Nomeação à penhora de crédito oriundo de precatório da Fazenda Pública Estadual

Nomeação à penhora de crédito oriundo de precatório da Fazenda Pública Estadual

Analisa a possibilidade de nomear crédito de precatório nas Execuções Fiscais Estaduais.

Atualmente, os contribuintes brasileiros têm sofrido drásticas conseqüências oriundas de execuções fiscais que vêm sofrendo, seja no âmbito Municipal, Estadual ou Federal.

Uma das estratégias muito utilizadas pelo contribuinte, principalmente na esfera Estadual, é o oferecimento à penhora de crédito oriundo de precatório, vencido e não pago, seja ele do Estado ou de suas autarquias.

Pontes de Miranda (Comentários ao Código de Processo Civil, tomo X, Editora Forense, Rio de Janeiro, 1976, 1ª edição, pág. 471) define precatório como o ato processual mandamental pelo qual o juiz requisita (=precata) à Fazenda Pública o pagamento de um crédito, por intermédio do Presidente do Tribunal competente. Trata-se, portanto, de um direito de crédito.

É a saída mais proveitosa para o executado, pois ele adquire seu crédito por um valor muito menor do que o seu débito, garantindo assim, a execução fiscal, não correndo o risco de ver os bens da empresa serem penhorados. Dessa forma impede-se a paralisação das atividades do contribuinte, o que tornaria mais remota a possibilidade do Fisco ver solvido eventual crédito a seu favor.

E pior, poderia levar o contribuinte a trabalhar forçado na clandestinidade ou até mesmo na informalidade, trazendo prejuízos para o próprio Governo, que deixaria de arrecadar, bem como prejuízos para sociedade como um todo.

LIEBMAN define: “A penhora é o ato pelo qual o órgão judiciário submete a seu poder imediato determinados bens do executado, fixando sobre eles a destinação de servirem à satisfação do direito do exeqüente. Tem, pois, natureza de ato executório” (LIEBMAN, Enrico Túlio. Processo de execução. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 1946, n. 56, p. 95).

 Assim, a penhora é um ato executivo.

Para alívio dos contribuintes, o Poder Judiciário tem admitido o oferecimento à penhora de precatórios, tanto do Estado quanto de suas Autarquias, nas Execuções Fiscais Estaduais, reconhecendo o direito.

Coadunando com tal entendimento, em data recente o Superior Tribunal de Justiça, firmou seu posicionamento, através do julgamento dos Embargos de Divergência no Recurso Especial nº 834.956/RS, em que foi Relator o Exmo. Ministro HUMBERTO MARTINS, da 1ª SEÇÃO, também reconheceu a possibilidade de penhora de precatório de pessoa jurídica distinta da exeqüente, conforme demonstrada a decisão abaixo:

"EXECUÇÃO FISCAL – PENHORA DE PRECATÓRIO – PESSOA JURÍDICA DISTINTA DA EXEQÜENTE - POSSIBILIDADE.

  1. É pacífico nesta Corte o entendimento acerca da possibilidade de nomeação à penhora de precatório, uma vez que a gradação estabelecida no artigo 11 da Lei nº 6.830/80 e no artigo 656 do Código de Processo Civil tem caráter relativo, por força das circunstâncias e do interesse das partes em cada caso concreto.

  2. Execução que se deve operar pelo meio menos gravoso ao devedor. Penhora de precatório correspondente à penhora de crédito. Assim, nenhum impedimento para que a penhora recaia sobre precatório expedido por pessoa jurídica distinta da exeqüente.

  3. “Nada impede, por outro lado, que a penhora recaia sobre precatório cuja devedora seja outra entidade pública que não a própria exeqüente. A penhora de crédito em que o devedor é terceiro é prevista expressamente no art. 671 do CPC. A recusa, por parte do exeqüente, da nomeação à penhora de crédito previsto em precatório devido por terceiro pode ser justificada por qualquer das causas previstas no CPC (art. 656), mas não pela impenhorabilidade do bem oferecido.” (Rel. Min. Teori Albino Zavaski, AgRg no REsp 826.260/RS)."



Com o objetivo de tornar menos gravoso o processo executório à executada, verifica-se a possibilidade inserida no inciso VIII do art. 11 da LEF, já que o crédito do precatório equivale a dinheiro, bem este preferencial (inciso I, do mesmo artigo). Corroborando tal entendimento, colaciona-se ainda mais decisões do Superior Tribunal de Justiça, afirmando que o precatório equivale à dinheiro:


PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. PENHORA. DIREITO DE CRÉDITO PARA COM A FAZENDA PÚBLICA DECORRENTE DE AÇÃO JUDICIAL (PRECATÓRIO). POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.

1. Agravo regimental oposto contra decisão que proveu o recurso especial o agravado.

2. A nomeação de bens à penhora deve se pautar pela gradação estabelecida no art. 11, da Lei nº 6.830/80, e no art. 656, do CPC. No entanto, esta Corte Superior tem entendido que tal gradação tem caráter relativo, já que o seu objetivo é realizar o pagamento do modo mais fácil e célere. Pode ela, pois, ser alterada por força de circunstâncias e tendo em vista as peculiaridades de cada caso concreto e o interesse das partes.

3. No caso sub examine, o recorrente nomeou à penhora os direitos de crédito para com a Fazenda Pública, decorrente de ação judicial (precatório). Tem-se, assim, uma ação com trânsito em julgado, inclusive na fase executória, gerando, portanto, crédito líquido e certo, em função da expedição do respectivo precatório.

4. Com o objetivo de tornar menos gravoso o processo executório ao executado, verifica-se a possibilidade inserida no inciso X, do art. 655, do CPC, já que o crédito do precatório equivale a dinheiro, bem este preferencial (inciso I, do mesmo artigo).

5. A Fazenda recorrida é devedora na ação que se findou com a expedição do precatório. Se não houve pagamento, foi por exclusiva responsabilidade da mesma, uma vez que tal crédito já deveria ter sido pago. Trata-se, destarte, de um crédito da própria Fazenda Estadual, o que não nos parece muito coerente a recorrida não aceitar como garantia o crédito que só depende de que ela própria cumpra a lei e pague aos seus credores. Precedentes. 6. Agravo regimental não provido.

[AgRg no REsp 533844 / RS ; AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2003/0030854-0. Ministro JOSÉ DELGADO (1105). T1 -PRIMEIRA TURMA. Julgado em 14/10/2003. DJ 19.12.2003 p. 359].


EXECUÇÃO FISCAL - PENHORA - PRECATÓRIO - POSSIBILIDADE.1. O Estado não pode exigir penhora de dinheiro daquele a quem, comprovadamente, está devendo. A penhora feita sobre precatório emitido contra o Estado-exeqüente é válida. Tal constrição deve ser aceita, de bom grado, como se dinheiro fosse.2. A recusa de penhora realizada sobre precatório, que consiste num crédito líquido e certo contra o próprio cobrador-exeqüente, não atende ao Princípio da execução menos gravosa ao devedor (CPC, art.620).3. Precedentes. 4. Recurso provido.

(RESP 365095/ES – Rel. Min. Humberto G. de Barros – 1ª T. j. em 18/11/03)”.

Portanto, resta demonstrado que o ato praticado pelo contribuinte no sentido de garantir a execução fiscal com créditos oriundos de precatórios do Estado ou de suas Autarquias tem amparo legal e é, inclusive, aplaudido pelo Poder Judiciário, sendo este o entendimento empossado pelo Superior Tribunal de Justiça, órgão judicial máximo para apreciar o tema.

A posteriori, o destino seria hasta pública (adjudicação, arrematação, remição, etc.). Ora, evidente que um crédito sujeito a precatório não atende ao fim teleológico da praça pública. A pretensão do devedor é, efetuar a sub-rogação, conforme preceitua o art. 673, do Estatuto Processual Civil, in verbis:

Art. 673. Feita a penhora em direito e ação do devedor, e não tendo este oferecido embargos, ou sendo estes rejeitados, o credor fica sub-rogado nos direitos do devedor até a concorrência do seu crédito.”

Caso concreto, efetivada a sub-rogação do exeqüente no crédito penhorado, surge o instituto da confusão.


A confusão, como forma de extinção de uma obrigação, se deu origem no direito romano, baseado no principio da equidade e também nos princípio da razoabilidade.


No âmbito do direito tributário, o instituto da confusão “é espécie, pertinente à extinção dos créditos fiscais, por meio do pagamento indireto, inspirada pelo principio da supremacia da constituição, da segurança jurídica, da legalidade, da moralidade administrativa, da responsabilidade estatal, da justiça fiscal, vetores que repelem o dolo consubstanciado no recebimento de créditos, enquanto não pagos os correspondentes débitos entre os mesmos sujeitos, bem como pelos critérios lógicos-jurídicos da economia de tempo e de dinheiro, mas também na própria concepção moderna de direito, pois concorre para uma mais célere e efetiva satisfação de interesses que, antes antagônicos, se harmonizam por intermédio do principio da reciprocidade das obrigações”.1


Resta evidente, pois, que se o crédito de precatório penhorado for do próprio exeqüente, surgirá o instituto da confusão, que é forma de extinção do crédito tributário, visto que a Fazenda Pública não tem como sub-rogar-se em um crédito dela própria.

À toda evidência, não podem logicamente subsistir, numa mesma pessoa de direito público, as qualidades de devedora e credora de si própria.

Tanto é verdade, que enfatiza o Código Civil de 2002, em seu art. 381, cuja redação repete integralmente o art. 1.049 do código civil de 1916: "extingue-se a obrigação, desde que na mesma pessoa se confundam as qualidades de credor e devedor". E é exatamente o embasamento legal para extinção do crédito tributário por obra da confusão, providência essa de especial interesse no âmbito da Administração Pública que, por imperativo constitucional, deve guiar-se sempre segundo estrita legalidade (CF/88, art. 37, caput).

É que tendo em vista determinação do artigo 673, caput, do Código de Processo Civil, “o credor fica sub-rogado nos direitos do devedor até a concorrência do seu crédito” e sendo o credor da presente execução, devedor dos direitos penhorados, até mesmo pelo principio constitucional da celeridade processual, a reciprocidade das obrigações é fator determinante para a extinção do presente litígio judicial, via confusão – artigo 381 do Estatuto Civil.


Nessa diretriz, o saudoso e emérito professor Aliomar Baleeiro, também Ministro do Excelso Supremo Tribunal Federal, em seu clássico Direito Tributário Brasileiro, 11ª edição, editora forense, Rio de Janeiro, 2004, atualizado pela douta professora Misabel Abreu Machado Derzi, da Universidade Federal de Minas Gerais, às páginas 860 e 861, leciona:

A confusão, isto é, extinção determinada quando, por um fato ou ato jurídico, as qualidades de credor e devedor se reúnem na mesma pessoa, pode acontecer no direito tributário.”

Noutro vértice, não pode se olvidar que, o inadimplemento da autarquia também pode ser atribuído diretamente ao Estado, pois as autarquias são mantidas com repasses de recursos orçamentários do Estado. Assim, fica claro que o inadimplemento decorreu da falta de repasse (pelo Estado) dos recursos orçamentários destinados ao pagamento das obrigações decorrentes das sentenças judiciais passadas em julgado, nas quais foi condenado o IPERGS.


Sem dúvidas, a conseqüência lógica dos fatos é a sub-rogação e conseqüente extinção da execução mediante o instituto da confusão.

Dessa forma, por todos os argumentos anteriormente expostos, as empresas que vierem a sofrer Execução Fiscal, têm, no prazo de 5 (cinco) dias contados da citação, a possibilidade de nomear tais bens, não podendo se curvar a tais desmandos praticados pelo Poder Público. Desta forma, o investimento naquilo que se convencionou chamar de "compra de precatórios" continua sendo um planejamento tributário viável para muitas empresas, lícito e de retorno financeiro bastante vantajoso, haja vista os grandes deságios praticados no mercado.



1 Hugo Barros Uelze, RTFP 57/247, agosto/2004.

Sobre o(a) autor(a)
Marcelo Soares Benaventana
Advogado
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