Contribuição para previdência privada não é tema trabalhista
A Justiça do Trabalho (JT) não é o órgão judicial encarregado de
solucionar causa envolvendo contribuições recolhidas para instituição
de previdência privada. Sob esse entendimento, a Primeira Turma do
Tribunal Superior do Trabalho deferiu um recurso de revista interposto
pela Rede Ferroviária Federal - RFFSA (em liquidação extrajudicial) e
Fundação Rede Ferroviária de Seguridade Social - Refer. Com a decisão
do TST, relatada pelo ministro Lélio Bentes Corrêa, foi anulada
condenação imposta a ambas pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª
Região (com jurisdição em Minas Gerais).
O TRT mineiro manteve condenação imposta pela primeira instância,
que reconheceu a um grupo de ferroviários aposentados o direito ao
recebimento dos valores descontados de seus salários a título de
contribuição para o plano de previdência privada e revertidos para a
Refer. Os descontos eram efetuados pela empregadora, a RFFSA, sob o
título de "reserva de poupança".
Segundo o órgão de segunda instância, a devolução dos valores aos
inativos era devida, uma vez que recolhidos pela Rede Ferroviária. Além
disso, os descontos foram repassados a uma entidade de previdência
privada instituída pela própria empresa. Essas circunstâncias levaram o
TRT a entender que a controvérsia judicial teve origem na relação de
trabalho mantida entre os segurados e a RFFSA, o que teria atraído a
competência da Justiça do Trabalho para o exame da questão.
No TST, RFFSA e Refer argumentaram a nulidade da decisão regional e
a própria impossibilidade da Justiça do Trabalho processar e julgar o
tema. Para tanto, sustentaram a natureza estritamente civil da
reivindicação formulada pelos aposentados. A inobservância dessa
característica teria resultado em violação do art. 114 da Constituição
Federal (competência da JT) e contrariedade ao Enunciado nº 106 do TST.
O dispositivo constitucional prevê que "compete à Justiça do
Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre
trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes de direito público
externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do
Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras
controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios
que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive
coletivas".
Apoiado na definição do texto constitucional, o ministro Lélio
Bentes esclareceu que o ponto central para o julgamento do recurso
seria o de estabelecer se o pedido dos ferroviários decorreu ou não da
relação de trabalho mantida com a RFFSA.
Para o relator, a reivindicação dos inativos não decorreu da
relação de emprego. "Na realidade, o vínculo formado advém da livre
opção do empregado que aderiu ao Plano de Previdência instituído pela
RFFSA", afirmou. A conclusão foi reforçada pelo fato da empregadora
"ter atuado como mera arrecadadora das contribuições estatutárias".
A constatação da natureza civil do contrato entre os ferroviários e
a entidade de previdência privada levou ao deferimento do recurso de
revista e à anulação do acórdão do TRT. Em conseqüência, os autos serão
remetidos a uma das Varas Cíveis da Justiça Comum de Belo Horizonte
(MG), a quem caberá decidir se os inativos têm ou não direito à
devolução das parcelas descontadas para a Refer.