TST anula acordo que induzia empregado a não entrar na Justiça
A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho considerou nula parte
do acordo coletivo firmado pela Mercedes Benz do Brasil com o Sindicato
dos Metalúrgicos da Região de Campinas (SP), no qual foi ajustado o
pagamento de uma vantagem financeira, de acordo com o tempo de casa, a
500 trabalhadores dispensados em 1995. Entre as cláusulas, uma previa
que, caso o empregado demitido movesse qualquer ação trabalhista ou
civil contra a empresa, o valor pago a título de vantagem financeira
seria deduzido de qualquer quantia eventualmente devida pela Mercedes
em decorrência de decisão judicial.
Relator do recurso, o juiz convocado Aloysio Corrêa da Veiga
afirmou que a cláusula, na verdade, funcionou como uma ameaça ao
empregado para que não recorresse à Justiça pois, se o fizesse,
perderia o que ganhou a título de vantagem financeira. O argumento
jurídico utilizado pelo relator para acolher o recurso de um
ex-serralheiro da Mercedes foi o de que a cláusula contrariou a própria
natureza jurídica do instituto da compensação, que só é admissível no
Direito do Trabalho em se tratando de parcelas de idêntica natureza
jurídica.
Segundo o relator, a cláusula também deve ser considerada nula
porque importou em renúncia de direito, que tem caráter personalíssimo.
Por esse motivo, tal renúncia não poderia ter sido negociada pelo
sindicato. Esse foi um dos pontos sobre os quais se bateu a defesa do
metalúrgico, ou seja, que o sindicato não cumpriu sua função de
defender os direitos dos representados, como determina a Constituição
Federal.
Ao acompanhar o voto do relator, o ministro João Oreste Dalazen
afirmou que os sindicatos não podem dispor de créditos futuros de seus
representados. "Reconhecemos valor e eficácia aos acordos coletivos de
trabalho mas não a esse ponto", reagiu Dalazen. O ministro rebateu o
argumento da defesa da Mercedes de que a vantagem financeira foi paga
por "mera liberalidade" da empresa. "Na verdade o que houve foi uma
demissão em massa e, para atenuar a situação, a empresa concedeu a
vantagem financeira aos 500 empregados dispensados", salientou.
O serralheiro em questão tinha 14 anos de casa. Foi admitido em
1981 para atuar no setor de montagem bruto, no qual passava a maior
parte do tempo trabalhando nas bancadas, ajustando peças, cortando
materiais, dobrando e ferrando peças. Como utilizava esmeril,
lixadeira, serra circular, dobradeira, serra-fogo (que solta faísca) e
fresa, ajuizou reclamação trabalhista contra a Mercedes logo após a
demissão, na qual requereu o pagamento de adicional de insalubridade,
entre outros direitos.
No acordo coletivo em questão, a Mercedes comprometeu-se a pagar,
juntamente com as verbas rescisórias, uma compensação em dinheiro, a
título de vantagem financeira, de acordo com o número de anos de casa
de cada um dos 500 demitidos. O empregado com até cinco anos na
Mercedes recebeu o correspondente a quatro salários. Quem tinha de
cinco a 20 anos, recebeu seis salários (foi o caso deste serralheiro).
Aquele que contava com 20 a 30 anos de trabalho na montadora, recebeu
sete salários. Por fim, ao empregado com mais de 30 anos de casa, a
Mercedes pagou uma vantagem financeira correspondente a oito salários.
Tanto a Vara de Trabalho de Campinas quando o TRT da 15ª Região
admitiram a validade da compensação do pagamento a título de vantagem
financeira com os direitos reconhecidos na ação judicial. Para o TRT,
"a previsão de compensação futura de importância, paga por mera
liberalidade, com eventuais direitos reconhecidos em ação judicial ou
cível não se afigura ilegal ou abusiva, na medida em que o pagamento da
mencionada verba decorreu de negociação coletiva, sendo que eventual
discordância quando à referida compensação certamente inviabilizaria
sua concessão".
Ao reformar a decisão do TRT/15ª Região, Aloysio Veiga afirmou que
a compensação pretendida é impossível de ser feita. "No presente caso,
a referida verba foi paga pela empresa em obediência ao que dispõe o
Acordo Coletivo, não se podendo cogitar de mera liberalidade. Não há
que se falar em não reconhecimento dos acordos e convenções coletivas
de trabalho. Trata-se de hipótese de nulidade de cláusula de acordo
coletivo que não respeitou o próprio instituto da compensação, que se
refere apenas a verbas de mesma natureza jurídica", disse o relator,
rebatendo argumento da defesa da Mercedes de que a decisão estaria
inviabilizando os acordos coletivos de trabalho.