Diagnóstico errado de laboratório dá direito a indenização por danos materiais e morais
O erro grosseiro no diagnóstico por parte do laboratório médico capaz
de causar sofrimento intenso à paciente e colocar em risco a sua vida é
passível de indenização por danos materiais e morais. Essa foi a
decisão, tomada por unanimidade, que levou a Terceira Turma do Superior
Tribunal de Justiça a fixar indenização em favor da paciente Cláudia
Renata de Baldaque Danton Coelho, a ser suportada pela Clínica
Radiológica Luiz Felippe Mattoso, do Rio de Janeiro.
A Terceira Turma fixou a indenização a ser paga à paciente em R$ 80
mil, a título de danos materiais, tendo em vistas as despesas que ela
foi obrigada a efetuar com os exames posteriores, tornados necessários
em razão do erro cometido no primeiro exame radiológico, e 200 salários
mínimos pelos danos morais por ela sofridos. A autora havia pedido a
fixação dos danos morais em cinco mil salários mínimos e o reembolso de
todos os exames realizados pela Clínica Luiz Felippe Mattoso. A ação da
paciente foi julgada improcedente pela juíza de primeira instância, que
entendeu ter realmente havido erro por parte do laboratório no laudo
apresentado, mas que não se tratava de erro grosseiro. Considerou, além
disso, não haver nexo de causalidade entre os males apresentados pela
autora e o laudo elaborado pela clínica.
A paciente apelou para o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de
Janeiro, que, por maioria, acolheu seu recurso para condenar o
laboratório ao pagamento da indenização pedida. Mas, logo em seguida,
por meio de embargos infringentes, já que a decisão fora tomada por
maioria, o laboratório conseguiu reverter a posição do Tribunal, que,
também por maioria, acabou confirmando a decisão que inicialmente
julgara improcedente o pedido. Daí o recurso da paciente para o STJ.
Segundo o processo, em junho de 1997, ela começou a apresentar um
quadro diário de vômito, diarréia, calafrios, asfixia, febre e intensa
dor abdominal. Internada na Clínica Bambina, foram requeridas
tomografias gerais, incluindo a de pélvis, que foram realizadas na
Clínica Luiz Felippe Mattoso Ltda., por se tratar de clínica
radiológica de boa reputação, mesmo não sendo os exames solicitados
cobertos pelo seguro saúde da paciente.
O laudo da clínica constatou a existência de "clipes metálicos" na
região do lado direito da bacia, além da ausência de apêndice, fatos
desconhecidos pela autora. Com base nesse laudo, a equipe médica
deu-lhe alta hospitalar, diagnosticando um processo imuno-alérgico
dentro de um quadro de rejeição do organismo aos referidos clipes
metálicos. Em conseqüência, a autora foi retirada do hospital e mandada
para casa, onde agonizou por longos 27 dias, até que uma simples
radiografia realizada posteriormente, já no desespero da família,
diagnosticou um quadro grave de apendicite aguda, tendo sido a autora
operada de emergência, em intervenção cirúrgica de alto risco.
Em razão de tudo isso, alegou a paciente que a clínica ré errou
três vezes seguidas na emissão de seus laudos: primeiro, afirmando a
existência de clipes metálicos no organismo da autora e ausência de
apêndice; segundo, três dias após a tomografia, submetendo-a a uma
ressonância magnética da pelve que não se referia aos clipes metálicos
e que terminou revelando "partes moles do organismo". E terceiro,
quando, através de uma simples radiografia realizada 25 dias após a
tomografia, foi atestado "que a imagem densa visualizada na tomografia
não tem aspecto de clipe metálico devendo corresponder a resto de
contraste de bário no interior do apêndice", o mesmo órgão que, segundo
a própria clínica, não existia no organismo da paciente.
Como o estado de saúde dela continuava piorando, com dores
insuportáveis no abdômen, febre, vômitos e os exames de sangue
acusassem séria infecção, foi indicada uma cirurgia para retirada dos
grampos em caráter de urgência. Foi pedida uma nova radiografia, por
precaução, pelo cirurgião. Realizada pela mesma clínica, o novo laudo
negou a existência de qualquer clipe metálico e ausência de apêndice,
acusando um apêndice provavelmente com restos de bário, o que por certo
teria levado esse elemento químico a ser confundido com restos de
clipes metálicos. Feita a cirurgia, na biópsia não foi encontrado
nenhum resíduo de bário, evidenciando-se mais um erro da referida
clínica.
Ao decidir em favor de Cláudia Renata Coelho, o relator do
processo, ministro Antônio de Pádua Ribeiro, considerou que o
diagnóstico inexato, fornecido por laboratório radiológico, levando a
paciente a sofrimento que poderia ter sido evitado justamente pela
prestação correta do serviço contratado, dá direito à indenização por
danos materiais e morais. Para o ministro Pádua Ribeiro, a obrigação da
clínica era sim, de resultado, portanto de natureza objetiva, nos
termos do Código de Defesa do Consumidor.
Para o relator do processo, é inadmissível que um laboratório se
proponha a realizar serviços de exames e análises de materiais de
pacientes, dos quais depende a própria vida destes, e forneça
resultados inexatos ou francamente errados. Assim, entendendo que, no
caso, o serviço mal feito causou à autora um sofrimento a que ela não
estava obrigada, resultado do diagnóstico errado, que só fez piorar seu
estado de saúde, submetendo-a, inclusive, a um pós-operatório
traumático, com nova hospitalização após 12 horas de sua alta, julgou
procedente o pedido de indenização, fixando-a, no entanto, em R$ 80 mil
pelos danos materiais e 200 salários mínimos pelos danos morais.