Direitos adquiridos e direito internacional privado

Direitos adquiridos e direito internacional privado

A teoria dos direitos adquiridos não pode servir de fundamento geral do direito internacional privado, cada país regula as circunstâncias em que os direitos obtidos no estrangeiro sejam considerados adquiridos e reconhecidos pela ordem jurídica interna.

A teoria dos direitos adquiridos foi definida por Antoine Pillet: objeto à parte e independente do conflito de leis.

Não se decide pela lei competente ou pela norma de direito aplicável, mas se reconhece a existência de um direito já adquirido (o foro local respeita o que é consolidado em outra jurisdição).

Entretanto, existem opiniões contrárias.

Etienne Bartin considera que não há nesta regra de respeito internacional aos direitos adquiridos um princípio novo e original de solução de conflitos de leis, justaposto às outras soluções que constituem o sistema do conflito de leis.

 Arminjon acredita que ser vaga a tentativa de Pillet ao distinguir o problema do reconhecimento dos direitos adquiridos da questão do conflito de leis, ou o direito que ainda não existe do direito que já nasceu, pois nas duas situações, o problema é idêntico e deve ser resolvido por meio das mesmas regras.

Segundo Rechsteiner (2007), direitos adquiridos no direito internacional privado significa, em síntese, a proteção e o reconhecimento dos direitos, adquiridos no estrangeiro de maneira válida, devendo ser respeitada a ordem jurídica interna.

A teoria está baseada na legitimação da aplicação do direito estrangeiro no País, porém, não leva suficientemente em consideração o direito aplicável a relações jurídicas de direito privado com conexão internacional, e de acordo com qual direito estrangeiro se considera validamente adquirido um direito. Ou seja, a teoria dos direitos adquiridos não pode servir de fundamento geral do direito internacional privado, cada país regula as circunstâncias em que os direitos obtidos no estrangeiro sejam considerados adquiridos e reconhecidos pela ordem jurídica interna.

Salienta-se que os direitos adquiridos no estrangeiro estão protegidos pelo direito internacional privado por dois motivos: Interesse da continuidade (o direito internacional privado da lex fori (lei do foro) deve observar se algum direito no estrangeiro foi validamente adquirido, e, se realmente existe o interesse de reconhecê-lo perante o direito interno); Garantia da certeza de direito.

No que se refere aos atos jurídicos que dizem respeito ao estado civil de uma pessoa física (casamento, reconhecimento de filhos, adoção, divórcio, entre outros) realizados no estrangeiro, os Estados, em regra, alegam razões da certeza de direito (securité de droit) para justificar o seu reconhecimento no País.

Por este motivo os atos jurídicos, se válidos no estrangeiro, não deveriam sofrer intervenções do direito doméstico sem que existisse um motivo plausível para isso, sendo irrelevante saber se estão fundados em decisão judicial ou não.

Entretanto, será sempre o direito internacional privado da lex fori que decidirá, no caso concreto, quando um ato jurídico deste tipo é reconhecido pela ordem jurídica interna, pois o que viola a ordem pública de um Estado, pode não violar de outro.

 Exemplo disso é a poligamia, que por sua vez demonstra que a teoria abstrata dos direitos adquiridos inexiste no direito internacional privado, pois lhe falta o conceito de direito adquirido, admitindo a sua aplicação direta a casos concretos, independentemente das regras de direito internacional privado da lex fori.

Mas, o direito internacional privado brasileiro reconhece a existência de direitos validamente adquiridos no exterior. Como, por exemplo, o segundo casamento de brasileiros celebrado no exterior, que deve ser reconhecido aqui, sem precisar de prévia homologação de sentença estrangeira de divórcio pelo STJ, quando residirem e domiciliarem em país estrangeiro à época do divórcio e do segundo casamento.

Muitas convenções estrangeiras expressam sobre direitos adquiridos no direito internacional privado, entretanto, não contribuem para uma compreensão melhor deste instituto jurídico.

Rechsteiner (2007) conclui que a teoria dos direitos adquiridos perdeu seu brilho no decorrer do tempo, pelo fato de as normas do direito internacional privado dizerem quando deve ser aplicável o direito interno ou o direito estrangeiro.

Por isso não é preciso recorrer à teoria dos direitos adquiridos, sendo que as dúvidas resolvem-se pelas regras jurídicas do direito internacional privado, ou ainda, por normas específicas que tem origem no direito interno ou em tratados internacionais.

REFERÊNCIA:

RECHSTEINER, Beat Walter.  Direito internacional privado: teoria e prática. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

Sobre o(a) autor(a)
Gisele Corbellini
Advogada.
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