Um quarto de educação

Um quarto de educação

Analisa os dados do Estado do Ceará em matéria educacional, a partir do Censo escolar 2002, disponilizado pelo MEC/INEP, e consta o descumprimento do princípio federativo de regime de colaboração entre Estados e Municípios.

D os 2.848.731 alunos matriculados, no ano de 2002, nas escolas cearenses, apenas 25% desse total, isto é, 722.743 estudantes, estão na rede estadual de ensino. Podemos constatar esta informação após análise dos dados do Censo Escolar 2002, disponibilizados, on-line, pelo Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais, do MEC (http://www.inep.gov.br).

A baixa cobertura do governo estadual na matrícula de educandos no ensino fundamental, responsabilidade dos Municípios e também Estados, fere a Constituição Federal. O ensino Fundamental, a partir de 1988, foi assegurado, pela Carta Magna, como direito público subjetivo, isto é, direito social que famílias e os educandos, de qualquer idade, não podem abrir mão.

Podemos apurar, a partir do Censo Escolar 2002, que os municípios cearenses são responsáveis, no ensino fundamental, pela matrícula de 1.532.516 estudantes, o que caracteriza, a municipalização de fato do ensino obrigatório, de cima para baixo, e uma crescente desresponsabilidade do Estado com a primeira etapa da educação básica.

No ano de 2002, a rede estadual de ensino fez a matrícula, no ensino fundamental, de 324.916 crianças, contra 1.338.780 estudantes matriculados nos municípios.

O Censo Escolar 2002 revela que o governo do Estado não cumpre o §3º do artigo 211 da Constituição Federal, que determina que “os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e ensino médio”.

Os dados do MEC mostram que de um universo de 1.863,625 crianças matriculadas no ensino fundamental, a rede estadual assumiu a matrícula de apenas 324.916 crianças, ficando os Municípios com 1.338.780 crianças e a rede privada de ensino com 199.446 crianças

O processo de descentralização do ensino iniciado na década de 90 pelo governo estadual acabou por criar um desequilíbrio na divisão das responsabilidades das entidades federativas, gerando uma maior tarefa municipal na oferta de ensino obrigatório. Os municípios são, na verdade, os entes, historicamente, com menos recursos materiais e professores qualificados para tamanho desafio educacional.

Outro dado que me chamou à atenção, a partir do Censo Escolar 2002, é o número de matrículas no ensino médio realizado pelo Estado. Foram matriculados, no ano de 2002, na rede estadual de ensino, 276.823 jovens, contra 1.525 matriculados na rede municipal. A rede privada foi a responsável pela matrícula de 56.544 crianças.

O Censo Escolar 2002 deixa claro para todos nós que o governo estadual priorizou, na sua rede escolar, a oferta do ensino médio, abarcando 82% das matriculas, ficando os municípios com apenas 0,5% dos educandos matriculados. Isto não se constitui nem ganho para as famílias nem para os municípios que têm ficado praticamente sozinhos na tarefa de educar as crianças no ensino fundamental, quando esta responsabilidade deve ser repartida com a rede estadual de ensino.

A partir da nova LDB, as classes de alfabetização legalmente desapareceram, isto é, não se justificam mais no sistema escolar, uma vez que a educação básica ficou dividida em educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. Sobre as classes de alfabetização, informações curiosas e surpreendentes podem ser extraídas do Censo Escolar 2002. A rede estadual de ensino matriculou, no ano 2002, apenas 127 alfabetizandos, contra 21.906 crianças matriculadas na rede municipal e 33.447 matrículas na rede privada de ensino.

No Ceará, verificamos que, tanto os Municípios como as escolas privadas, estão funcionando como “bloqueadores” do fluxo escolar, impedindo que crianças, aos 6 ou 7 anos de idade, já possam ingressar no ensino fundamental, obrigatório.

As escolas precisam entender que a primeira série do ensino fundamental é a etapa inicial para o processo de aquisição da leitura e escrita, da letramento, não se justificando, pois, dentro do aparelho escolar, classes de alfabetização para preparar ou promover o aluno para o ensino fundamental.

Por fim, uma sugestão em forma de recomendação: a Secretaria de Educação Básica do Estado do Ceará (SEDUC) deveria intervir no sistema escolar e pôr fim às classes de alfabetização no Ceará e, com o apoio do Conselho Estadual de Educação, esclarecer aos pais e educadores o valor social do acesso das crianças ao ensino fundamental a partir dos 6 ou 7 anos de idade, para que não retardem, no futuro, já como jovens, o ingresso na educação superior.

Sobre o(a) autor(a)
Vicente Martins
Professor da Universidade Estadual Vale do Acaraú(UVA), de Sobral, Estado do Ceará, Brasil. Pós-doutorado em Linguística pela UFBA.
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