Grupo Financeiro Ipiranga exige indenização milionária do Banco Central
A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou o
julgamento do pedido de indenização feito pela Companhia Brasileira de
Administração e Participação S/A (Cobrasap) e pelo Banco Ipiranga
Investimentos S/A (Grupo Financeiro Ipiranga), que em 1990 ajuizaram
ação contra o Banco Central do Brasil (Bacen). Após intervir nas
empresas ainda na década de 70, a autarquia, depois de 14 anos de
administração, devolveu o patrimônio aos seus donos totalmente
dilapidado. De U$ 125 milhões, os bens foram reduzidos a U$ 4,3
milhões, segundo consta dos relatórios.
O recurso movido contra decisão do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e Territórios (TJDFT) foi julgado por fases. Primeiramente,
foram consideradas três preliminares, todas afastadas. Em seguida, foi
decidido se o mérito da matéria (o pedido de indenização) poderia ou
não ser apreciado pelo STJ. Nesse ponto, a tese em questão foi se
analisar o recurso seria reexame das provas, o que não é permitido ao
tribunal fazer devido à Súmula 7.
Seguiram o voto da relatora, ministra Eliana Calmon, no sentido de não
ser reapreciação de provas, os ministros Franciulli Netto, Peçanha
Martins e Castro Meira. Apenas o ministro João Otávio Noronha entendeu
diferentemente, passando-se, então, para o tema principal: se o grupo
teria ou não direito à indenização. Nesse ponto, após voto favorável da
relatora e do ministro Franciulli Netto, pediu vista o ministro João
Otávio Noronha. A relatora compreendeu existirem provas suficientes da
prática do ato ilícito do Banco Central.
Os autores do recurso interposto no STJ pedem indenização pelos danos
causados no valor da diferença entre o patrimônio líquido do grupo
antes da intervenção (ver histórico abaixo) e o valor devolvido quando
foi finalizada a liquidação. Afirmam que o Banco Central, ao intervir,
agiu de forma ilegal, abusiva e com desvio de finalidade, provocando o
verdadeiro desmonte do grupo.
A chamada "intervenção branca" foi, para o Grupo Financeiro Ipiranga,
um "conluio entre o Bacen e os controladores do Banco de Crédito
Nacional", que assumiu parte das empresas como co-gestor e depois ainda
ficou com o controle do Banco Comercial Ipiranga – único a ter a
intervenção interrompida. O Grupo Financeiro Ipiranga também alega
falta de fundamento legal para a intervenção. Ordenado por decisão
presidencial, o consultor-geral da República, Clóvis Ferro Costa,
analisou o dossiê e também entendeu que a intervenção "foi um arranjo
ilegal do Bacen com o Banco de Crédito Nacional".
Histórico
O Grupo Financeiro Ipiranga, que tinha como holding a Cobrasap, era
composto de 35 empresas no país e mais de 30 no exterior. Dessas, seis
eram instituições financeiras. Em 1974, o grupo foi atingido com uma
séria crise de liquidez no mercado financeiro, pedindo auxílio ao Banco
Central. Em maio do mesmo ano, sofreu intervenção do Bacen, que assumiu
todas as empresas, sendo afastados todos os seus administradores.
Como citado no relatório da ministra Eliana Calmon, a intervenção foi
tão radical que foram suspensos até mesmo os contratos de publicidade,
demitido o pessoal e controladas as atividades essenciais das empresas
financeiras. Em novembro do mesmo ano, a Cobrasap foi forçada a
transferir 24 das 38 empresas do Grupo Financeiro Ipiranga para o Banco
de Crédito Nacional S/A, que passou a ser co-gestor na qualidade de
novo acionista e controlador do Grupo.
"Após desastrosa participação no controle das vinte e quatro empresas,
praticando os controladores até mesmo financiamento embasado em títulos
frios", o Banco de Crédito Nacional S/A desvinculou-se dos compromissos
assumidos. Assim, o Bacen, depois de liberar o Banco de Crédito,
decretou intervenção em todas as empresas do grupo. Apesar disso, a
instituição ainda continuou com o Banco Comercial Ipiranga.
Diz o relatório que, "surpreendentemente, após 36 horas da negociação,
o Bacen fez cessar a intervenção no banco adquirido, mantendo-a nas
demais empresas envolvidas à Cobrasap". A liquidação extrajudicial de
22 empresas foi decretada em março de 1976 e somente dez ficaram fora
da interferência.
Entre as reclamações que, segundo as recorrentes, levaram à destruição
do grupo e comprovam a má intenção do Banco Central, está o fato de ter
sido impedida a venda de um terço das ações da empresa holding ao The
First National Bank of Chicago, "praticamente realizada e só não
consumada por impedimento do Bacen".
Os interventores permaneceram de 1976 a 1980, quando, em 30 de agosto,
o presidente do Bacen decretou a cessação da liquidação extrajudicial,
"sem prestação de contas, sem publicidade alguma e sem publicação do
quadro de credores, como exigido em lei", e, assim, a empresa foi
devolvida em situação precária aos donos.