Mantida obrigação de caução de R$ 300 mil para cada vítima de desastre com o vôo da TAM
Por quatro votos a um, a Terceira Turma do Superior Tribunal de
Justiça, acompanhando o voto da ministra Nancy Andrighi, manteve a
obrigação de a empresa Northrop Grumman Corporation, dos Estados
Unidos, prestar caução de R$ 300 mil por vítima do desastre da TAM,
para poder continuar se defendendo no processo em que as famílias das
vítimas pedem indenização. A caução visa garantir o pagamento final das
indenizações em razão de ser empresa sediada no exterior, sem
representação ou filial no país.
Na manhã do dia 31 de outubro de 1996, o avião Fokker 100 da Tam, vôo
402, com destino ao aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, após 24
segundos de decolagem, espatifou-se no solo, no bairro do Jabaquara,
próximo ao Aeroporto de Congonhas (São Paulo). O desastre matou todas
as 99 pessoas a bordo, incluindo passageiros e tripulação.
A perícia apurou que a razão fundamental do acidente deveu-se a defeito
de fabricação de peça da aeronave denominada "thrust reverse", que
abriu na hora da decolagem. Além disso, a fabricante Northrop Grumman
deixou de alertar tecnicamente sobre os perigos a que estaria exposto
tal equipamento, além de haver garantido, enganosamente, a respeito da
manutenção de reparos no "thrust-reverser" da turbina direita da
aeronave, o que, sem dúvida, expôs os passageiros a perigo fatal.
As famílias das vítimas alegam que essa negligência na fabricação do
equipamento, causa principal do acidente, garante direito de reparação
dos danos materiais e morais sofridos pelas famílias das vítimas com
base no Código Civil, que assegura o dever de indenizar a todo aquele
que, por negligência ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo
a outro. No caso, afirmam, é preciso assegurar a reparação dos danos
materiais e morais sofridos com a perda das vítimas, que deixaram suas
famílias ao desamparo, quase todas com parcos recursos econômicos, uma
vez que eram dependentes da proteção e do trabalho daqueles que,
infortunadamente, perecerem no acidente.
Entendendo que a situação da empresa acusada, sem filial ou
representante no país, pode gerar a frustração final do pagamento das
indenizações, o Ministério Público do Estado de São Paulo requereu
caução para garantir o resultado útil do processo. O juízo de 1o grau
deferiu o pedido e determinou a prestação de caução no valor de R$
500.000,00 por vítima, a ser realizada, no prazo de 20 dias, pela
Northrop Grumman Corporation e pela empresa Teleflex (responsável pela
fabricação de cabo que também deu defeito) em partes iguais.
A fabricante americana Northrop Grummann recorreu dessa decisão,
tendo o 1o Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo ( TAC/SP)
reduzido o valor da caução para R$ 300.000,00 por vítima, a ser
efetivado em um prazo de 30 dias.
Inconformada, a empresa Northrop Grummann Corporation interpôs, então,
recurso especial para o STJ, alegando que a decisão rompeu o necessário
equilíbrio processual entre as partes, ao exigir caução de apenas uma
delas, numa hipótese em que a lei não prevê tal exigência. Sustentou,
também, que a caução determinada significa um verdadeiro pré-julgamento
da causa, uma condenação prévia sem a análise das provas e dos fatos
apurados no processo.
Ao negar o pedido da empresa e manter a exigência da caução, a relatora
do processo, ministra Nancy Andrighi, argumentou que o juiz de primeiro
grau, ao fixar a constrição, atendeu a pedido do Ministério Público
estadual, na sua função de fiscal da lei, tanto por o processo envolver
a presença de menores quanto pela repercussão causada pelo acidente
aéreo que originou o processo.
Para a ministra, a decisão recorrida, na verdade, não adiantou o
resultado do julgamento. Nada mais fez do que tentar proteger as
vítimas, algumas delas menores, de uma possível frustração na
satisfação do resultado concreto e real do processo. Para isso,
considerou que a empresa acionada, que no final poderá responder pelos
valores da indenização, não tem vínculo patrimonial com o país,
exigindo, por isso, a prestação de caução, aplicando, por analogia, o
artigo 835 do Código de Processo Civil combinado com as disposições dos
artigos 797 e 798 do CPC.
O artigo 835 do CPC determina que o estrangeiro, demandado na Justiça,
que residir fora do Brasil ou dele se ausentar no decorrer do processo,
prestará, nas ações que intentar, caução suficiente às custas e
honorários de advogado da parte contrária, se não tiver no Brasil bens
imóveis que lhe assegurem o pagamento. Enquanto os artigos 797 e 798
tratam do poder geral de cautela. A ministra Nancy Andrighi manteve,
assim, a exigência da prestação de caução no valor de R$ 300 mil por
vítima do vôo 402 da TAM, determinada pelo 1º Tribunal de Alçada Civil
de São Paulo.