A inadimplência nas locações de imóveis urbanos durante a pandemia de Covid-19

A inadimplência nas locações de imóveis urbanos durante a pandemia de Covid-19

A inadimplência, que é o descumprimento de alguma obrigação financeira, apesar de já fazer parte do cotidiano brasileiro em momentos anteriores ao da pandemia, ganhou conotação ainda mais preocupante, desde a chegada do novo coronavírus ao Brasil.

PRIMEIROS IMPACTOS DA COVID-19 NOS CONTRATOS DE LOCAÇÃO

A inadimplência, que é o descumprimento de alguma obrigação financeira, apesar de já fazer parte do cotidiano brasileiro em momentos anteriores ao da pandemia, ganhou conotação ainda mais preocupante, desde a chegada do novo coronavírus ao Brasil.

Isso ocorreu por conta da economia ter enfrentado diversos problemas advindos das tentativas de contenção da doença. Afinal, apesar de ser medida necessária para o controle da disseminação do vírus, o fechamento do comércio, por parte do Governo Municipal, prejudicou toda população, direta ou indiretamente, pois gerou, em grande escala, desemprego e redução de salários.

As consequências negativas mencionadas, tais como o desemprego, fizeram com que a capacidade de compra e de pagamento do cidadão brasileiro caísse, forçando o mesmo a reduzir gastos.

É notório que, em períodos de déficit econômico, principalmente quando este surge de forma inesperada, os devedores precisam decidir quais contas pagar. Sendo assim, geralmente, os pagamentos dos aluguéis de imóveis deixam de ser prioridade aos locatários e tornam-se um alvo do inadimplemento.

Dessa forma, os compromissos firmados entre locadores e locatários são abalados e, na maioria dos casos, descumpridos por falta de pagamento. E a referida inadimplência, por sua vez, é uma causa de extinção do contrato de locação, como prevê o art. 9º, inciso III, da Lei 8.245/91: 

Art. 9º. A locação também poderá ser desfeita:
III - Em decorrência da falta de pagamento do aluguel e demais encargos.

CONFLITOS JUDICIAIS ADVINDOS DO INADIMPLEMENTO

Diante da ideia de que os aluguéis são facilmente retirados das prioridades dos devedores, em tempos de crise financeira, e tendo em vista um país no qual existem aproximadamente 13 (treze) milhões de imóveis alugados, nota-se que o número de inadimplentes, nos contratos de locação, inevitavelmente cresceu.

Por conta disso, os locadores, que em sua maioria dependem do rendimento do aluguel para sobreviver, e os locatários, que perderam a condição econômica para cumprir com suas obrigações, passaram a fomentar o poder judiciário com ações de cobrança cumuladas com despejo e revisionais de contrato, respectivamente.

Neste ínterim, é necessário, quando interessado em propor uma ação, ou se defender de uma, buscar o auxílio de um profissional qualificado, que esteja atento às inovações doutrinárias e as alterações jurisprudenciais, pois são essas que regem o Direito, especialmente em momentos nunca vivenciados.

Por conta do tempo atípico vivido, o Senado Federal aprovou o projeto de decreto legislativo que reconheceu o Estado de Calamidade Pública no Brasil, devido à pandemia de COVID-19. A partir disso, alguns tribunais passaram a interligar a pandemia aos artigos 317 e 393 do Código Civil, afinal, a doença se enquadra em caso fortuito ou de força maior, corroborando a Teoria da Imprevisibilidade.

Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

Alguns Tribunais passaram também a decidir favoravelmente à suspensão do pagamento do aluguel por tempo determinado e autorizar o parcelamento da dívida sem juros, com base nos artigos mencionados.

Ou seja, devido ao impacto econômico em decorrência da pandemia e a emergência de saúde pública, os magistrados entendem que a intervenção judicial é forma de reequilibrar as obrigações. Exigindo, assim, que os operadores do direito estejam atentos às atualidades, para atender às demandas dos cidadãos.

SOLUÇÕES E PERSPECTIVAS FUTURAS

Neste panorama, em que cresce diariamente a quantidade de conflitos envolvendo contratos de locação, surge a necessidade de buscar formas eficazes para a solução dos problemas.

A primeira indicação, não só para estes casos, mas como para qualquer litígio, é a busca da resolução amigável, extrajudicial, ou seja, aquela que ocorre entre as partes, sem a movimentação da máquina judiciária. Uma vez que a autocomposição é extremamente célere e menos onerosa, quando comparada às tutelas jurisdicionais.

Vale ressaltar, novamente, a importância de contratar os serviços prestados por um advogado qualificado, para que seja garantido, tanto para o credor, quanto para o devedor, a certeza de um bom negócio. Enfim, uma vez compactuado o acordo, este far-se-á lei entre as partes, conforme o princípio civil do pacta sunt servanda.

Outrossim, caso as tentativas de consenso não sejam frutíferas, de fato, haverá a necessidade da propositura das ações cabíveis, uma vez que nenhuma das partes deve arcar com obrigações não estipuladas em lei ou contrato.

No caso do locador, quando não houver acordo, a melhor alternativa é a Ação de Despejo c/c Cobrança de Aluguéis e Acessórios, utilizando-se das motivações legais que preveem a extinção do contrato de locação, tais como, o descumprimento do mútuo acordo e a falta de pagamento, conforme elenca o art. 59, inciso I e IX, da Lei 8.245/91:

Art. 59. Com as modificações constantes deste capítulo, as ações de despejo terão o rito ordinário.
§ 1º Conceder-se-á liminar para desocupação em quinze dias, independentemente da audiência da parte contrária e desde que prestada a caução no valor equivalente a três meses de aluguel, nas ações que tiverem por fundamento exclusivo:
I - O descumprimento do mútuo acordo (art. 9º, inciso I), celebrado por escrito e assinado pelas partes e por duas testemunhas, no qual tenha sido ajustado o prazo mínimo de seis meses para desocupação, contado da assinatura do instrumento;
IX - A falta de pagamento de aluguel e acessórios da locação no vencimento, estando o contrato desprovido de qualquer das garantias previstas no art. 37, por não ter sido contratada ou em caso de extinção ou pedido de exoneração dela, independentemente de motivo.

Já no caso do locatário, a ação adequada é a Revisional de Contrato, podendo embasar-se nas teorias que fundamentam a alteração contratual, como exemplo, caso fortuito ou força maior (art. 393 Código Civil), teoria da imprevisibilidade (art. 317, 478, 479 e 480 do Código Civil) e a quebra antecipada do contrato (art. 477 do Código Civil).

Portanto, a recomendação é, sempre que possível, buscar um acordo entre as partes envolvidas no litígio, contudo, nos casos em que não houver essa possibilidade, a justiça deverá ser o caminho a ser traçado em busca da devida tutela jurisdicional.

Sobre o(a) autor(a)
Por Talita e Camila Na Boutique do Direito
• Talita de P. Jorge Lôbo Pós-graduada em Direito Público e bacharel pela Universidade Católica de Goiás, atual PUC Goiás. Especialista em Direito Imobiliário pela Fundação Getúlio Vargas. Membro da Comissão de Direito...
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