Correntista tem direito à restituição corrigida de valores cobrados indevidamente
É direito do titular de contrato de abertura de crédito em
conta-corrente (cheque especial) obter a restituição de valores
indevidamente cobrados pela instituição e, o montante do indébito a ser
restituído deverá ser composto não apenas pelo valor cobrado
indevidamente (principal), mas também por encargos que venham a
remunerar o indébito à mesma taxa percebida pela instituição financeira
no empréstimo pactuado (acessório). Com esse entendimento a Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, não conheceu
do recurso especial do Banco Bandeirantes S/A.
A empresa JZ Outdoor Ltda ajuizou ação alegando que durante quatro
anos (1994/1998) manteve contratos bancários com a instituição
bancária, sendo que as cobranças das taxas por prestações de serviços,
bem como dos juros e encargos contratuais, eram lançadas diretamente em
sua conta corrente. Após realizar um aprofundado exame sobre a
irregularidade dos lançamentos, a empresa constatou a existência de
várias cobranças indevidas, sob diferentes rubricas, além de juros
acima do índice pactuado. Uma das providências foi a requisição da
repetição dos valores pagos indevidamente, corrigidos segundo as mesmas
taxas cobradas pela instituição financeira, e pleiteou também, o
ressarcimento dos danos emergentes e lucros cessantes.
Para obter a reparação a empresa ingressou com uma ação de
cobrança com pedido indenizatório por danos materiais e lucros
cessantes visando o recebimento de eventuais lançamentos indevidos
realizados em sua conta-corrente, e segundo levantamento da própria
empresa a soma é de R$ 2.291.832,20 (dois milhões duzentos e noventa e
um mil oitocentos e trinta e dois reais e vinte centavos).
A solicitação da JZ Outdoor Ltda foi julgada parcialmente
procedente pelo juízo de primeiro grau ao entender que não ficaram
provados os danos materiais contra a empresa. O Banco foi condenado
segundo a decisão "no ressarcimento das quantias apuradas pela perícia
sob rubrica de juros, nos valores nominais constantes da planilha".
Insatisfeitos com a decisão, tanto a empresa como o Banco apelaram
ao Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que julgou totalmente
procedente o apelo. "Embora ainda não se trate de matéria imune a
controvérsias, vai-se sedimentando nesta Corte o entendimento de que,
em hipóteses como a dos autos, o reembolso ao correntista deve ser
corrigido pelas mesmas taxas e encargos praticados pela instituição
financeira. É que, de outra forma, haveria tratamento desigual dos
contratantes. Enquanto o mutuário sempre esteve sujeito a encargos
superiores a 10% ao mês, o mutuante estaria premiado com juros módicos
e correção monetária oficial".
As partes ingressaram com embargos de declaração que foram
rejeitados pelo Tribunal de Justiça e em seguida entraram com o recurso
especial no Superior Tribunal de Justiça utilizando cinco alegações.
Ao analisar o assunto, a ministra Nancy Andrighi ressaltou que em
contrato de cheque especial pactuado à taxa de 11% ao mês, a
instituição financeira cobrou valor de seu correntista indevidamente,
deverá restituí-lo acrescido da mesma taxa, isto é, 11%. Do contrario,
caso se exigisse da autora da ação de repetição de indébito, a prova
sobre quais os lucros advindos ao banco com a utilização do dinheiro
usurpado, restaria ineficaz a norma contida no artigo 964 do Código
Civil, pois é manifesta a impossibilidade de produção desta prova.
A ministra sustenta que a remuneração do indébito à mesma taxa
praticada para o cheque especial se justifica, por sua vez, como a
única forma de se impedir o enriquecimento sem causa pela instituição
financeira. E portanto, não vislumbra a violação das normas que regulam
o sistema financeiro, pois está concedendo a quem não tem o direito de
cobrar juros acima da taxa legal ou outros encargos somente permitidos
às entidades participantes do sistema. A ministra destaca que o pedido
está vinculado tão-somente à reparação do dano causado e à coibição do
enriquecimento ilícito.
Ao não conhecer do recurso especial a ministra Nancy Andrghi
atesta que a solução adotada não fere a Lei de Usura, porquanto o
correntista não concedeu crédito à instituição financeira, mas apenas
busca restituir o que lhe foi cobrado indevidamente. Apenas se está
aplicando o mencionado no artigo 964 do Código Civil, que dá ao autor
da ação (Banco) por imperativo legal, e tal direito somente pode ser
satisfeito, na hipótese, com a devolução da remuneração obtida pelo
banco ao utilizar o dinheiro usurpado da correntista (JZ Outdoor Ltda).