Prédios públicos de município paulista podem sofrer corte de energia por inadimplência
Inadimplente, o município de Santa Lúcia, São Paulo, pode ter a energia
novamente cortada em alguns prédios públicos, entre eles o velório, a
biblioteca, o Correio, o almoxarifado, a Câmara Municipal e o ginásio
de esportes. A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
decidiu pelo direito legal da Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL),
que entrou com recurso contra entendimento do Primeiro Tribunal de
Alçada Civil do Estado de São Paulo, para o qual a empresa não teria o
direito de parar o fornecimento de energia elétrica.
A CPFL alegou não se caracterizar como descontinuidade do serviço a
interrupção por motivo de inadimplência, desde que feito aviso prévio,
o que segue a legislação em vigor, de acordo com a relatora do caso,
ministra Eliana Calmon. Diz a Lei n. 8.987/95, que regula a concessão e
a permissão de serviços públicos (art. 6º, § 3º, inciso II): "Não se
caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em
situação de emergência ou após prévio aviso, quando por inadimplemento
do usuário, considerando o interesse da coletividade."
Determinam-se assim as possibilidades de interromper o atendimento,
completando o que a mesma lei diz, também no artigo sexto (§ 1º):
"Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade,
continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia
na sua prestação e modicidade nas tarifas." Além do mais, a lei que em
1997 criou a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), regulando
especificamente a concessão dos serviços de energia elétrica e
alterando a Lei n. 8.987/95, previu expressamente a possibilidade de
corte. "A paralisação do serviço impõe-se quando houver inadimplência,
repudiando-se apenas a interrupção abrupta, sem o aviso, como meio de
pressão para pagamento das contas em atraso", enfatiza a relatora do
processo.
Para ela, admitir o não-pagamento por tempo indeterminado, sem a
possibilidade de se suspenderem os serviços, é consentir o
enriquecimento sem causa de uma das partes, abrindo espaço para uma
inadimplência generalizada, o que pode comprometer a permanência do
atendimento. Por outro lado, a concessionária tem o dever de colaborar
para que o consumidor possa quitar sua dívida.
Eliana Calmon esclarece o porquê de a relação das partes ter como base
o Direito Privado. Explica, primeiramente, que o fornecimento de luz é
serviço público impróprio e individual, com usuários determinados,
assim como telefone e água. Esses serviços podem ser prestados por meio
de parcerias com a iniciativa privada e, ao contrário daqueles
conhecidos como próprios – que não têm destinatários identificados,
como a segurança pública e a saúde –, os impróprios não são mantidos
mediante impostos, ou seja, taxas.
No caso da energia elétrica, do telefone e da água, o que existe são
tarifas ou preços públicos, e a relação entre o Poder Público e o
usuário é regida pelo Direito Privado, Código de Defesa do Consumidor
(CDC), e não pelo Direito Administrativo. "Assim, não se há de
confundir taxa com tarifa ou preço público", ressalta a ministra, que
completa: "Se o serviço é remunerado por taxa, não podem as partes
cessar a prestação ou a contraprestação por conta própria,
característica só pertinente às relações contratuais." Dessa forma,
entendeu a relatora que a CPFL tem direito legal de interromper o
fornecimento, já que a Prefeitura Municipal de Santa Lúcia tem uma
relação de consumidora com a companhia, que precisa regularizar o
pagamento.