Identificação posterior de numeração pela perícia não afasta crime de porte de arma de uso restrito

Identificação posterior de numeração pela perícia não afasta crime de porte de arma de uso restrito

Nas situações em que o número de série da arma de fogo está raspado ou suprimido, a conduta do agente é equiparada à posse ou ao porte de armamento de uso restrito, mesmo que haja a identificação posterior da numeração pela perícia técnica. A equiparação prevista pelo artigo 16da Lei 10.826/03 tem a intenção de punir aquele que anula marca ou sinal distintivo da arma, permitindo sua transmissão ilegal para terceiros sem que seja possível identificar o verdadeiro proprietário.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi aplicada pela presidente da corte, ministra Laurita Vaz, ao indeferir pedido de liminar que buscava suspender os efeitos da condenação de três anos imposta a homem que foi preso portando um revólver calibre .38, além de quatro munições, na companhia de dois adolescentes. Ainda na sentença condenatória, a pena de reclusão foi substituída por pena restritiva de direitos.

No pedido de habeas corpus, a defesa alega que o réu não poderia ter sido condenado por porte de arma de fogo de uso restrito, pois, embora tenha havido supressão parcial do número de série, ainda foi possível identificar a arma quando da realização da perícia.

Supressão ou alteração

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) manteve a condenação de primeiro grau. Segundo a ministra Laurita Vaz, o tribunal catarinense concluiu que, ainda que existissem elementos não suprimidos na arma de fogo apreendida, o fato não seria suficiente para a desclassificação do delito para o crime de porte ilegal de arma de uso permitido, como pretendia a defesa.

Em consonância com a orientação jurisprudencial do STJ, o TJSC entendeu que a supressão ou mesmo a alteração de qualquer dos sinais de identificação é suficiente para a configuração do crime previsto no artigo 16 da Lei 10.826/03.

“Assim, o caso em análise não se enquadra nas hipóteses excepcionais passíveis de deferimento do pedido em caráter de urgência, por não veicular situação configuradora de abuso de poder ou de manifesta ilegalidade sanável no presente juízo perfunctório, devendo a controvérsia ser decidida após a tramitação completa do feito”, concluiu a ministra ao indeferir a liminar.

O mérito do habeas corpus ainda será decidido pela Sexta Turma, sob relatoria do ministro Nefi Cordeiro.

HABEAS CORPUS Nº 457.115 - SC (2018/0161476-5)
RELATOR : MINISTRO NEFI CORDEIRO
IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
PACIENTE : DOUGLAS PEDRO DE OLIVEIRA
DECISÃO
Vistos, etc.
Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de
DOUGLAS PEDRO DE OLIVEIRA contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de
Santa Catarina, na APC n.º 0000713-90.2015.8.24.0038, ementado nos seguintes termos (fl.
291): "APELAÇÃO CRIMINAL – PORTE DE ARMA DE FOGO COM A
NUMERAÇÃO SUPRIMIDA (LEI N. 10.826/03, ART. 16, PARÁGRAFO
ÚNICO, IV) – SENTENÇA CONDENATÓRIA – PLEITO DE
DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA AQUELA PREVISTA NO ART.
14, CAPUT, DA LEI 10.826/03 – ALEGADA EXISTÊNCIA de OUTROS
SINAIS IDENTIFICADORES QUE PERMITIAM A IDENTIFICAÇÃO DA
ARMA – DESCABIMENTO – SUPRESSÃO OU ALTERAÇÃO DE
QUALQUER DOS SINAIS IDENTIFICADORES CONFIGURA O TIPO
PENAL PREVISTO NO ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, IV DA LEI 10.826/03 – RECURSO DESPROVIDO. " Consta nos autos que o Paciente foi condenado às penas de 3 anos de reclusão
a ser cumprida em regime inicial aberto, bem como ao pagamento de 10 (dez) dias-multa,
com a substituição da pena privativa de liberdade por uma de prestação de serviços à
comunidade, por ter incorrido na prática do delito tipificado no artigo 16, parágrafo único, IV,
da Lei n.º 10.826/2003, pois preso portanto uma arma de fogo, tipo revólver, marca Rossi,
calibre .38, com numeração suprimida, além de 4 munições do mesmo calibre, na
companhia de dois adolescentes.
O Tribunal de origem negou provimento ao apelo defensivo.
Neste writ, a Impetrante alega que o Paciente não poderia ter sido condenado
por porte de arma de fogo de uso restrito, uma vez que, "a despeito de haver supressão
parcial do número de série, ainda foi possível a identificação da arma de fogo quando
submetida a perícia ." (fl. 5).
Requer, em medida liminar, a suspensão dos efeitos da condenação até

julgamento final do writ; no mérito, a desclassificação da conduta, para o delito previsto no
art. 14, caput, da Lei n.º 10.826/2003.
É o relatório inicial.
Passo a decidir o pedido urgente.
No caso, não se constata ilegalidade patente que enseje a concessão da medida
urgente requerida.
Com efeito, o direito invocado pela parte Impetrante não é de reconhecimento
que se mostra prontamente inequívoco, notadamente diante dos fundamentos utilizados no
acórdão impugnado, os quais não se mostram, em princípio, desarrazoados ou ilegais, in
verbis: "Inicialmente, vale ressaltar que a materialidade e a autoria do
crime previsto no art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei n. 10.826/03
sequer foram questionadas no recurso, restando ambas plenamente
demonstradas pelos elementos de prova constantes nos autos, destacando-se
que a materialidade encontra-se consubstanciada por meio do auto de prisão
em flagrante (p. 3), do boletim de ocorrência (p. 18) e do auto de exibição e
apreensão (p. 19), que constatou a apreensão de um revólver calibre .38 da
marca Rossi, '4 special; uma réplica de pistola .380 na cor prata, uma
balaclava preta, quatro munições calibre .38 e um celular preto da marca
Samsung. Da mesma forma, não restam dúvidas quanto à autoria, uma vez
demonstrada por meio dos depoimentos dos policiais, coerentes e uníssonos,
bem como no interrogatório do acusado, na etapa policial.
(...)
Portanto, ainda que existam elementos não suprimidos na arma de
fogo apreendida, tal fato não seria suficiente para a desclassificação para o
delito pretendido, previsto no art. 14, caput, da Lei n. 10.826/03, haja vista
que a supressão ou mesmo a alteração de qualquer dos sinais de
identificação seria suficiente para que o delito previsto no art. 16, parágrafo
único, IV, restasse configurado . No caso em tela, aliás, o número suprimido
foi exatamente aquele relacionado ao número de série, principal fator de
identificação da arma de fogo." (fls. 293/295, grifei).
O acórdão parece adequar-se à orientação jurisprudencial desta Corte, no
sentido de que, "estando o número de série da arma de fogo raspado ou suprimido (situação
essa comprovada nos autos), a conduta do agente será equiparada à posse ou porte de arma
de fogo de uso restrito, sendo irrelevante a identificação posterior pela perícia técnica da
numeração, pois a intenção da lei foi punir com maior severidade aquele que, de qualquer
modo, anula marca ou sinal distintivo da arma, permitindo-se sua transmissão a terceiros
ilegalmente e obstaculizando/dificultando a identificação do verdadeiro proprietário do
armamento " (AgRg no AgRg no AREsp 864.075/SC, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE

ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 07/06/2016, DJe 21/06/2016).
Assim, o caso em análise não se enquadra nas hipóteses excepcionais passíveis
de deferimento do pedido em caráter de urgência, por não veicular situação configuradora de
abuso de poder ou de manifesta ilegalidade sanável no presente juízo perfunctório, devendo a
controvérsia ser decidida após a tramitação completa do feito.
Ante o exposto, INDEFIRO o pedido liminar. Solicitem-se informações ao Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina.
Após, remetam-se os autos ao Ministério Público Federal para o parecer.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília (DF), 05 de julho de 2018.
MINISTRA LAURITA VAZ
Presidente

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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