre dissídio coletivo e ação individual
A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, em processo relatado pelo ministro Lelio Bentes Corrêa, afastou preliminar de litispendência entre uma ação individual proposta por ex-funcionária da Eletropaulo Metropolitana Eletricidade de São Paulo S/A contra sua demissão imotivada e a existência de dissídio coletivo suscitado pelo sindicato da categoria contra demissão em massa de trabalhadores supostamente protegidos por norma coletiva que lhes garantia estabilidade. De acordo com o relator, “não se verifica a possibilidade, nem sequer em tese, de reconhecimento de litispendência entre dissídio coletivo e ação individual trabalhista, em face da radical diferença do provimento jurisdicional pretendido em cada um dos casos.”
A autora da ação foi uma arquiteta que trabalhou na Eletropaulo entre 1985 e 1998. Na inicial, alegou ser detentora de garantia de emprego prevista no acordo coletivo de trabalho que vigorou até maio de 1999. Na cláusula 10ª do acordo, a empresa se comprometia “a não promover dispensa sem justa causa que não decorrer de descumprimento de obrigações contratuais, ou que não se fundar em motivo disciplinar, técnico-administrativo ou econômico”.
Na mesma época, a Eletropaulo demitiu mais de mil trabalhadores, levando o sindicato da categoria a suscitar dissídio coletivo de natureza jurídica pedindo que o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo) reconhecesse a validade da cláusula de garantia de emprego. À época em que a arquiteta ajuizou sua ação, a empresa havia interposto recurso contra a decisão do dissídio. Posteriormente, o dissídio foi extinto sem julgamento do mérito.
Na contestação, a empresa argüiu preliminar de litispendência, sustentando a improcedência do pedido de estabilidade, já que este também era objeto do dissídio coletivo. O juiz da 1ª Vara do Trabalho de São Paulo, porém, rejeitou a preliminar, afirmando que a medida cautelar seguida de ação principal – dissídio coletivo de natureza jurídica – não enseja a litispendência com dissídio individual de natureza econômica, como no caso. Deferiu, assim, o pedido de indenização no valor dos salários relativos ao período em que a arquiteta teria direito à estabilidade, e as demais verbas pleiteadas. A decisão foi mantida pelo TRT/SP no julgamento de recurso ordinário.
No recurso de revista ao TST, a Eletropaulo insistiu na reforma da decisão. Sustentou que o TRT, ao deixar de reconhecer a litispendência com o dissídio coletivo, ainda que extinto sem resolução do mérito, “desrespeitou o instituto da coisa julgada”, e que, nos termos do artigo 301, parágrafo 1º do Código de Processo Civil, a ocorrência de litispendência era clara.
O ministro Lelio Bentes observou que não há dúvida de que o ajuizamento de ação individual versando sobre o mesmo pedido e causa de pedir constantes de ação promovida pelo sindicato da categoria profissional, como substituto processual, configura litispendência. Mas esse raciocínio, entretanto, não se aplica aos dissídios coletivos, “cujo provimento jurisdicional reveste-se de natureza radicalmente diversa daquele resultante das ações individuais”.
O relator destaca que, em sede coletiva, o Tribunal, exercendo seu poder normativo, cria direito novo, não se baseando na interpretação de normas preexistentes. Nas ações individuais, o que se pretende é a aplicação das normas vigentes. “Não bastasse isso, tem-se que, no caso, a ação em relação à qual estaria caracterizada a litispendência foi extinta sem julgamento do mérito, por ausência de pressuposto para o desenvolvimento válido do processo”, assinalou em seu voto. “Nesse contexto, não se verifica sequer a formação de coisa julgada material”.
Superada a preliminar, a Turma rejeitou (não conheceu) o recurso, diante da ausência de provas de motivo técnico, administrativo ou econômico para justificar a demissão da arquiteta. “A decisão do TRT prestigiou a disposição contida no instrumento coletivo relativamente à garantia de estabilidade provisória no emprego”, concluiu o relator.