Agricultor ganha recurso contra constrição de imóvel que impedia financiamento agrícola
Protesto que coloca sob suspeita a propriedade de fazenda acarreta
constrição e pode impedir a realização de financiamentos agrícolas
necessários à produção agrícola. A conclusão é da Primeira Turma do
Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento ao recurso do
agricultor Abatênio de Andrade Márquez Neto, de Minas Gerais. O imóvel
rural adquirido pelo agricultor junto ao ex-prefeito de Colina, em São
Paulo, estava sob protesto para garantir pagamento de indenização
devida ao município.
O imóvel foi comprado em agosto de 2001. Em março de 2002, o
agricultor recebeu intimação de protesto contra a alienação. O
vendedor, ex-prefeito de Colina, João Henrique Paro, havia sido
condenado a pagar indenização devida aos cofres públicos da cidade. A
averbação de protesto contra alienação de bens, no Registro de imóveis,
foi determinada pelo juiz.
O agricultor entrou com mandado de segurança, afirmando que o
protesto inviabiliza o exercício de sua atividade. "Ninguém financia
insumos agrícolas, se a fazenda onde eles serão aplicados não pode
garantir o pagamento do empréstimo", alegou a defesa. Argumentou,
ainda, que o pagamento da indenização, devida pelo ex-prefeito, já está
garantido por hipoteca judicial, incidente sobre outro imóvel,
efetivada nos autos da própria ação de indenização promovida pelo
município.
A segurança foi indeferida. Segundo o juiz, a alienação de bens
não gera qualquer restrição a direito, mesmo porque tal direito estaria
desprovido de contenciosidade. "O protesto impugnado não foi averbado,
funcionando como simples advertência de que sua compra, pelo
impetrante, poderá ser tida como fraudulenta", acrescentou.
No recurso em mandado de segurança para o STJ, a defesa do
agricultor reconheceu que o protesto não foi averbado. Insistiu, no
entanto, que o protesto fere o ordenamento jurídico, ofendendo vários
princípios constitucionais.
Ao julgar, o ministro Humberto Gomes de Barros, relator do
processo, concordou com a defesa do agricultor, dando provimento ao
recurso. "Não subscrevo o argumento de que o protesto contra alienação
de bens não acarreta restrição ao exercício de direitos", afirmou. "A
experiência demonstra que nenhum comerciante ou agiota faz negócio,
tomando como garantia um bem cuja alienação está sob protesto. Na
agricultura, a suspeita resultante do protesto pode inviabilizar a
própria sobrevivência do proprietário", observou.
Para o relator, o protesto, na hipótese, impede que o impetrante
obtenha certidão negativa, vedando-lhe a possibilidade de financiar
suas safras. "Seu potencial de constrição equipara-se ao do seqüestro
de bens pertencentes a quem enriqueceu ilicitamente", acrescentou. "Se
assim acontece, o protesto está impedindo a realização de negócio
lícito necessário à sobrevivência econômica do impetrante", concluiu
Gomes de Barros. A Turma, por unanimidade, concordou com o relator.