Trabalhadora obrigada a abrir empresa receberá dano material
A Bradesco Vida e Previdência
terá que pagar indenização por danos materiais a ex-empregada obrigada a
constituir empresa para trabalhar com vendas de produtos de previdência
em agências do Banco Bradesco. Os ministros da Primeira Turma do
Tribunal Superior do Trabalho concluíram que a exigência da abertura de
sociedade empresarial teve o objetivo de fraudar a legislação
trabalhista.
No caso analisado pelo ministro Vieira de Mello Filho, a 3ª Vara do
Trabalho de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, reconheceu a existência
de relação de emprego entre a trabalhadora e a Bradesco Vida e
Previdência, uma vez que os serviços de venda de seguros eram prestados
por pessoa física, com onerosidade, pessoalidade e em caráter não
eventual, nas dependências do banco. Por consequência, concedeu à
ex-empregada créditos salariais resultantes do vínculo trabalhista.
O Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (MS) também entendeu
que não se tratava de uma corretora de seguros autônoma (Lei nº
4.594/64), pois a empregada era submetida à fiscalização da empresa de
previdência, e não havia liberdade no negócio, característica dos
autônomos. De qualquer modo, o TRT afastou da condenação a devolução
dos valores gastos pela trabalhadora com a constituição, manutenção e
fechamento da sociedade empresarial.
O julgamento no TST
Entretanto, de acordo com o ministro Vieira de Mello Filho, a
empregada tinha direito ao ressarcimento das despesas decorrentes da
constituição, manutenção e extinção da pessoa jurídica, pois a redução
do seu patrimônio teve origem no comportamento do empregador. A
indenização era necessária como forma de compensá-la pelos gastos que
teve com a sociedade empresarial.
O relator explicou que comete ato ilícito não somente aquele que
viola direito alheio por negligência, imprudência ou imperícia, mas
também aquele que, ao exercer um direito, excede os limites impostos
pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Assim, diferentemente do que afirmou o Regional, a exigência de abertura
de uma empresa não se trata de exercício normal de um direito (artigo
153 do Código Civil), ressaltou o ministro Vieira de Mello.
O relator ainda esclareceu que a constituição de pessoas jurídicas
permite que seus criadores, se houver insucesso da atividade empresarial
que pretendem desempenhar, não fiquem desprovidos de todo patrimônio
acumulado. E a empregada (que não é responsável pelos riscos da
atividade econômica do empregador, conforme o artigo 2º da CLT) não
teria benefícios com a constituição de uma empresa, pois seus salários
decorrem da prestação de serviços ao empregador.
Para o ministro, a Bradesco Vida e Previdência é que se beneficiou
da exigência, tendo em vista que deixou de honrar obrigações
trabalhistas como os recolhimentos dos depósitos do FGTS e das
contribuições para o INSS. Portanto, a constituição da sociedade
empresarial foi desvirtuada da sua finalidade, ou seja, permitir que a
pessoa física controle os riscos inerentes ao desempenho da atividade
empresarial, porque serviu, unicamente, para burlar os direitos sociais
garantidos na Constituição.
O presidente da Turma, ministro Lelio Bentes Corrêa, destacou a
contradição do entendimento do TRT/MS, ao confirmar a existência de
vínculo de emprego entre as partes (apesar da constituição da pessoa
jurídica) e, ao mesmo tempo, consagrar que a Bradesco Vida e
Previdência, quando exigiu abertura de empresa individual, exerceu
regularmente o seu direito. “Como exerceu regularmente o seu direito se
praticou fraude contra a legislação trabalhista?”, ponderou.
O ministro Walmir Oliveira da Costa chamou a atenção para o fato de
que “a conduta da empresa é contrária ao exercício regular do direito”.
Na sua opinião, sem a constituição da empresa, a empregada não poderia
prestar serviço, pois o empregador mascarava o vínculo de emprego por
meio da pessoa jurídica.