Contrato nulo não impede indenização por doença ocupacional
O reconhecimento da nulidade
absoluta do contrato de trabalho não impede que se receba uma
indenização por danos morais e materiais em decorrência de doença
ocupacional. Contratada sem concurso público pelo Município de Londrina e
sem vínculo de emprego válido, uma trabalhadora, após mais de dez anos
de serviço, adquiriu artrose na coluna cervical e tendinite nos ombros e
deverá receber R$ 2.600 por danos morais e R$ 1 mil por danos
materiais, atualizáveis a partir do ajuizamento da reclamação. O agravo
de instrumento do município, que buscava reformar a decisão, foi
rejeitado pela Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho.
Em situações semelhantes, afirma o relator do agravo, ministro
Maurício Godinho Delgado, o TST “tem entendido que os direitos que
ultrapassem a esfera tipicamente trabalhista, embora relacionados à
contratação nula, devem ser plenamente garantidos ao empregado”. Após
citar precedentes dos ministros Alberto Bresciani, Lelio Bentes Corrêa,
Maria Cristina Peduzzi e Renato Paiva, o ministro Godinho Delgado
observou não ser razoável que o “trabalhador, pelo fato de estar
vinculado ao Poder Público por um contrato nulo - nulidade esta oriunda
do próprio ato da entidade estatal - não esteja albergado pela proteção
constitucional relativa aos seus direitos fundamentais”.
Contrato nulo
A trabalhadora foi contratada em março de 1993 para uma frente de
trabalho, prestando serviços gerais no terminal rodoviário de Londrina,
recebendo como pagamento R$ 260 mensais. Em janeiro de 2004, teve seu
contrato rescindido por determinação do Ministério Público, por ser a
contratação efetuada sem concurso público. Sem receber verbas
rescisórias que lhe eram devidas, ajuizou a reclamação. Após ver alguns
de seus pedidos deferidos, recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da
9ª Região (PR) para obter a indenização por danos morais e materiais
que lhe fora negada.
Por considerar que o tomador de serviços tem obrigação de zelar pela
saúde do trabalhador, o TRT/PR, então, condenou o município ao
pagamento da indenização. Contra essa decisão, o município recorreu
alegando a impossibilidade de reconhecimento de qualquer efeito
referente à relação de trabalho derivada de contrato nulo e a
impossibilidade de deferir indenização por doença de trabalho, quando
esta não é assim considerada para fins beneficiários acidentários.
No TST, o relator na Sexta Turma destacou a necessidade da
possibilidade jurídica de reparação, quando a doença ocupacional, a
doença profissional e o acidente do trabalho podem, segundo sua
gravidade, provocar substanciais dores físicas e psicológicas no
indivíduo, com intensidade imediata ou até mesmo permanente. Pelas
informações expostas no acórdão regional, o ministro Godinho Delgado
verificou haver prova convincente de que a empregada era portadora de
doença ocupacional que a debilitou para o desenvolvimento pleno de
atividades do trabalho, e que esta condição derivou do conjunto de suas
atribuições funcionais.
Com essa fundamentação, o ministro concluiu que, apesar do
reconhecimento da nulidade da contratação por ausência de concurso
público, o município “não poderia se eximir da indenização por danos
morais, de forma a privilegiar a prática de qualquer ato que importasse
em constrangimento e humilhação à trabalhadora, de modo a afetar sua
honra e dignidade, direitos constitucionalmente tutelados, conforme o
artigo 5º, X, da Constituição Federal”. O ministro Godinho Delgado
frisou, ainda, que “o interesse público não pode suplantar os atos
ilícitos e causar dano a outrem”.
Seguindo o voto do relator, que considerou incólumes os dispositivos
legais e constitucionais invocados pelo município e inservíveis os
julgados apresentados para confrontação de divergência jurisprudencial, a
Sexta Turma negou provimento ao agravo de instrumento. (AIRR - 422440-55.2004.5.09.0018)