STJ determina a hospital que pague gastos de paciente com advogado por negar acesso a prontuário
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou ao
Hospital de Base do Distrito Federal o pagamento a uma paciente dos
gastos que ela teve com advogado em ação contra o hospital. A
instituição se negou a apresentar, em pedido administrativo, os
prontuários do tratamento da paciente. Por esse motivo, ela teve que
propor ação contra o hospital. Para a ministra Nancy Andrighi, relatora
do processo, o Hospital de Base deu causa ao início da ação, por isso
deve arcar com os gastos que a ex-paciente teve com advogado.
Valda Terezinha Carbone, residente em Porto Alegre (RS), foi vítima de
um acidente de trânsito em Brasília, em julho de 1992. Ela estava na
cidade a serviço. Por causa do acidente, Valda Carbone foi internada no
Hospital de Base do Distrito Federal, no período de 7 a 31 de julho de
1992, tempo em que permaneceu desacordada, inconsciente e desassistida
por seus familiares.
Após sua recuperação, a paciente procurou o Hospital para ter
acesso aos prontuários, registros médicos, diagnósticos e
esclarecimentos sobre os tratamentos a ela aplicados. Segundo Valda
Carbone, o objetivo da verificação das informações hospitalares seria
descobrir as origens dos diversos problemas por ela sofridos após
aquela internação, como a patologia que adquiriu, supostamente nas
dependências do hospital, e que acabou obrigando a paciente a se
aposentar.
Apesar das tentativas de Valda Carbone, o Hospital se recusou a
apresentar os prontuários. O Hospital foi notificado
extrajudicialmente. No entanto manteve a recusa afirmando que o pedido
seria vedado pelos artigos 102, 103 e 108 do Código de Ética Médica.
Segundo o Hospital, somente por determinação judicial ou de entidade
médica os documentos poderiam ser exibidos.
Diante das alegações do Hospital, Valda Carbone entrou com uma
ação judicial exigindo a apresentação de todos os prontuários, bem como
as informações sobre os tratamentos. Com a citação judicial, o Hospital
apresentou, em Juízo, a cópia da Guia de Atendimento de Emergência –
GAE da paciente.
Ao analisar a ação e a cópia da GAE apresentada pelo Hospital, o
Juízo de primeiro grau julgou a ação procedente apenas para declarar
satisfeito o pedido da paciente. O Juízo, no entanto, não condenou o
Hospital a pagar os honorários de advogado da paciente entendendo não
ter havido resistência por parte da instituição hospitalar.
Valda Cargone apelou destacando que houve a movimentação da
máquina judiciária, inclusive com a contratação por ela de um advogado
– tudo por causa da resistência do Hospital em apresentar os
prontuários solicitados. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul
(TJ-RS) manteve a sentença. Para o TJ-RS, o Hospital não teria
resistido à solicitação da paciente. Com isso, Valda Carbone recorreu
ao STJ.
No recurso, ela afirmou que o TJ-RS, ao confirmar a sentença, teria
contrariado os artigos 20 e 26 do Código de Processo Civil (CPC) porque
o Hospital teria negado o acesso aos documentos pela via
administrativa, sem justificativa. A recorrente também afirmou que a
decisão de segundo grau teria contrariado os artigos 70, 71 e 112 do
Código de Ética Médica, pois a recusa do Hospital em apresentar os
prontuários à paciente caracterizaria violação ao direito de plena
informação e acesso à própria documentação médica e hospitalar.
Segundo a ministra Nancy Andrighi, "apesar de apresentados os
documentos em juízo sem resistência, há de se verificar se o recorrido
efetivamente deu causa à propositura da ação, hipótese em que há de ser
condenado a suportar os ônus sucumbenciais (gastos da autora da ação
com advogado), conforme jurisprudência (entendimento firmado) do STJ"
sobre o princípio da causalidade.
A ministra lembrou as alegações do Hospital quando do pedido
administrativo da paciente, de que a apresentação dos prontuários seria
vedada pelos artigos 102, 103 e 108 do Código de Ética Médica. Para
Nancy Andrighi, esses artigos não se aplicam ao caso em questão. "Pela
análise dos dispositivos do Código de Ética Médica citados pelo
recorrido na resposta à notificação extrajudicial exarada pela
recorrente, verifica-se que eles não amparam a negativa ao acesso aos
documentos requeridos. Tratam exclusivamente do sigilo médico perante
terceiros", entendeu a relatora.
Além disso, segundo Nancy Andrighi, os artigos 70, 71 e 112 do
Código de Ética Médica proíbem a instituição hospitalar de negar acesso
a paciente aos prontuários do próprio atendimento. "Nos termos dos
artigos 70, 71 e 112 do Código, não poderia o recorrido (Hospital) ter
negado à recorrente o acesso ao seu prontuário médico; se furtado de
dar explicações necessárias à sua compreensão; deixado de fornecer
laudo médico à recorrente para o fim de continuidade do tratamento; e
deixado de atestar os atos executados pelos médicos quando do
tratamento ao qual foi submetido a recorrente (paciente)", ressaltou.