A acareação no processo administrativo disciplinar federal

A acareação no processo administrativo disciplinar federal

Tem o desiderato de se analisar a acareação no processo administrativo disciplinar federal, fazendo principalmente uma análise do art. 158 da Lei n° 8.112, de 11/12/1990, que disciplina a matéria e algumas incursões doutrinárias sobre o assunto.

O presente artigo tem o desiderato de se analisar a acareação no processo administrativo disciplinar federal, fazendo principalmente uma análise do art. 158 da Lei n° 8.112, de 11 de dezembro de 1990, que disciplina a matéria e algumas incursões doutrinárias sobre o assunto.

Quando houver contradição entre depoimentos das testemunhas deverá ser feita uma acareação entre os depoentes, como está escrito no § 2º do art. 158 da Lei n.º 8.112/90.

Acareação, em sentido dicionarizado, corresponde ao “ato de acarear, acareamento, careação”. [1]

Durante a instrução, poderá haverá conflito entre o depoimento do acusado com os depoimentos das testemunhas, entre os depoimentos dos acusados e entre testemunhas. Nesse caso, proceder-se-á a acareação para esclarecer as diversas divergências apontadas no processo administrativo disciplinar.

A Lei n° 8.112/90, art. 155, disciplina que:

“Na fase do inquérito, a comissão promoverá a tomada de depoimentos, acareações, investigações e diligências cabíveis, objetivando a coleta da prova, recorrendo, quando necessário, a técnicos e peritos, de modo a permitir a completa elucidação dos fatos”.

Léo da Silva Alves ensina que a acareação deve ser observada com maior cautela, pois há razões de cunho prático e de ordem jurídica a recomendar prudência. A acareação é um recurso utilizado para dirimir dúvidas remanescentes nas declarações de acusados, vítimas e testemunhas. Na busca da certeza jurídica administrativa, a exemplo das autoridades policial e judicial, pode valer-se desse expediente. Também, manifesta que o legislador foi infeliz na redação do art. 155 supracitado e faz a seguinte argumentação:

“(...) ao utilizar o verbo promover, numa condição imperativa. Assim, pela estrita leitura da norma, tem-se que a comissão disciplinar está obrigada a desenvolver todas as medidas arroladas no dispositivo, quer sejam ou não necessárias. E pior: a obrigação não se limita a uma só acareação, vez que a imposição está no plural. Melhor seria se contemplasse uma faculdade: poderá promover a tomada de depoimentos, acareações... Dessa forma, a norma seria autorizativa, permitindo que a Administração, no seu exercício de controle da disciplina, utilizasse, quando necessário, esses procedimentos. Mas, na prática, o bom senso há que prevalecer. Afinal, a lei tem que ser interpretada inteligentemente, de forma a não conduzir ao absurdo”. [2]

Segundo os magistérios de Ernomar Octaviano e Átila J. Gonzalez [3] a acareação deverá apenar se dar em casos especialíssimos, já que o comum é o acareado firmar-se no seu ponto de vista, na presença do contrário, o que, por constranger a ambos, perante outras pessoas, acarreta, não raro, problemas à comissão processante.

Ao se verificar divergências nos depoimentos, o presidente da comissão disciplinar deverá fazer a devida intimação das pessoas, cujos depoimentos foram conflitantes, fazendo a indicação do local da sede da comissão, dia e hora para a respectiva acareação.

O Código de Processo Penal - CPP, que se aplica subsidiariamente ao processo administrativo disciplinar, traz, no art. 229, parágrafo único, que os acareados serão reperguntados, para que expliquem os pontos de divergência, reduzindo-se a termo o ato de acareação, que será assinado pelos acareados, pelos integrantes da comissão e pelo secretário.

Em outro artigo do CPP (art. 230) há a determinação de que se ausente algum dos intimados para a acareação, ao que estiver presente dar-se-á a conhecer os pontos de divergência, consignando-se o que explicar ou observar.

Antônio Carlos Palhares Moreira Reis chama a atenção para o fato de que o pedido de acareação, formulado pelo acusado ou seu representante legal pode ser indeferido pela comissão e esse fato pode, às vezes, causar nulidade do processo. Esclarece que “É necessário que a Comissão entenda que os fatos já estão suficientemente esclarecidos, e assim, indefira o pedido de acareação”. [4]

Há de se destacar que o depoimento de testemunha pode ser traslado de um processo para outro, e seu peso será total, desde que corroborado tal ato processual pelas demais provas coletadas durante a instrução processual disciplinar.

O Supremo Tribunal Federal - STF já se pronunciou sobre o assunto quando decidiu que:

“Mandado de Segurança. Decreto de demissão de policial federal. Ato apodado de nulo, por resultar de inquérito eivado de irregularidades e, ainda, por haver sancionado ilícito configurador de crime ainda não julgado. Pretendida reintegração no cargo. Inexistência de óbice a que dirija inquérito administrativo quem participou de mera diligencia policial, na apuração de fatos delituosos em que acabou por enredar-se o servidor. . Irrelevância da ausência de acareação e da utilização, no processo disciplinar, de prova testemunhal emprestada, se foi ela reforçada pela reinquirição dos depoentes. Despicienda, face ao principio da independência das jurisdições, a circunstancia de não se haver ultimado a ação penal relativa a uma das infrações disciplinares, configuradora de crime, a qual, de resto, não era a única punível com a demissão. Segurança denegada”. [5]

Deve-se ressaltar que o acusado durante a acareação tem o mesmo direito de permanecer calado. O acusado não é proibido e nem é obrigado a falar.



[1] FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986, p. 23.

[2] ALVES, Léo da Silva. Interrogatório e confissão no processo disciplinar. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, pp. 69-70.

[3] OCTAVIANO, Ernomar, GONZALEZ, Átila J. Sindicância e processo administrativo. São Paulo: Leud, 1999, p. 144.

[4] REIS, Antônio Carlos Palhares Moreira. Processo disciplinar. Brasília: Consulex, 1999, p. 146.

[5] Mandado de Segurança n° 21330 DF; Relator para o Acórdão: Ministro Ilmar Galvão; Relator: Ministro Marco Aurélio; Votação: por maioria; Resultado: indeferido; Publicação: DJU, em 11/12/92, p. 23662.

Sobre o(a) autor(a)
João Barbosa Martins
Funcionário Público
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