STJ admite ultrapassar prazo decadencial para contestação de paternidade
A contagem do prazo decadencial de dois meses para ajuizamento de ação
negatória de paternidade se dá a partir do momento em que o suposto pai
biológico dispõe de elementos seguros para contestar a paternidade do
filho de sua ex-esposa, e não a partir da data do nascimento da
criança. Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de
Justiça não conheceu do recurso interposto por V. contra o seu
ex-marido M.
M. ajuizou ação de anulação de ato jurídico contra sua ex-esposa,
objetivando desconstituir o registro de nascimento da menor T. Segundo
ele, V. o induziu ao erro quando o fez acreditar ser pai de T., apesar
das evidências de adultério ocorrido antes do nascimento da menor, bem
como do fato da sua baixa fertilidade, constatada em exame pré-nupcial.
Desconfiado, M. ajuizou, na 1ª Vara da Família, medida cautelar de
produção antecipada de provas, visando à realização do teste de DNA,
recusado por V. Assim, em uma das visitas de T., M. a submeteu à coleta
de sangue em hospital infantil, que determinou o envio das amostras
para o laboratório genético americano ICI. O resultado, colhido em
22/5/1992, foi a exclusão, por absoluta impossibilidade, de ser o seu
pai biológico.
A primeira instância julgou procedente a ação, aduzindo ser válido
o exame de DNA realizado, considerando lícita a sua conduta de levar a
suposta filha ao hospital para coleta do material, independentemente da
vontade da mãe.
Inconformada, V. apelou. O Tribunal de Justiça do Estado do
Paraná, por maioria, rejeitou a preliminar de nulidade do processo,
suscitada no dia da sessão pertinente à falta de citação
litisconsorcial da menor e, no mérito, por unanimidade, negou
provimento ao apelo.
A mãe da menor, então, recorreu ao STJ. Quanto à parte unânime,
pertinente ao mérito, V. interpôs o primeiro recurso especial alegando
que a ação negatória de paternidade baseou-se em prova ilícita e que o
fato de não ter consentido com a coleta de sangue de sua filha para a
realização do exame de DNA não acarreta o ônus da presunção de
veracidade, inexistindo confissão ficta.
V. interpôs um segundo recurso especial argumentando que o
processo é nulo a partir do momento em que deveria ter sido citada a
litisconsorte passiva necessária T., pois indispensável a "nomeação de
curador especial à menor, uma vez que os interesses dos pais são
colidentes".
O ministro Jorge Scartezzini, relator do processo, ao analisar o
segundo recurso, frisou que não há que se falar de nulidade do
processo, por ausência da citação de T. como litisconsorte passiva
necessária, somente porque a menor não está em companhia de sua mãe
como parte integrante da relação processual. "Não conheço do segundo
recurso especial. O litígio existente nas ações que visam desconstituir
registro de nascimento, em razão do declarante ter sido induzido a
erro, é entre este, que agiu por indução, e o responsável pelo vício de
declaração, ou seja, entre M. e sua ex-esposa, V."
Quanto ao pedido da extinção do processo com julgamento de mérito,
tendo em vista a ocorrência de decadência, o ministro Jorge Scartezzini
lembrou entendimento da Terceira Turma do Tribunal de que o termo
inicial para a contagem do exíguo prazo de dois meses é a partir do
momento em que o suposto pai biológico dispõe de elementos seguros para
contestar a paternidade do filho de sua ex-esposa, nascido durante a
união conjugal, e não a partir da data do nascimento da criança.
"In casu, o termo inicial para a contagem do prazo decadencial de
dois meses é o dia do resultado do exame de DNA, a saber, 25/6/1992,
data em que o recorrido teve conhecimento seguro de que não era o pai
biológico de T. Assim, tendo a ação em comento sido ajuizada em
3/7/1992, não há que se falar na ocorrência de decadência".
O ministro também ressaltou, apenas para registro, que a
jurisprudência do STJ, diante das peculiaridades de cada caso concreto,
em especial, quando evidenciada a inexistência de vínculo genético
entre o suposto pai e o filho de sua esposa, por intermédio de exame de
DNA, tem admitido ultrapassar o prazo decadencial previsto pelo artigo
178, § 3º, do Código Civil de 1916.