A importância do devido processo legal frente ao arbítrio (opiniões populares e um caso real na Corte Interamericana de Direitos Humanos)

A importância do devido processo legal frente ao arbítrio (opiniões populares e um caso real na Corte Interamericana de Direitos Humanos)

Eventualmente, ouço opiniões de pessoas acerca do obstáculo que é o Poder Judiciário para a punição dos “bandidos”, alegam que se deve bater, trancar, torturar e matar os mencionados celerados. Tudo isso, ao sabor do momento, dos ânimos exaltados por conta de notícias sem provas. Aqui, ouço uma...

Eventualmente, ouço opiniões de pessoas acerca do obstáculo que é o Poder Judiciário para a punição dos “bandidos”, alegam que se deve bater, trancar, torturar e matar os mencionados celerados.

Tudo isso, ao sabor do momento, dos ânimos exaltados por conta de notícias sem provas. Aqui, ouço uma dona dizer que o vagabundo que rouba, deveria ter suas mãos cortadas; ali, um senhor do povo diz que um toxicômano que mata, deveria ser espancado; acolá, um velhinho que tem a idéia de jogar os criminosos no mar etc.

Sem desprezar a dor dos que sofrem o delito, que é real, eu mesmo já fui vítima, e, muito menos, a corrigenda ao infrator, que é devida, pois não devem os honestos se acovardarem face aos desonestos, penso que a vingança privada e arbitrária e coisa do passado, que, evidentemente, não pode mais ser cogitada e, muito menos, ser exumada para os tempos atuais.

Por isso, venho aqui escrever algo sobre o devido processo legal. Para ilustrar, valho-me de um exemplo significativo, o caso Anzualdo Castro vs Perú, julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Essa é a história. Em dezembro de 1993, no distrito de La Perla, província del Callao, no Perú, Kenneth Ney Anzualdo Castro saiu da casa de seu pai às 16 horas, em direção à Universidade; assistiu às aulas com os amigos e, após, voltando para sua casa, tomou um ônibus. Seus amigos, viram-no entrar no ônibus, que, depois de um tempo de viajem, foi interceptado por um carro com indivíduos armados, que se identificaram como policiais. Estes indivíduos subiram no ônibus, pegaram Anzualdo, sem qualquer explicação, e, em seguida, partiram para rumo desconhecido.

Segundo apurado, Anzualdo, naquela noite, foi levado a um galpão escuro, interrogado, torturado, assassinado e teve seu corpo queimado e enterrado por agentes da inteligência do Estado, que alegavam, sem qualquer base, como justificativa a seus atos, que ele era do grupo terrorista Sendero Luminoso. Ao final do processo, por diversas violações a direito fundamentais, dentre elas o direito ao devido processo legal e a vida, a Corte condenou o Estado do Perú, que não provou, em momento algum, ser o senhor Anzualdo um terrorista, porque, nem ao menos indícios tinham. Ao que consta, era inocente.

Esse é um caso de “justiça” feito sem o devido processo legal. Uma tremenda seqüência de imbecilidades e de arbitrariedades, no mínimo. Isso recorda o nosso tempo de regime de exceção – ditadura militar.

Penso que com apenas esse exemplo já fica óbvio a importância do devido processo legal. Porque, ao invés de deixar o velhinho da rodoviária jogar os bandidos no mar, sem nenhum processo; ou o senhor de que falei espancar um vagabundo; ou mesmo, uma dona cortar as mãos de algum pobre diabo, tudo sem processo, reitero, correndo-se o risco de punir algum inocente, tal qual Anzualdo, deve-se julgar e apurar os fatos em conformidade com o devido processo legal.

Sobre o(a) autor(a)
Carlos Eduardo Neves
Analista de Promotoria (Assistente Jurídico) do Ministério Público do Estado de São Paulo. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Sorocaba (FADI). Foi estagiário, por 2 anos, na Defensoria Pública do Estado de São...
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