Concessionárias podem cortar água por inadimplência
A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que
concessionárias podem suspender os serviços de água por inadimplência
do consumidor. Diferente da Primeira Turma, que mantém entendimento
contrário, o consumidor tem o dever de arcar com os seus gastos, não
estando a concessionária obrigada a prestar serviço gratuito.
O processo que serviu de base para o julgamento foi o recurso de
Maria Aparecida Dias Martins contra a Companhia de Saneamento de Minas
Gerais, Copasa. Viúva e desempregada, ela alegou dificuldades
financeiras para pagar pelo serviço, que foi cortado em junho de 1999.
Maria Aparecida ganhou na primeira instância. O entendimento
monocrático determinava que era ilegal o corte no fornecimento da água,
por se tratar de serviço essencial. O poder público estaria obrigado a
mantê-lo compulsoriamente, até mesmo a título gratuito, a quem
comprovadamente não pudesse pagar.
Para o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, inexiste regra no
Código do Consumidor que autorize o fornecimento gratuito de água. Os
desembargadores votaram a favor da concessionária Copasa. De acordo com
a Primeira Turma do STJ, em julgamento de casos semelhantes, essa não é
a melhor solução. As concessionárias, tanto de água, energia ou
telefone, devem cobrar as contas em atraso pela via judicial, sem
comprometer a continuidade do serviço.
É a primeira vez que a Segunda Turma analisou a questão e, para a
ministra Eliana Calmon, relatora do processo, o caso do fornecimento de
água deve ser visto por outro prisma. Os serviços essenciais atualmente
são prestados por empresas privadas que assumem elevados investimentos.
Esses investimentos, segundo a ministra, só podem ser compensados se
houver o adequado pagamento das tarifas.
A ministra considera que é ilegal o corte de serviços sem prévio
aviso. Também seriam ilegais cobranças insistentes, feitas de forma
inadequadas. "Nada impede a cobrança corriqueira e legítima", afirma a
ministra. A Segunda Turma apoiou-se na Lei de Concessão, de n.º 8.987,
que no art. 6º, enumera que não se caracteriza como descontinuidade do
serviço a sua interrupção por inadimplemento do usuário.
A questão diverge da Primeira Turma. O ministro José Delgado impôs
a uma concessionária indenização por constrangimentos sofridos por um
consumidor inadimplente com a suspensão do fornecimento, no caso, de
energia elétrica. Para o ministro, a energia, assim como água, é um bem
essencial à população, constituindo-se serviço público indispensável.
A ministra Eliana Calmon considerou que o Brasil é um país com
grande contingente de pobres e não tem cabimento uma empresa privada
arcar com os custos. Se muitos não pagam, para ela, o resultado é o
aumento descontrolado de tarifas. Também não faz sentido a
concessionária ter que recorrer à Justiça para cobrar daqueles que não
têm dinheiro para pagar. "De nada vale executar quem não possui bens",
disse.
Uma das partes perdedoras deve recorrer à Primeira Seção para
suscitar o chamado Embargos de Divergência. A Primeira Seção abarca a
Primeira e a Segunda Turma. A Primeira Turma é composta pelos ministros
Francisco Falcão, Gomes de Barros, José Delgado, Luiz Fux, Teori
Zavascki. A Segunda, por Franciulli Neto, Peçanha Martins, Eliana
Calmon, João Otávio e Castro Meira.