Créditos do empréstimo compulsório sobre energia elétrica são passíveis de cessão
O empréstimo compulsório sobre energia elétrica pode ser cedido a
terceiras pessoas, e essa cessão só poderá ser feita nos mesmos moldes
do previsto em lei para a devolução. Com esse entendimento, a Segunda
Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deferiu o recurso de Pedro
Matias Ebert contra as Centrais Elétricas Brasileiras (Eletrobrás).
Pedro Matias ajuizou ação declaratória contra a Eletrobrás alegando que
a Lei nº 4.156/62 instituiu, em favor da empresa, empréstimo
compulsório sobre energia elétrica, cobrado diretamente na conta de
consumo dos estabelecimentos industriais.
Segundo ele, posteriormente, a Lei nº 7.181/83 previu a conversão dos
créditos de empréstimo em ações da Eletrobrás, vindo o Decreto 1.512/76
a regular a devolução, a ser feita no prazo de 20 anos, a contar da
data de seu recebimento pela empresa. "Pedro Matias adquiriu crédito de
diversas empresas através de instrumentos particulares de cessão
tornando-se cessionária dos respectivos créditos e dos direitos dele
provenientes, como juros, dividendos e demais consectários", afirmou
sua defesa.
A primeira instância julgou procedente o pedido para reconhecer a
validade e eficácia dos instrumentos particulares de cessão de crédito,
firmados entre o autor e as empresas cedentes, reconhecendo a
Eletrobrás como credor único e exclusivo em relação aos valores da
cessão.
A Eletrobrás apelou. O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de
Janeiro deferiu o apelo considerando que o Decreto-lei 1.512/76, que
instituiu o tributo em questão, dispõe que a devolução dos valores
recolhidos se faria em duodécimos e mediante compensação nas contas de
fornecimento de energia elétrica, com opção de conversão em
participação acionária. "Vale dizer, tal crédito somente poderia ser
liquidado junto ao próprio credor primitivo, através de compensação e,
conseqüentemente, não poderia ser pago a eventual cessionário, mediante
moeda corrente", decidiu.
Inconformado, Pedro Matias recorreu ao STJ sustentando que o
empréstimo compulsório, como obrigação a ser cumprida pelo cidadão, é
tributo, contudo a obrigação do Estado ou do beneficiário do empréstimo
em devolver quantia arrecadada nada tem de tributária. "Por serem de
natureza privada os créditos decorrentes do pagamento do empréstimo
compulsório de energia elétrica em questão, passíveis, portanto, de
cessão, na forma do artigo 1.065 do Código Civil/1916".
Para a ministra Eliana Calmon, relatora do processo, a
Constituição Federal de 1988 inovou ao estabelecer as hipóteses
possíveis de instituição do empréstimo compulsório pela União, o que
era dado ao legislador complementar. "A partir da identificação da
natureza jurídica do empréstimo compulsório, pode-se dizer que é ele
uma espécie tributária diferente, de tal modo que há nele duas ordens
de relação, a jurídica e a de natureza administrativa".
Segundo a relatora, em tese, pode-se admitir que a lei estabeleça
certas condições à cessão, ou mesmo imponha óbices à transferência de
obrigação, cabendo analisar cada caso de per si, à luz da natureza
jurídica do crédito objeto da cessão. "Na hipótese do empréstimo
compulsório tratado nestes autos, não há óbice à cessão, sendo certo
que esta só poderá ser feita nos mesmos moldes do previsto em lei para
a devolução".
A ministra ressaltou que a Eletrobrás tem raciocínio diverso e
entende que seria possível a cessão se houvesse autorização legal
expressa, visto que de direito público se trata. "Não concordo com a
empresa. Inexistindo regra expressa de proibição à transferência,
entendo que ela está permitida, sendo certo que o cessionário
sub-roga-se inteiramente nos direitos do cedente, seja com a
compensação em conta de consumo de energia elétrica, seja no
recebimento de ações, como forma de pagamento".