Estupro virtual: um crime real
Por mais que engatinhe o reconhecimento desse tipo de estupro no cenário jurídico atual, não podemos negligenciá-lo ignorando sua tipicidade, devendo, entretanto, ser punido como tal, pois a dignidade sexual do ser humano é uma só, ainda que figurando em dois mundos diferentes (o real e o virtual).
A Lei 12.015/09, que alterou a redação do artigo 213 do Código Penal (Estupro), trouxe muitas inovações e interpretações ao dispositivo citado, ampliando, consideravelmente, sua extensão de aplicação.
Para que possamos melhor avaliar o que vamos aqui expor, mister prestar muita atenção no que diz o artigo citado do diploma penal. Vejamos:
Estupro
Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Assim, a nova redação expõe uma gama de possibilidades de consumação do crime de estupro.
Trataremos neste breve esboço, onde, não temos a pretensão de esgotar o assunto, mas sim de abrir uma discussão acerca do tema, do estupro virtual.
Certamente o assunto abordado será novidade para muitas pessoas, inclusive da comunidade jurídica, pois pouco se discute esta modalidade do crime.
O tipo penal fala em CONSTRANGER ALGUÉM (que significa tolher a liberdade, implicando na obtenção forçada da conjunção carnal ou outro ato libidinoso), MEDIANTE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA (todo ato que extermina a capacidade de pensamento, escolha, vontade e/ou ação da vítima) A TER CONJUNÇÃO CARNAL (que segundo a doutrina majoritária se dá pela cópula pênis-vagina, ainda que exista uma corrente minoritária com pensamento em contrário) OU A PRATICAR OU PERMITIR QUE COM ELE SE PRATIQUE OUTRO ATO LIBIDINOSO (coito anal, oral, toques, masturbação, beijos lascivos...).
Dessa forma, é inequívoca a aceitação do delito em sua forma virtual com a aplicação da lei de forma real, pois esta modalidade de estupro em nada se diferencia daquela(s) conhecida(s) e, costumeiramente, cometida(s).
No crime de estupro a vítima não tem soberania sob seu pensamento, escolha, vontade e ação; há o emprego de violência ou grave ameaça e intenção (por parte do sujeito ativo) de servir à lascívia (desejo sexual).
Imaginemos os seguinte exemplos:
1) Uma pessoa, via web cam, mostra a outra que sua mãe está em seu poder e, ameaçando matá-la com uma arma apontada para sua cabeça, pede para que tire sua roupa (do outro lado da tela) com o intuito de satisfazer sua lascívia (desejo sexual), masturbando-se;
2) Um Hacker invade o computador de alguém e, com as informações pessoais importantes e confidenciais (como um vídeo de sexo caseiro) ali contidas, por meio de ameaças de divulgação do conteúdo, obriga o dono (ou a dona) do material a satisfazer sua lascívia, também via web cam (mostrando os seios, genitália, masturbando-se...).
Percebemos, claramente nos exemplos citados, que a tipicidade para o crime de estupro se consumar, fora atendida.
Em ambos os casos houve constrangimento mediante grave ameaça para a prática de um ato libidinoso (diverso da conjunção carnal), impossibilitando a vítimade optar por sua liberdade de pensamento, escolha, vontade e/ou ação.
Por mais que engatinhe o reconhecimento desse tipo de estupro no cenário jurídico atual, não podemos negligenciá-lo ignorando sua tipicidade, devendo, entretanto, ser punido como tal, pois a dignidade sexual do ser humano é uma só, ainda que figurando em dois mundos diferentes (o real e o virtual).