Telemar é condenada por terceirização ilícita e falso estágio
A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a condenação
imposta à Telemar Norte Leste S/A (Telepisa) por prática irregular de
terceirização e fraude ao instituto do estágio. Inquérito civil público
da Procuradoria Regional do Trabalho e fiscalização da Delegacia
Regional do Trabalho do Piauí constataram que a companhia substituiu
ilegalmente seus empregados pela mão-de-obra estagiária e terceirizada,
com o objetivo de fraudar a legislação trabalhista.
De acordo com o inquérito, por meio de aparentes contratos com
instituições de ensino, a companhia telefônica do Piauí admitiu em seus
quadros "empregados disfarçados de estagiários", que chegaram a
representar 41% da mão-de-obra. A companhia também admitiu pessoal
terceirizado para desempenho de sua atividade-fim, por intermédio de
empresas de empresas de locação de mão-de-obra, o que é vedado pelas
leis trabalhistas.
A Telepisa recorreu ao TST contra decisão do TRT do Piauí (22ª
Região), que a condenou a reconhecer o vínculo de emprego e, com isso,
pagar os direitos trabalhistas dele decorrentes a todos os estagiários
e terceirizados contratados irregularmente. O Ministério Público do
Trabalho do Piauí (MPT/PI) ajuizou a ação civil pública após denúncia
do sindicato dos telefônicos de que a quase totalidade dos estagiários
exercia atividade de telefonista, que nada tem a ver com seus
currículos escolares.
A decisão regional foi mantida pela Primeira Turma do TST, que
rejeitou (não conheceu) o recurso da Telepisa. O relator do recurso foi
o juiz convocado Guilherme Augusto Caputo Bastos. Preliminarmente, a
Telepisa questionou junto ao TST a legitimidade do MPT/PI para propor
esse tipo de ação. A preliminar foi rejeitada pelo relator:
"Tratando-se de ação civil pública buscando a defesa de interesse
social relevante, o trabalho, direito constitucional indisponível, a
Justiça do Trabalho há de prestigiar a atuação do Ministério Público".
Superada a preliminar, o juiz Caputo Bastos fez uma análise
minuciosa da questão em um voto de treze laudas, no qual apontou as
razões que levaram o TRT/PI a concluir pela fraude à legislação
trabalhista. Segundo Caputo Bastos, para se chegar à conclusão diversa
da que chegou a instância regional, seria preciso rever fatos e provas,
o que é vedado pela Súmula 126 do TST.
De acordo com o TRT/PI, à época da fiscalização, a empresa mantinha
em seus quadros estagiários da Universidade Federal do Piauí (UFPI),
Centro Federal de Educação Tecnológica do Piauí (Cefet-PI) e do Serviço
Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), que representavam 41% da
mão-de-obra da empresa.
Quanto aos alunos, na UFPI, não havia sequer convênio para
concessão de estágio nem foram celebrados termos de compromisso de
estágio extracurricular. As atividades desenvolvidas pelos estudantes
não tinham nenhuma relação com seus cursos (Direito, Economia,
Comunicação Social etc). Oficialmente, eles foram recrutados para
realizar pesquisas de opinião junto aos usuários da companhia
telefônica, para medir o grau de satisfação com os serviços.
Para utilizar alunos do Senac, a Telepisa celebrou contratos
particulares de estágio mas sem a necessária interveniência da
instituição de ensino. O suposto interesse da Telepisa era capacitar e
qualificar os estágios para exercer a ocupação de telefonista na cidade
de Teresina. Dos estagiários da UFPI e do Senac era exigida a prestação
de serviços em regime de horas-extras.
Quanto aos estudantes do Cefet, foi constatado o desempenho de
funções incompatíveis com as respectivas áreas de formação. O objetivo
do convênio era o de complementação educacional nas áreas compatíveis
com os cursos dos alunos das últimas séries, mas eles atuavam
basicamente como telefonistas. Os alunos do Cefet também eram
submetidos a trabalhos extraordinários e tinham carga horária diária de
oito horas. A legislação limita em cinco horas a carga horária de
estágio.
No acórdão do TRT/PI, mantido pela Primeira Turma do TST, foi dito
que a Telepisa "engendrou um verdadeiro labirinto para maquilar
relações de trabalhado agasalhadas pela CLT, tendo como fim primordial
o não-pagamento de obrigações trabalhistas". O tribunal constatou ainda
que a empresa não providenciou o seguro contra acidentes pessoais
previsto na Lei nº 6494/77, que regula o instituto do estágio.
De acordo com o TRT/PI, "considerando que o estágio antecede a
relação de emprego, eis que prepara o estudante para o mercado de
trabalho, houve uma inversão desta ordem, no caso em espécie, na medida
em que a empresa admitia trabalhadores para prestar serviços
necessários às suas atividades e, posteriormente os transformava em
estagiários, sob a máscara de termos de compromisso".
O TRT/PI constatou que a partir de fevereiro de 2000, houve um
"crescimento vertiginoso" no número de estagiários da UFPI, coincidindo
com o período em que a Telepisa intensificou seu plano de demissões.
Para o tribunal regional ficou claro que a empresa se utilizou de
mão-de-obra estagiária irregular quando adotou um programa de demissão
gradual de seus empregados.
Para a terceirização irregular, a Telepisa utilizou as empresas Asa
Express e Case Consultoria, Processamento e Treinamento Ltda., que
admitiam telefonistas e atendentes de serviço que já trabalhavam na
Telepisa sem registro. As moças eram selecionadas pela Telepisa para
atuar no "call center" e então encaminhadas às empresas interpostas. De
acordo com o inquérito do MPT/PI, o processo de contratação de
empregados pelas empresas terceirizadas iniciava-se no setor de pessoal
da Telepisa, onde eram acertadas todas as condições de trabalho.
As telefonistas da Telepisa recebiam salário de R$ 800,00 enquanto
as tercerizadas ganhavam R$ 226,00 mensais para exercer as mesmas
funções. De acordo com o TRT/PI, à medida que ia demitindo seus
empregados, a Telepisa encaminhava aqueles que lhe interessavam às
empresas prestadoras de serviços, que os contratava, e estes retornavam
às atividades na companhia.
O TRT/PI condenou a Telepisa "a registrar como seus, em livro
próprio e na CTPS, retroativamente à data de admissão cada um dos
trabalhadores que lhe prestaram serviços de natureza empregatícia, mas
sob o manto do estágio, bem assim a apagar todos os direitos
trabalhistas pertinentes". A mesma decisão foi tomada em relação aos
trabalhadores terceirizados que prestaram serviços não eventuais e
típicos de atividade-fim à Telepisa.