Justiça Federal vai julgar ação trabalhista entre consulado de Portugal e funcionário brasileiro

Justiça Federal vai julgar ação trabalhista entre consulado de Portugal e funcionário brasileiro

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu a competência da Justiça Federal no Rio de Janeiro para julgar reclamação trabalhista ajuizada por um funcionário brasileiro – que também possui nacionalidade portuguesa – contra o Consulado-Geral de Portugal no Rio. De forma unânime, o colegiado definiu a competência com base no fato de o brasileiro ostentar a condição de servidor público sob regime jurídico português, o que atrai a competência da Justiça Federal prevista no artigo 109, inciso II, da Constituição Federal.

A ação foi inicialmente ajuizada perante a Justiça do Trabalho. Na sentença, o juiz julgou parcialmente procedentes os pedidos do autor, mas o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) deu provimento ao recurso do consulado e declarou nula a sentença, por incompetência da Justiça trabalhista para julgar a causa, encaminhando os autos à Justiça Federal.

Ao receber os autos, o juiz federal suscitou o conflito de competência sob o argumento de que, se a demanda é oriunda da relação de trabalho, mesmo que ente de direito público externo conste da relação processual, o julgamento cabe à Justiça do Trabalho.

Regime português

A relatora do conflito, ministra Nancy Andrighi, ressaltou que o autor da reclamação é servidor público português, tendo em vista sua declaração de opção pelo regime da função pública nos termos do Decreto-Lei 444/1999, editado por Portugal para regular o estatuto de pessoal dos serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Além disso, a ministra apontou que o funcionário adquiriu a nacionalidade portuguesa.

Confirmada a condição do funcionário como parte do quadro de pessoal da administração pública portuguesa, a relatora lembrou que o Consulado-Geral de Portugal no Rio de Janeiro está vinculado diretamente ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, que compõe a administração direta do Estado Português.

Nesse contexto, Nancy Andrighi entendeu ser necessária a aplicação do artigo 109, inciso II, da Constituição brasileira, que prevê a competência dos juízes federais para processar e julgar as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e município ou pessoa domiciliada ou residente no Brasil.

Regras específicas

A relatora concluiu que não seria o caso de reconhecer a competência da Justiça do Trabalho – prevista no artigo 114, inciso II, da Constituição –, tendo em vista que o funcionário é servidor público português, cujo contrato de trabalho possui regras específicas, aplicáveis ao funcionalismo público de Portugal.

"Neste processo, há a excepcionalidade de o autor ter feito a opção pelo regime da função pública, razão pela qual não se pode enquadrar a sua situação em mera relação de trabalho firmada com ente de direito público externo", concluiu a ministra ao declarar a competência da Justiça Federal.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 168.143 - RJ (2019/0268089-9)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
SUSCITANTE : JUÍZO FEDERAL DA 19A VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO
RIO DE JANEIRO
SUSCITADO : TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 1A REGIÃO
INTERES. : DILSON SILVA SANTOS
ADVOGADO : RICARDO RADUAN - SP267267
INTERES. : CONSULADO-GERAL DA REPUBLICA PORTUGUESA NO RIO DE
JANEIRO
ADVOGADO : EUCLIDES CAVALCANTE SILVA - RJ153111
INTERES. : UNIÃO
EMENTA
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA.
AUTOR QUE FEZ A OPÇÃO PELO REGIME DA FUNÇÃO PÚBLICA. SERVIDOR
PÚBLICO PORTUGUÊS. APLICAÇÃO DO ART. 109, II, DA CF/88.
1. Conflito de competência suscitado em 26/08/2019. Conclusão ao gabinete
em 19/09/2019.
2. O propósito deste conflito é determinar qual é o juízo competente para
processar e julgar reclamação trabalhista ajuizada por servidor público
estrangeiro.
3. Infere-se dos autos que o autor da reclamatória trabalhista é servidor
público português, uma vez que, por meio de “Declaração de Opção”, optou
por filiar-se ao “Regime da Função Pública” previsto no Decreto-Lei nº
444/99, norma jurídica editada por Portugal.
4. A unidade consular reclamada está vinculada diretamente ao Ministério
dos Negócios Estrangeiros que, por sua vez, compõe a administração direta
do Estado Português, razão pela qual deve-se aplicar o art. 109, II, da CF/88,
que dispõe que aos juízes federais compete processar e julgar as causas
entre Estado estrangeiro e pessoa domiciliada ou residente no País.
5. Inaplicabilidade do art. 114, I, da CF/88, uma vez que, neste processo, há
a excepcionalidade de o autor ter feito a opção pelo “Regime da Função
Pública”, razão pela qual não se pode enquadrar a sua situação em mera
relação de trabalho firmada com ente de direito público externo.
6. Conflito conhecido. Declarada a competência do juízo suscitante - 19ª
Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Rio de Janeiro.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Superior
Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos
autos, por unanimidade, conhecer do conflito de competência e declarar competente o
Juízo Suscitante, o Juízo Federal da 19ª Vara da Seção Judiciária do Estado do Rio de
Janeiro, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Luis Felipe
Salomão, Raul Araújo, Paulo de Tarso Sanseverino, Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas
Bôas Cueva, Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra.
Ministra Relatora.
Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti.
Consignada a presença do Dr. EUCLIDES CAVALCANTE SILVA, advogado,
representando o CONSULADO-GERAL DA REPÚBLICA PORTUGUESA NO RIO DE JANEIRO.
Brasília (DF), 13 de maio de 2020(Data do Julgamento).
MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI
Presidente
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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