Juros bancários e função social da propriedade

Juros bancários e função social da propriedade

Análise dos juros bancários sob uma nova perspectiva constitucional.

M uito sem tem discutido desde 1.988 sobre a questão dos juros bancários, no meu entender sob ponto de vista completamente equivocado. Na ADI-4 o Supremo Tribunal Federal, ao contrário do que muitos afirmam, não decidiu que os Juros Remuneratórios cobrados pelos Bancos estariam LIBERADOS.

O que se decidiu foi de que a norma constitucional que tabelava os juros remuneratórios não seria auto-aplicável. No meu entender a decisão foi absolutamente correta, pois nenhuma Instituição Financeira do país conseguiria levar a cabo sua função social com tal limitação. Os Bancos necessitam contratar e remunerar seus funcionários, com vistas ao bom atendimento do público, investir na modernização e na melhoria da qualidade dos serviços prestados (hoje uma realidade), necessitam bem remunerar seus acionistas e os seus investidores, necessitam remunerar com dignidade as Cadernetas de poupança, pagar impostos, aluguéis, propaganda, etc.

Seria uma completa irrazoabilidade pretender que, com uma Taxa de Juros de 12% ao ano, os Bancos conseguissem "promover o desenvolvimento econômico e equilibrado do país".

O intuito desse trabalho, ao contrário do que se dá a entender, não é o de defender os Bancos, mas o de tentar dar uma nova visão sobre os Juros cobrados pelos Bancos.

O juro, como sabido, é a remuneração do capital mutuado, remuneração essa que é e deve ser cobrada pelo tempo em que o mutuário dispor do capital alheio. O Capital mutuado deve ser entendido como uma parcela do patrimônio, da propriedade privada. O Banco toma recurso de seus poupadores e se remunera mediante o empréstimo desses recursos aos tomadores de crédito.

O que há, hoje em dia, é uma distorção completa da função do crédito no país. Os lucros das Instituições Financeiras são elevadíssimos e as Taxas de Juros são fixadas em percentuais desarrazoados, desproporcionais. O Sistema Financeiro no Brasil tornou-se um fator gerador de iniqüidades, um fator de concentração de renda, e ninguém têm coragem de bater de frente com o Sistema Financeiro Nacional.

A Taxa de 12% ao ano inicialmente prevista no Texto Constitucional era e é inadmissível, aliás nunca passou de uma falsa promessa política irrealizável, aliás uma falsa promessa do Poder Constituinte, mas também as Taxas que estão sendo cobradas no Mercado Financeiro são inadmissíveis e intoleráveis.

Isso para se afirmar que no Brasil o Poder Constituinte se chama Sistema Financeiro Nacional. Os nossos políticos demonstraram, todos esses anos, que nunca passaram de fiéis prostitutas de luxo dos Banqueiros Nacionais e Internacionais. Se não seguir a regra do jogo, não tem dinheiro na Campanha.

O grande desafio que se estabelece é o de encontrar a Taxa de Juros ideal, ou seja, aquela Taxa que compatibilize o desenvolvimento do crédito no país e permita um desenvolvimento econômico e equilibrado do país. Este é o princípio e a função social do crédito do país.

O Judiciário não deve ser um Poder irresponsável e nem um Poder que sirva de instrumento à acumulação desmesurada, um Poder conivente com o aumento arbitrário de Lucros do Mercado Financeiro. Um Excelente parâmetro foi adotado quanto aos Contratos de Arrendamento Mercantil, onde, para desconhecimento de muitos, se estabeleceu que as contra-prestações não poderiam exceder a 75% do valor do bem.

Logo, nessa modalidade de operação de crédito, a Renda concedida (vejam que é impróprio falar-se em cobrança de juros em contrato de arrendamento mercantil) não poderá exceder a esse percentual.

Engraçado, nunca vi uma Ação Judicial a pleitear a limitação das Contra-prestações nos contratos de Leasing com base na Resolução n.º 2.309 do Conselho Monetário Nacional, o que demonstra o despreparo dos operadores do direito.

Enquanto fica-se discutindo e decidindo sobre teses já superadas pelo decidido na ADI-4, as normas positivas do Conselho Monetário Nacional não conseguem ter qualquer efetividade.

Outro ponto, o Judiciário precisa estabelecer um ponto para a abusividade das Taxas de Juros, não com base nas Taxas de Juros mensais, como até então se tem feito, mas com base nas Taxas anuais, de modo a compatibilizar a propriedade privada (o crédito) com a sua função social (art. 5.º da CF), com o princípio da justiça social (previsto no art. 170 da CF), de modo, penso eu, a firmar o entendimento da abusividade das Taxas de Juros, no prazo de vigência do contrato, onde juros e capital somados resultem em percentual superior ao dobro do capital mutuado.

Veja-se o seguinte exemplo:

Capital mutuado = R$1.000,00
Taxa Anual = 200%
Remuneração final do Capital emprestado = R$2.000,00
Total a devolver = R$3.000,00

Vejam que no exemplo acima, em 1 (um) ano, o agente financeiro recebeu com juros mais do que valeria o capital mutuado até o prazo final de vigência do contrato.

Aí reside a distorção, pois a final do prazo de vigência do contrato o mutuário devolverá ao mutuado quase 3 (três) vezes o valor do crédito concedido. Um abuso!!! Um absurdo!!!

A função social do crédito, qual seja a de promover-se o "desenvolvimento econômico e equilibrado do país", como princípio e objetivo do "Sistema Financeiro Nacional" não está sendo observada.

Em tal situação, o Judiciário deveria intervir para adequar a remuneração do capital mutuado aos parâmetros razoáveis, fazendo valer o princípio constitucional da "proibição do excesso", uma das máximas do princípio da proporcionalidade. Vejo aí um conflito inclusive com o "Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana".

No exemplo mencionado, ficaria o mutuário, no prazo de vigência do contrato obrigado a uma Taxa máxima de juros de 100% ao ano, ou seja, a metade daquela inicialmente prevista. A Taxa de Juros anterior representaria verdadeiro confisco privado e também representaria afronta ao princípio constitucional da função social da propriedade.

Lembrem-se, é assegurado o direito de propriedade, mas a propriedade deverá atender a sua função social, qual seja a de "promover o desenvolvimento econômico e equilibrado do país", de modo que se não admito 12% ao ano, também não admito as Taxas que estão sendo cobradas no mercado.

Sobre o(a) autor(a)
Fábio Santos da Silva
Advogado
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