O direito a saúde e a busca de sua efetividade

O direito a saúde e a busca de sua efetividade

Analisa de forma sistemática o direito à saúde previsto na Constituição Federal e nas normas infraconstitucionais. Enfoca a norma jurídica como criadora de direito e obrigações perante os indivíduos e o próprio Estado.

RESUMO: O presente trabalho analisa de forma sistemática o direito à saúde previsto na Constituição Federal e nas Normas infraconstitucionais. Enfoca a Norma jurídica como criadora de direito e obrigações perante os indivíduos e o próprio Estado. Mostra que a natureza jurídica as Normas concernentes à Saúde devem sair do plano da aplicabilidade e alcançarem o plano da efetividade social como forma de justificativa da existência do próprio Estado Democrático de Direito.


1. INTRODUÇÃO

Quando se fala em saúde ou mesmo em políticas públicas relativas à saúde, torna-se necessário compreender-se duas vertentes: a primeira diz respeito a um conceito mais restritivo de assistencialismo estatal dirigido a prevenir as ocorrências de doenças primárias [1] que podem afetam a sociedade como um todo. Tais políticas são dirigidas a prevenir, recuperar e restaurar a saúde daqueles que a têm comprometidas. Tal forma de interpretação não comporta aceitabilidade nos moldes jurídicos da realidade atual. A outra vertente, diz respeito à saúde em si, de dada um e de todos os indivíduos de uma sociedade, na apreensão do seu grau de higidez possível, o que significa compreender como e quanto às relações de produção e a organização da sociedade contribuem para assimilação da riqueza nacional, em benefício da qualidade e da extensão da vida de todos e de cada um de seus integrantes. Isso caracteriza a forma de expressão e exteriorização da dignidade da pessoa humana, da democracia, do direito à vida, da cidadania e submissão do próprio Estado ao império da lei.


2. O DIREITO A SAÚDE SOB O PRISMA CONSTITUCIONAL E LEGAL

A constituição é algo que tem, como forma, um complexo de normas (escritas ou costumeiras); como conteúdo, a CONDUTA HUMANA motiva pelas relações sociais (econômicas, políticas, religiosas etc.); como fim, a realização dos valores que apontam para o existir da comunidade; e, finalmente, como causa criadora e recriadora, o poder que emana do povo. Não pode ser compreendida e interpretada, se não tiver em mente essa estrutura, considerada como conexão de sentido, como é tudo aquilo que integra um conjunto de valores.

A ESTABILIDADE das constituições não deve ser absoluta, não pode significar imutabilidade. Não há constituição imutável diante da realidade social cambiante, pois não é ela apenas um instrumento de ordem, mas deverá sê-lo, também, de progresso social. Os princípios e valores adotados pela Constituição Federal de 1988 são vetores supremos que atraí o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem desde o direito à vida, sendo este concebidos como referência constitucional unificador de todos os direitos e garantias fundamentais do homem. Orbitando em torno do direito à vida tem-se a dignidade da pessoa humana como forma de exteriorização das ações estatais concebidas pela Constituição.

O conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma DENSIFICAÇÃO VALORATIVA que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem; não podendo reduzir-se o sentido da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos casos de direitos sociais ou ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana. Daí decorre que a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos existência digna (art. 170), a ordem social visará a realização da justiça social (art. 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não são meros enunciados formais, mas sim, indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana e do direito à vida, sendo que ambos possuem como pré-requisito lógico sistemático: a garantia do direito à saúde.

O DIREITO À SAÚDE (ART. 196 da CF/88) constitui a garantia dos demais direito. Sem este direito elementar os demais não podem aflorar e se efetivarem no plano da realidade jurídico-social. A saúde é o estado de completo bem-estar social físico, mental e espiritual do homem e, não apenas, a ausência de afecções e doenças. A Constituição Federal de 1988 elevou a saúde à condição de direito fundamental. Isso revela a preocupação de se constitucionalizar a saúde, pois os constituintes compreenderam que a vida humana é o bem supremo que merece amparo na Lei Maior. O intuito do texto constitucional é formidável. Todavia não se realiza na prática, pois a integral saúde física e mental do homem é algo, até o momento, inalcançável. O exemplo brasileiro é esclarecedor nesse sentido, porque a incolumidade do indivíduo, nos casos de doença ou mal-estar, não tem sido, do ponto de vista efetivo, direito de todos, nem tampouco, dever do ESTADO.

Quando se fala em ESTADO, muitas vezes, voltamos nos olhares à UNIÃO, ou seja, para o GOVERNO FEDERAL. Tal não deveria ocorrer, porque o ESTADO BRASILEIRO comporta dois outros ENTES FEDERATIVOS: os Estados Federados e os Municípios que possuem o mesmo dever perante o cidadão. O indivíduo como cidadão da República Federativa (art. 1º da CF/88) é o real detentor do poder (parágrafo único do art. 1º) e possui maior influência sócio-política diante desses entes do que em relação à União. A razão é simples: os lideres estaduais e municipais estão mais próximos da realidade social.

Numa visão sistemática da Constituição Federal, vemos que, quando o constituinte particionou a receita tributária e vinculou parte desta às ações de saúde (art. 77 do ADCT), o fez de modo que os cidadãos pudessem ter maior acesso e poder de fiscalização sobre as receitas que os Estados e Municípios aplicam nos serviços de saúde. Essa reflexão será objeto de outro estudo. Voltemos a nossa área de concentração.

O art. 196 da Constituição possui natureza programática. A caracterização das normas programáticas como princípios gerais informadoras do regime político e de sua ordem jurídica dá-lhes importância fundamental, como orientação axiológica para a compreensão do sistema jurídico nacional. O significado disso consubstancia-se no reconhecimento de que têm elas uma eficácia interpretativa que ultrapassa, nesse ponto, a outras do sistema constitucional ou legal, portanto apontam os fins sociais e as exigências do bem comum, que constituem vetores da aplicação da lei. São como satélites orbitando em tornos dos direitos e garantias fundamentais de modo a obter sua garantia e efetivação.

Qualquer providência do Poder Público, específica ou geral, que contravenha a esse fim é inválida e pode ser declarada sua inconstitucionalidade. Em consonância com a simetria constitucional, os demais entes federativos devem busca a efetivação das Normas da Constituição Federal, como está disciplinado nos arts. 1º c/c § 3º do art. 198 da CF-88. As normas jurídicas programáticas constituem sentido teleológico para interpretação, integração e aplicação das normas jurídicas. Elas estabelecem um dever para o legislador ordinário, condicional a legislação futura, com a conseqüência de serem inconstitucionais as leis ou atos normativos que as ferirem.

Nesse diapasão, o CDC – Código de Defesa do Consumidor è bem explicito nos seus arts. 83 e 84. Como micro sistema de normas de direito material e processual que é; o CDC prevê formas e técnicas de tutela jurisdicional específica voltadas para a realização de econômica comutativa e distributiva. A coletividade e o usuário individualmente considerado como consumidores devem ter facilitada a defesa dos seus direitos, podendo efetivar a tutela especifica segundo as técnicas mandamental ou executiva lato sensu. A doutrina tem ressaltado a necessidade de maior aproximação entre o direito e o processo, a fim de que esse possa cumprir com o seu escopo jurídico-constitucional de garantir uma efetiva, tempestiva e adequada tutela jurisdicional ao plano do direito substancial.


3. CONCLUSÃO

Todas as normas que reconhecem direitos sociais, ainda quando sejam programáticas, vinculam os órgãos estatais, de modo que, os Poderes da União (art. 2º da CF-88) não podem emanar-se contra esses direitos e, por conseguinte, estão obrigados (vinculados) à adoção de medidas necessárias à sua concretização.


4. REFERÊCIAS

MARANHÃO, Clayton. Tutela Jurisdicional do Direito à Saúde: (arts. 83 e 84, CDC). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. – (Temas atuais de direito processual civil / coordenação Luiz Guilherme Marinoni; 7).

SILVA, José Afonso Da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. São Paulo: Editora Malheiros, 6a Ed. 2002.

RODRIGUES NETO, Eleutério. Saúde: promessas e limites da Constituição. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2003.

SILVA, José Afonso Da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 6a ed. São Paulo. Ed. Malheiros, 2002.

BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 5a ed. rev. e atual. Até a EC nº 39/2002 – São Paulo. Ed. Saraiva,. 2003.



[1] Aquilo que podemos chamar de políticas sanitárias.

Sobre o(a) autor(a)
Livio Sergio Lopes Leandro
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