STJ mantém suspenso contrato para instalação do Museu Guggenheim no Rio
Mantida liminar da Justiça do Rio de Janeiro que suspendeu os efeitos
do contrato para a instalação de um museu Guggenheim na cidade. O
presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Nilson
Naves, indeferiu pedido do Município do Rio de Janeiro para suspender a
liminar concedida dentro da ação popular movida por Eliomar de Souza
Coelho para anular o contrato, assinado entre o município e a Fundação
Guggenheim, em Nova Iorque, em abril deste ano.
A decisão proferida pelo juiz da Oitava Vara da Fazenda Pública da
capital do Rio de Janeiro e mantida pelo STJ resume as obrigações
assumidas pelo Município. Segundo essa decisão, o município gastaria só
com os custos da construção mais de 133 milhões de dólares, acrescidos
de 800 mil dólares anuais (por cinco anos), de quase 30 milhões de
dólares, em três parcelas, para a recuperação do píer da Praça Mauá, e
dos valores dos impostos sobre a renda e Sobre Operações Financeiras
(IOF) incidentes sobre a operação do Museu. Além disso, o município se
comprometeu a dar garantia, por dez anos, dos déficits operacionais até
o valor de 12 milhões de dólares.
Todos esses valores em moeda estrangeira (dólares americanos) seriam
pagos com a intermediação do JP Morgan Chase em Nova Iorque, o que
levou o magistrado singular (o juiz de primeiro grau) a argumentar a
ausência de autorização do Senado Federal para operações externas de
natureza financeira (art. 52, V, da Constituição Federal), ressalta a
decisão.
O juiz afirmou que, em razão de o contrato ultrapassar o exercício
financeiro e o próprio mandato do prefeito Cesar Maia, haveria
obrigatoriedade de incluí-lo no plano plurianual. Outro ponto destacado
na decisão do juiz foi quanto ao fato de o acordo prever a submissão de
algumas cláusulas à legislação brasileira e de outras à legislação
nova-iorquina em divergência com a Lei das Licitações brasileira e com
a de Arbitragem, bem como ao princípio constitucional da publicidade
dos atos administrativos. Segundo afirma o juiz, "na verdade, tem-se a
impressão de que o município assinou um contrato de adesão, abrindo mão
de suas prerrogativas de ente público, o que lhe é facultado".
Ao tentar reverter essa decisão no STJ, o Município alegou que a
manutenção da liminar causa "grave comprometimento e perturbação da
ordem, economia e segurança pública municipais". Isso porque a liminar
impede o cumprimento do cronograma contratual que se insere no
planejamento da administração para a cidade, fulminando "o essencial em
nome de dúvidas quanto ao acessório, trazendo como conseqüências a
frustração e não-realização de importantes objetivos administrativos:
criação de empregos, recuperação da área portuária, investimento de
particulares e incremento ao turismo, valorização imobiliária e
incremento da arrecadação portuária".
Cita, ainda, a iminência de fuga da Fundação Guggenheim para outra
sede, em descrédito para a municipalidade diante da comunidade
internacional, afugentando investidores, acarretando penalidades
contratuais e comprometendo a contratação do arquiteto Jean Nouvel para
o desenvolvimento do projeto do museu (orçado em 12,5 milhões de
dólares). A construção de um museu municipal de repercussão
internacional como o Guggenheim "é ponto estratégico no projeto de
revitalização do centro da cidade e de incremento do fluxo turístico",
e a decisão frustra a revitalização urbanística da área portuária e do
centro da cidade, comprometendo a recuperação da segurança publica da
área "hoje crítica em virtude da degradação urbanística e população
rarefeita que constituem a realidade local".
Nilson Naves, contudo, não vislumbrou os riscos alegados pelo
município. Primeiro, porque a ordem administrativa não parece ameaçada:
os serviços municipais continuam funcionando normalmente e não houve
ingerência na tomada de decisões administrativas capaz de comprometer o
alegado planejamento da administração para a cidade. "A decisão atinge
um contrato específico acoimado de violar normas de ordem pública e
causar lesão ao patrimônio municipal", afirma: "Por isso não pode ser
responsabilizada por frustração e não realização de alegados objetivos
administrativos".
Em segundo lugar, aponta o ministro, porque lhe parece que o risco que
há é inverso para a ordem econômica, na medida em que são muitos e
elevados os encargos financeiros assumidos pelo município em moeda
estrangeira, com expressivo desembolso imediato no exterior, o que pode
significar, se confirmada a ilegalidade do ajuste, dano irreversível ou
de difícil reparação. De outra parte, a posterior confirmação da
legalidade do contrato em debate terá a faculdade de implementar todos
os efeitos pretendidos com sua celebração, afirma Naves.
Por fim, o presidente do STJ entende que, em relação à alegada lesão à
segurança pública, a suspensão provisória do contrato não vai ao ponto
de colocar em risco a segurança pública do local, que o próprio
município alega ser região "crítica". "Ou seja, a liminar já encontrou
a situação no limite afirmado na inicial", conclui, indeferindo a
liminar.
Histórico
A prefeitura desapropriou, neste ano, parte significativa de área
considerada não portuária, com a perspectiva de construir um museu
integrado no circuito internacional de exposição de obras de arte. O
investimento previsto é de R$ 492 milhões, em desembolsos de R$ 123 por
ano, divididos em três contratos distintos e integrados, conforme
esclarece o município.
O primeiro contrato refere-se à construção de um museu no píer da Praça
Mauá. O valor desse projeto é de R$ 360 milhões e se configura ato
interno da prefeitura do Rio e se iguala a qualquer licitação para
construção de um equipamento cultural. O segundo, é o projeto básico e
seu detalhamento e acompanhamento será do arquiteto de notória
especialização internacional Jean Nouvel, no valor de R$ 40 milhões, de
acordo com o município.
O contrato suspenso pela liminar mantida pelo TJ-RJ é aquele de
licenciamento e acesso a acervos e exposições de três museus e apoio
curatorial, incluindo o acompanhamento das obras, assinado com a
Fundação Solomon Guggenheim (FSG), no valor de R$ 92 milhões. Para o
município, "a suspensão dos efeitos do contrato com a FSG praticamente
inviabiliza o projeto desenhado para revitalização do centro da cidade
e dinamização do turismo".
A contratação da fundação, segundo o município, assegura a qualidade do
Museu Municipal do Rio de Janeiro, garantindo-lhe acesso a acervos e
exposições dos museus Guggenheim de Nova Iorque, Hermitage de São
Petersburgo, considerado o mais importante acervo de artes plásticas do
mundo, e Kunshistorische de Viena, que reúne a coleção dos Habsburgo.