A necessidade de informar a localização da parte requerida e os princípios da instrumentalidade e da finalidade nos juizados especiais cíveis

A necessidade de informar a localização da parte requerida e os princípios da instrumentalidade e da finalidade nos juizados especiais cíveis

Trata de tema fundamental para que o acesso à justiça seja assegurado aos usuários dos juizados especiais cíveis. A possibilidade de envio de ofício a órgãos públicos para localizar a parte demandada.

Como bem afirma a melhor doutrina sobre a Lei 9.099/95, os Juizados Especiais Cíveis propiciaram o amplo acesso ao Poder Judiciário, tornando possível a solução de litígios que antes ficavam a margem de sua apreciação. Exemplos destas situações são inúmeros, sendo as soluções adotadas simples: concessão do ius postulandi à parte e a ausência de custas processuais.

Os princípios da simplicidade e da oralidade possibilitaram a superação de requisitos formais existentes no CPC, facilitando ainda mais o acesso à defesa do direito. Contudo, contrariando a corrente que prega a interpretação ampla e sistemática da norma, temos decisões proferidas restringindo direito das partes, sob as mais diversas alegações, que vão desde a interpretação obtusa até alegações de ordem cartorárias, afirmando-se que o atendimento de um certo direito das partes pode “tumultuar o funcionamento do juizado”.

É diante desta problemática que trazemos o tema: A NECESSIDADE DE INFORMAR A LOCALIZAÇÃO DA PARTE REQUERIDA E OS PRINCÍPIOS DA INSTRUMENTALIDADE E DA FINALIDADE NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS.

O art. 14, § 1º, da Lei 9.099/95 dispõe que o autor deve fornecer o endereço atual da pessoa em face de quem pretende demandar. Até este ponto, nada excepcionalmente diferente do que prega o art 282 do CPC. A grande diferença é quando a pessoa em face de quem se pretende reclamar encontra-se em local incerto e não sabido, ou em local “virtual” (sites de internet). A Lei 9099/95 veda expressamente a possibilidade da citação por edital, sendo tal vedação extremamente correta em nosso modesto entendimento. Contudo, a norma especial não veda a parte autora que pleiteie junto ao Juizado Especial o auxilio na instrumentalização do feito, qual seja, o envio de ofícios a órgãos e repartições públicas para que informem a atual localização do requerido, quando visível for a possibilidade de tais órgãos possuírem a informação.

O art. 13, caput, da Lei 9.099/95, expressa o princípio da finalidade dos atos processuais, qual seja, um ato processual lícito pode substituir validamente outro ato processual, desde que alcançado o objetivo pretendido com o mesmo. Também incide nos Juizados Especiais o princípio da instrumentalidade, o qual determina que os atos processuais são meios para se atingir determinados resultados. Sendo assim, o envio de ofício, por exemplo, a Receita Federal, para que informe o endereço cadastrado neste órgão de determinada pessoa ou sociedade comercial, atende claramente os princípios da instrumentalidade e da finalidade, permitindo o acesso do cidadão ao procedimento dos Juizados Especiais.

Diante da ausência de vedação da Lei 9.099/95, no que consiste o envio de ofício solicitado pela parte requerente, aplica-se o disposto no CPC, em seus artigos 339, 341 e 399, que, em suma, determinam que o magistrado deve requisitar a repartições públicas informações necessárias a comprovação do alegado pelas partes e que estas tem o dever de fornecer o que foi solicitado.

Não há que se falar em quebra de sigilo fiscal no mero pleito de fornecimento do endereço da sociedade comercial ou de pessoa física. Este entendimento encontra-se pacificado em nossos tribunais, in vebis:

PROCESSUAL CIVIL – EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO DESTINADO À SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL. ENDEREÇO. POSSIBILIDADE. Caso o pedido de expedição de ofício à Secretaria da Receita Federal objetive tão somente o fornecimento do endereço do executado, não há, in casu, quebra de sigilo fiscal. Possibilidade. Recurso Provido. (TJMG – AG 000.234.467-9/00 – 2ª C.Cív. – Rel. Des. Pinheiro Lago – J. 23.04.2002)

Sendo assim, impossibilitado está o magistrado, tanto no juízo comum quanto nos juizados especiais cíveis, de extinguir sem julgamento de mérito ou julgar improcedente pedido da parte, sem que antes atenda ao pedido de envio de ofício formulado pela mesma. Este entendimento também se encontra corroborado em nossos tribunais, conforme temos a seguir:

REVISÃO – AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS – DEVER DO JUIZ DE REQUISITÁ-LOS – Não é viável o julgamento pela improcedência da ação, com base na circunstância de não ter sido anexado aos autos documentos tidos como essenciais, quando a parte diligenciou no sentido de sua obtenção junto à autarquia previdenciária, sem, no entanto, ter obtido sucesso, cabendo, assim, ao juiz determinar a conseqüente requisição, nos termos do art. 399 do Código de Processo Civil, pois, a finalidade maior do processo é a busca da verdade real. Recurso a que se dá provimento, para anular a sentença recorrida. (TRF 3ª R. – AC 95.03.038185-1– 5ª T. – Relª Desª Fed. Suzana Camargo – DJU 26.10.1999 – p. 557)

As pessoas que buscam a solução de seus conflitos nos Juizados Especiais Cíveis devem contar com um especial tratamento por parte do magistrado, pois, no dizer do Mestre LUIZ FUX, "impor a essas pessoas o modo tradicional de solução dos conflitos é o mesmo que negar a elas o direito de exigir do Estado que lhes preste jurisdição”. Desta forma, o usuário dos Juizados Especiais Cíveis tem, sem sombra de dúvidas, o direito de requerer o envio de ofício a órgãos públicos com a finalidade de localizar o requerido, tendo assim assegurado o seu pleno acesso ao Poder Judiciário, sob pena de atentarmos contra determinação expressa de nossa Carta Magna.

Sobre o(a) autor(a)
Egisto Nicoletti
Professor
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