TST admite punição distinta a empregados que cometem mesma falta
O empregador tem autonomia para decidir de que forma punir - podendo
inclusive deixar de fazê-lo em relação a um ou outro empregado - quando
descobre irregularidades cometidas em grupo por seus funcionários. A
possibilidade de o empregador dispensar tratamento diferenciado a
empregados que cometem faltas idênticas foi reconhecida pela Seção
Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do
Trabalho durante julgamento de recurso da Mercedes-Benz do Brasil S/A.
A decisão, entretanto, não foi unânime.
O relator original do recurso, ministro João Oreste Dalazen, que
votou pelo não conhecimento dos embargos da Mercedes, foi vencido,
tendo sido acompanhado pelos ministros Luciano de Castilho, Carlos
Alberto e Lélio Bentes. Para ele, a atitude da empresa foi
discriminatória e afrontou o ordenamento jurídico-trabalhista
brasileiro, que não permite o "mero capricho" na eleição dos que
merecem punição. "Ou bem todos são punidos, ou bem todos são
perdoados", afirmou Dalazen. Prevaleceu o voto do ministro Rider de
Brito, primeiro a divergir de Dalazen. Para ele, embora o acórdão do
TRT de Campinas não tenha descrito com precisão os motivos pelos quais
a empresa poupou alguns funcionários, apontou que a multinacional não
viu "condição ou necessidade de fazê-lo".
Para o ministro Rider de Brito, extrai-se daí que existiam
circunstâncias particulares que, no âmbito operacional da empresa,
justificaram a manutenção de alguns dos funcionários faltosos, enquanto
outros foram demitidos por justa causa. "Ora, faz parte do poder de
comando do empregador ponderar sobre os prós e contras de manter um
empregado faltoso na empresa, analisando os prejuízos que a sua
ausência poderia gerar ou os benefícios de sua presença, que
justificariam o perdão da falta cometida", afirmou o ministro Rider ao
liderar a corrente vencedora.
A empresa descobriu um esquema de fraude no Setor de Assistência
Técnica e Treinamento Pós-Venda, por meio do qual funcionários
superfaturavam o valor das despesas realizadas no exterior quando
viajavam a trabalho. Por meio da utilização de notas fiscais "frias" ou
obtidas em branco, eles obtinham da empresa o ressarcimento de despesas
em valor superior ao efetivamente gasto. Muitos hospedavam-se em hotéis
baratos e apresentavam notas de hotéis de luxo, que cobram diárias
elevadas. O mesmo era feito com relação às despesas de alimentação.
O esquema foi descoberto pela Mercedes por meio de auditoria
interna, que confrontou as despesas apresentadas pelos empregados do
setor com informações obtidas diretamente nos hotéis indicados. Há
indícios de que o esquema, descoberto em 1993, funcionava há muitos
anos, tendo alcançado grandes proporções já que os funcionários que
dele participaram não tinham interesse algum em denunciá-lo quando eram
promovidos a outros cargos ou setor. Após descobrir a fraude, a empresa
decidiu poupar alguns dos funcionários envolvidos, mantendo-os em seus
quadros, e dispensar outros por justa causa.
A conduta da Mercedes levou os empregados demitidos a recorrer à
Justiça do Trabalho, onde denunciaram a ocorrência de prática
discriminatória por parte da multinacional automobilística, por
dispensar tratamento desigual a funcionários envolvidos no mesmo
episódio. Na ação, os dez demitidos pleitearam o direito à verbas
rescisórias e à liberação do FGTS acrescido da multa de 40%, decorrente
da transformação da dispensa por justa causa em dispensa imotivada.
Também pleitearam o direito aos benefícios instituídos pelo plano de
desligamento voluntário (PDV) da Mercedes.
O pedido do grupo foi acolhido parcialmente pela Vara do Trabalho
de Campinas (SP), que rejeitou o pedido em relação ao PDV. Embora tenha
comprovado a existência do esquema praticado pelos empregados, a
sentença considerou que a Mercedes violou o princípio da igualdade de
tratamento aos empregados envolvidos no episódio ao dispensar
sumariamente alguns e manter outros em seus postos de trabalho. Ao
condenar a multinacional a pagar verbas rescisórias ao grupo em
decorrência da transformação da justa causa em dispensa imotivada, o
juiz de primeiro grau afirmou que as medidas punitivas deveriam
alcançar todos os envolvidos.
Houve recursos de ambas as partes ao TRT de Campinas (15ª Região) e
somente o apelo da empresa foi acolhido. Para o TRT, no caso em questão
a empresa tem o direito de avaliar a quem punir com rigor, por isso "se
mandou embora a uns e a outros não, nada justifica que tenha que
contemporizar com todos". O grupo recorreu então ao TST e obteve
decisão favorável da Terceira Turma do Tribunal, que reconheceu a
ocorrência de violação ao princípio constitucional da isonomia, segundo
o qual "todos são iguais perante a lei" (artigo 5º). A Mercedes Benz
recorreu então à SDI-1 do TST e conseguiu reformar a decisão da Turma,
por maioria de votos.