STJ inova ao considerar que bem de família oferecido à execução é impenhorável
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) inovou quanto ao
entendimento da impenhorabilidade do bem de família, ao decidir que
mesmo que o proprietário ofereça o bem à execução este não poderá ser
penhorado. A decisão, por maioria, se deu na análise do recurso
especial de Pedro José da Silva Abrianos, do Rio Grande do Sul, que
ofereceu um aparelho de som e o refrigerador para o pagamento de uma
dívida no valor de R$ 269,40 (valores de 1998).
Pedro José contraiu uma dívida e teve dois cheques devolvidos por
insuficiência de fundos, e como não quitou o débito o credor moveu ação
para obtenção da penhora de bens suficientes para a execução. Pedro
José, então, ofereceu um refrigerador da marca Cônsul e um aparelho
três em um da marca Sony como garantia do pagamento da dívida.
E apesar de ter ofertado os bens para a penhora, Pedro José
ajuizou embargos (tipo de recurso) sob o argumento de que o aparelho de
som e o refrigerador são bens de família, e portanto impenhoráveis
conforme a Lei 8.009/90. O juiz de primeiro grau rejeitou os embargos à
execução, sob o argumento de que os bens foram oferecidos ao oficial de
justiça para a efetivação da penhora, e que portanto, abriu mão de
eventual impenhorabilidade prevista em lei.
O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul rejeitou o
recurso de apelação interposto por Pedro José concordando com a tese do
juiz de primeiro grau. E inconformado com a decisão do tribunal gaúcho,
Pedro ingressou com recurso especial no STJ sob o argumento de que ao
não reconhecer a nulidade da prova, realizada sobre bens impenhoráveis,
o acórdão violou a Lei 8009/90, e ao condenar o recorrido aos ônus da
sucumbência, violou o artigo 10 da Lei 1060/50.
Ao analisar a questão, a ministra relatora Nancy Andrighi afirmou
que o assunto consiste em saber se a oferta em penhora, pelo devedor,
do bem de família implica, ou não, renúncia à impenhorabilidade
prevista no artigo 1º da Lei 8009/90. A ministra cita julgamentos
anteriores realizados pela Terceira Turma do STJ nos quais o devedor
perde o benefício legal de impenhorabilidade se, voluntariamente, "faz
recair o gravame sobre o seu bem de família". A ministra relata que fez
ressalvas quanto ao tema e recomendou que o assunto merecia estudo
aprofundado.
Nancy Andrighi cita, o entendimento diferente firmado pela Quarta
Turma do STJ que considera que o ato do devedor que oferece em penhora
bem impenhorável não caracteriza renúncia à proteção legal. Para tanto
a Turma considera três situações: a questão é de ordem pública (o
interesse público, tais como a proteção à família e aos bens
indispensáveis ao exercício da atividade profissional do devedor, se
sobrepõe ao interesse privado), o que afasta a possibilidade de
renúncia tácita; a validade da penhora, na hipótese, implicaria
cerceamento do direito de defesa do devedor; e por último, a própria
índole do processo executivo estimula o devedor a indicar o bem a ser
penhorado, pois do contrário poderia incorrer nas sanções de litigância
de má-fé.
Segundo a ministra "de fato, se a proteção do bem visa atender à
família, e não apenas ao devedor, deve-se concluir que este não poderá,
por ato processual individual e isolado, renunciar à proteção outorgada
por lei em norma de ordem pública, à toda entidade familiar.
Ao concluir a ministra ressalta que ao acolher a tese de renúncia
tácita, o acórdão do Tribunal de Justiça gaúcho violou o artigo 1º da
Lei 8009/90. E, portanto, a Segunda Seção acompanhou o entendimento da
ministra e deu parcial provimento ao recurso para acolher os embargos
do devedor à execução e declarar a nulidade das penhoras realizadas
sobre o aparelho de som e o refrigerador.