Demissão de servidor é anulada em razão de desproporcionalidade da medida
O policial federal José Ferreira Sobrinho obteve a suspensão de sua
demissão em razão de processo disciplinar, devido à
desproporcionalidade da medida da Administração. No entanto outra
punição, menos severa, não foi descartada pela decisão da Terceira
Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao conceder em parte
mandado de segurança contra a Polícia Federal.
Sobrinho teria participado da emissão de portes de arma federais sem a
devida exigência de exames teóricos e práticos dos pretendentes. A
Comissão Processante o responsabilizou por negligência e descumprimento
de atribuições policiais. Contra a decisão da Comissão, o policial
apresentou mandado de segurança ao STJ com o objetivo de obter a
declaração de nulidade do processo administrativo em razão de inúmeros
vícios procedimentais.
Para o relator, ministro Hélio Quaglia Barbosa, a falta de oportunidade
de ampla defesa e contraditório ao policial na sindicância, sustentada
no pedido de segurança, não foi verificada. Além disso, por não servir
diretamente à aplicação de sanção, tal procedimento "prescinde da
observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, por se
tratar de procedimento inquisitorial, prévio à acusação e anterior ao
processo administrativo disciplinar, no qual, por sua vez, após o termo
de indiciação e a notificação prévia, o servidor passa à condição de
acusado, advindo, daí em diante, o direito à ampla defesa, com todos os
meios e recursos admitidos em direito", ressaltou o ministro.
Também não haveria nulidade na quebra de sigilo das investigações e no
processo, já que os trabalhos são sigilosos apenas quando necessário à
elucidação do fato ou pelo interesse da Administração. Ainda que devam
ser resguardadas a honra e a moral do servidor, o vazamento de
informações à imprensa não macula o processo administrativo, já que o
sigilo é garantia da Comissão Processante e não do acusado. O mandado
de segurança, afirma o ministro, também não seria a via adequada para
verificar eventuais abusos dos membros da Comissão.
A defesa alegava ainda a existência de coação no curso do processo, o
que estaria comprovado no próprio relatório final da comissão, ao
afirmar que a Polícia Federal deve, "em razão de sua finalidade,
exercer sua função coercitiva interna para manter a disciplina de seu
quadro de funcionários policiais". O ministro Hélio Quaglia Barbosa, no
entanto, esclarece que, "no contexto em que inserida a expressão
‘exercer sua função coercitiva’, esta deve ser entendida como ‘exercer
seu poder disciplinar’, o que, de maneira alguma, deve ser confundido
com coação, que consiste na pressão física ou moral exercida sobre a
pessoa, seus bens ou sua honra, para obrigá-la a fazer algo que não
represente sua vontade".
Proporcionalidade
O ministro considerou haver excesso na sanção aplicada pela Polícia
Federal. O acusado teria sido o responsável por um número
insignificante de fichas de avaliação para a obtenção do porte de arma,
apenas quatro em um universo de mais de 300 verificadas no âmbito do
processo. Ainda, outros indiciados, com carga de responsabilidade muito
maior devido à posição hierárquica e também por figurarem entre um
número muito maior de ocorrências, tiveram apenamento menos severo,
submetidos, no máximo, à suspensão.
A partir de uma ressalva do ministro Hamilton Carvalhido, o relator
enfatizou que a decisão não contraria o entendimento firmado na Seção
no MS 7.861, de 11 de setembro de 2002, de que "a aplicação do
princípio da proporcionalidade, no âmbito do Poder Judiciário,
circunscreve-se ao campo da legalidade do ato demissionário, sendo-lhe
defesa qualquer incursão no mérito administrativo, a fim de aferir o
grau de conveniência e oportunidade da medida, especialmente quando há
perfeita sintonia entre a prova pré-constituída juntada aos autos e o
ato administrativo".
Conforme esclareceu o voto do ministro Paulo Gallotti, há
peculiaridades no caso concreto que autorizam a aplicação do princípio
da proporcionalidade, sem que isso signifique ofensa à jurisprudência
da Seção. Também a ministra Laurita Vaz ressaltou a peculiaridade da
situação, verificada igualmente em processo de sua relatoria citado
como precedente pelo relator. O ministro Gilson Dipp ainda lembrou que
a aplicação do princípio da proporcionalidade em "todos" os mandados de
segurança contra a Administração, defendida por tempos na Seção pelo
ministro Vicente Leal, é tese há muito vencida e superada. A decisão
foi unânime.