Desconto na multa do FGTS em troca de manutenção de emprego é ilegal
A multa de 40% sobre os
depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) que deve ser
paga pelo empregador em caso de demissão sem justa causa não pode ser
objeto de negociação coletiva. Não existe, no ordenamento jurídico
brasileiro, nenhuma norma que autorize a redução da multa porque o
valor em discussão extrapola o patrimônio jurídico do trabalhador e
alcança, pela natureza do órgão gestor do FGTS, interesse de toda a
coletividade – o FGTS é um fundo social por meio do qual são feitos
investimentos em programas de habitação popular, saneamento básico e
infraestrutura urbana.
O Tribunal Superior do Trabalho julgou recentemente dois casos
envolvendo a CEF e empresas de vigilância e segurança do Distrito
Federal (OMNI Ltda. e Confederal Vigilância e Transporte de Valores
Ltda.). Com base em norma coletiva, as empresas pagavam apenas metade
da multa do FGTS a seus empregados em troca de garantia de emprego por
seis meses nas empresas que a sucederam em contratos de prestação de
serviços. A rotatividade no setor de serviços de vigilância e limpeza é
grande e a substituição de uma empresa por outra é rotineira,
especialmente quando contratadas por entes da Administração Pública.
Mas, segundo os relatores dos recursos, ministros Alberto Bresciani
e Emmanoel Pereira, a promessa de manutenção de emprego não pode ser
trocada por um direito inscrito em norma de ordem pública. "Embora seja
desejável a continuidade de relações de emprego, o objeto não se
justificará se for comprometido renúncia a garantias sociais outorgadas
aos trabalhadores. O procedimento sob análise não remete à transação,
mas à renúncia de direito, sem contrapartida legítima e cabível”,
afirmou Bresciani.
Segundo ele, a negociação coletiva é um instituto valorizado e
protegido pela Constituição, mas não está livre de limites. “A mesma
Constituição, que consagra acordos e convenções coletivas de trabalho,
fixa direitos mínimos para a classe trabalhadora, exigindo a proteção
da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho. Esta
proteção não pode subsistir sem a reserva de direitos mínimos, infensos
à redução ou supressão por particulares e categorias”, explicou. “A
detenção de mandato para negociar não autoriza as entidades sindicais a
recusarem normas de ordem pública e de conteúdo imperativo,
irrenunciável e, assim, imunes à flexibilização”, afirmou o ministro
Bresciani em seu voto.
Em convenção coletiva, o Sindicato dos Empregados em Empresas de
Segurança e Vigilância do Distrito Federal e o Sindicato das Empresas
de Segurança Privada, Sistemas de Segurança Eletrônica, Cursos de
Formação e Transporte de Valores no Distrito Federal ajustaram que as
empresas que assumem a prestação de serviços, em razão de nova
licitação pública, se obrigam a contratar o empregado da empresa
anterior, garantindo a manutenção do vínculo por pelo menos seis meses.
A última, por sua vez, fica dispensada do pagamento do aviso prévio,
pagando a multa do FGTS no importe de 20% dos depósitos. Uma cláusula
fixou que a rescisão decorre de culpa recíproca das partes.
Os ministros Alberto Bresciani e Emmanoel Pereira explicaram que a
declaração de culpa recíproca só pode ser reconhecida judicialmente, no
âmbito de um processo trabalhista, e não cabe norma coletiva nesse
sentido. A Lei nº 8.036/90, que dispõe sobre o FGTS, prevê que, quando
ocorrer despedida por culpa recíproca ou força maior, reconhecida pela
Justiça do Trabalho, o percentual da multa será de 20%.
Segundo os relatores, o Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região
(DF/TO), ao reconhecer a culpa recíproca, ajustada em norma coletiva e
sem homologação judicial, com a consequente redução da multa do FGTS,
violou dispositivos legais. Tanto a Terceira quanto a Quinta Turma do
TST acolheram os recursos da CEF e julgaram improcedentes as ações
mediante as quais as empresas OMNI e Confederal questionaram a conduta
da CEF de não lhes fornecer certificado de regularidade do FGTS, em
virtude do pagamento de metade da multa. Segundo o ministro Bresciani,
a irregularidade da redução da indenização do FGTS para 20% legitima a
cobrança da diferença pela CEF.