Aspectos jurídicos sobre aval e fiança e suas distinções

Aspectos jurídicos sobre aval e fiança e suas distinções

Análise objetiva e esclarecedora das garantias fidejussórias mais populares no cotidiano, o aval e a fiança, com uma abordagem dos seus aspectos e as respectivas distinções.

Dentre do estudo das garantias fidejussórias, ou seja, àquelas cujo respaldo garantidor afigura-se na figura de uma pessoa física ou jurídica que apresente condições econômicas assecuratórias de relação jurídica celebrada por outrem, destacam-se duas figuras que serão objeto deste informativo, a fiança e o aval.

Em se tratando de garantias pessoais destacam-se os institutos do aval e da fiança que por vezes acabam sendo confundidos entre si nas relações jurídicas celebradas no cotidiano. Não obstante, em que pese às similitudes entre a denominação e aplicação dos institutos cada qual detém sua peculiaridade e regramento próprio no ordenamento jurídico.

AVAL

O aval consiste em garantia pessoal específica dos títulos cambiais, anteriormente regulada pelo Código Comercial e agora disciplinada pela lei 10.406/02 no art. 897 e demais legislações especiais inerentes ao regramento de títulos de crédito.

São sujeitos no aval, o avalista denominação dada ao garantidor e avalizado denominação dada ao devedor principal.

Afigura-se o aval como garantia pessoal concedida por terceiro que intervém na relação jurídica em razão da emissão de um título de crédito para assegurar o cumprimento da obrigação expressa no titulo na hipótese do inadimplemento pelo obrigado, respondendo com seu patrimônio pelo pagamento.

O aval revela-se como uma obrigação principal de pagar, dotado de autonomia e literalidade, como toda obrigação cambial e constitui-se por declaração expressa no verso ou anverso do próprio titulo ou sua extensão, sendo suficiente para tanto a aposição de simples assinatura do avalista no titulo, pelo qual passa a responder em caso de inadimplemento da obrigação pelo devedor principal, pelo pagamento integral da obrigação que garantiu, sendo, vedado o aval parcial da obrigação.

Tamanha é a responsabilização do avalista que o mesmo responde pela obrigação que garantiu em pé de igualdade com o devedor principal, sendo facultado ao credor exigir simultaneamente do devedor e avalista o pagamento da obrigação inadimplida, não havendo que se falar em ordem de exigência do pagamento, em razão da autonomia do aval. Sob outro aspecto, ainda no tocante a responsabilidade do avalista, esta perdura ainda mesmo quando declarada nula a obrigação garantida, salvo caracterização de vicio de forma no tocante a instituição do aval.

No tocante a assinatura do cônjuge para concessão do aval, reza o inciso III do art. 1647 do Novo Código Civil que o avalista casado, excetuado o regime de separação total de bens, não poderá fazê-lo sem o consentimento do cônjuge. Ocorre que referido dispositivo por regular relações civis relativiza-se nas relações comerciais onde basta a simples assinatura do cônjuge no titulo de crédito, para seja evidenciado o consentimento do aval, dispensando-se a outorga conjugal. A ausência de assinatura não invalida o ato, apenas ressalva os bens do cônjuge que não assinou.

Na hipótese do avalista proceder ao pagamento da obrigação no lugar do devedor principal, lhe é assegurado o direito de exigir do credor além da entrega do titulo, a quitação regular da obrigação. Anote-se que em tal hipótese é assegurado ao avalista o direito a ação de regresso contra o devedor principal para reaver o valor pago com as correções legais.

FIANÇA

A fiança é instituto do Direito Civil de natureza contratual e conceitua-se como garantia pessoal prestada por determinada pessoa pelo qual esta garante o pagamento ao credor por obrigação não paga pelo devedor principal.

São sujeitos na fiança, o fiador denominação dada ao garantidor e afiançado denominação dada ao devedor principal.

Na fiança, a obrigação do fiador é acessória de outra principal, que em nosso ordenamento jurídico pode ser caracterizada em três espécies: Convencional onde em virtude do ajuste de vontades entre fiador e afiançado resta caracterizada; Legal a cuja lei impõe sua aplicação em caráter preventivo; Judicial que decorre de imposição judicial a uma das partes do processo com o fim precípuo de resguardar interesses em litígio.

Tratando-se de garantia acessória, esta deixa de existir na hipótese de extinção e/ou modificação da obrigação principal a quem não tenha intervindo o fiador. Note-se que na espécie de garantia em comento, estende-se como obrigação do fiador em razão do ajuste não apenas o dever de pagar, podendo ser objeto de fiança obrigações de fazer e não fazer em razão do ajuste principal.

O instituto da fiança encontra-se regulado a partir do art. 818 do Código Civil. Sua instituição depende de forma prescrita em lei, neste sentido, devem ser observadas as formalidades para sua instituição e validade. Neste sentido, a fiança necessariamente será por escrito não admitindo-se que dela se extraia interpretação extensiva.

A lei possibilita a instituição da fiança mesmo na hipótese de não consentimento do devedor, haja vista que prestigia-se o direito do credor em detrimento dos sentimentos pessoais externados pelo devedor. A doutrina classifica a espécie em comento como fiança a revelia. Sob outro aspecto, a lei permite também ao credor a instituição de fiança por obrigações futuras, condicionando, todavia, a exigência da certeza, liquidez e exigibilidade da dívida face o devedor. Referida espécie revela-se comum em contratos rurais em razão da álea (risco) do empreendimento/negócio.

A fiança poderá ser limitada ou ilimitada a obrigação do devedor, ou seja, na hipótese de limitar-se a obrigação a fiança será certa e delimitada, com especificação do valor afiançado e a data da vigência do encargo, perdendo seu efeito após o decurso do prazo. Na ilimitada há a extensão da responsabilização pelo adimplemento da obrigação, certo que suas características nesta hipótese se estenderão aos delineamentos da obrigação, ressalvando-se as circunstancias de caráter pessoal.

Instituído o encargo do fiador, este estará responsabilizado ao limite da obrigação afiançada não lhe podendo ser imputado obrigação mais onerosa, ou seja, ao fiador não podem ser exigidas obrigações superiores àquelas que incumbiu-se na condição de garantidor.

Ao revés do aval, a fiança inexistente na hipótese de nulidade da obrigação principal, salvo na hipótese da nulidade ocorrer em razão da incapacidade do devedor.

O credor da obrigação poderá recusar o fiador oferecido pelo devedor na hipótese daquele não apresentar elementos que evidenciem idoneidade social e econômica, podendo, ainda, na hipótese de superveniência destes elementos exigir do devedor a substituição do fiador por outro com tais características.

A fiança apresenta uma faculdade legal doutrinariamente conhecida como beneficio de ordem, pelo qual pode o fiador exigir do credor que antes que lhe seja exigida o cumprimento da obrigação, seja primeiramente exigida do devedor/afiançado por intermédio da penhora de seus bens, ocasião em que o dever pela indicação dos bens do devedor será encargo do fiador.

Anote-se a respeito do beneficio de ordem, que na maioria dos contratos garantidos por fiança, o credor impõe de forma expressa a renuncia do direito do beneficio de ordem pelo fiador, como meio de atacar diretamente o patrimônio de todos os envolvidos na relação jurídica, sem ter que esperar por isso. Ainda, não haverá a figura do beneficio de ordem quando, o fiador tenha se obrigado como pagador principal ou na hipótese do devedor ter decretado sua insolvência civil ou falência.

Diferente do aval, na fiança é possível a instituição de mais de um fiador com a possibilidade de comprometimento expresso no instrumento da parte a que se destina a obrigação de cada qual.

Tal qual no aval, o fiador que proceder o pagamento da obrigação subroga-se nos direitos do credor para exigir do afiançado e demais fiadores pela respectiva quota, entendendo-se ainda ao devedor/afiançado a responsabilização pelas perdas e danos.

Na hipótese de fiança prestada por prazo indeterminado, poderá o fiador a qualquer tempo exonerar-se do encargo, mediante comunicação expressa ao credor de tal intenção, pelo qual, a contar do recebimento ficara o fiador ainda vinculado ao encargo pelo prazo de sessenta dias. Noutra senda, na hipótese de falecimento do fiador as forças da herança apenas alcançaram as obrigações vencidas antes do óbito, inexistindo obrigação vencida, extingue-se a fiança.

Como dito sendo a fiança uma obrigação acessória da principal, havendo a extinção desta, o acessório deixa de existir. Nesta hipótese, ocorrendo o advento de quaisquer das formas de extinção das obrigações, como o pagamento, a novação, a transação, o advento, a remissão, a anulação, dentre outros. O Código Civil elenca hipóteses em que o fiador ficara desobrigado do encargo de fiador, tais como: concessão do credor ao devedor de moratória sem a notificação do fiador; se o credor apresentar óbices a impossibilidade de atribuição ao fiador do exercício de sub-rogação e preferências na hipótese de adimplemento da obrigação; se o credor aceitar objeto diverso daquele estipulado na obrigação de forma amigável ainda que advenha a perda em virtude da evicção. Em tais hipóteses por força de lei estará desobrigado o fiador.

O legislador ainda previu a hipótese de exoneração da fiança na hipótese do fiador tenha requerido o beneficio da excussão (beneficio de ordem), ou seja, se no processo de execução, antes dos embargos, tenha exigido do credor que primeiro sejam penhorados os bens do devedor, indicados na ocasião, suficientes para a solução da dívida afiançada.

Outro aspecto importante para frisar é que, o fiador responde com seus bens pela obrigação afiançada, ainda mesmo seja um bem de família, haja vista que o art. 3ª, inciso VII, da Lei n° 8 009/90 admite a penhora de bem de família do fiador. Neste aspecto, sempre importante frisar que a admissão de referido encargo demanda muita atenção e confiança no afiançado, posto que na hipótese deste não cumprir com sua obrigação, o fiador poderá até mesmo ver-se destituído de sua moradia familiar.

Por fim importante anotar que por imposição legal, inciso III do art. 1647 do Código Civil, temos que: “Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: (...) III - prestar fiança ou aval.”, sendo necessário a outorga conjugal para seja prestado o aval.

CONCLUSÃO

Em que pese a finalidade de ambos os institutos sejam assegurar obrigação de terceiros, neste texto procurei abordar os principais aspectos e pontos controvertidos nos respectivos institutos. Todavia, a principal diferença consiste, porquanto aquele constitui uma obrigação autônoma e independente, onde o avalista garante solidariamente o pagamento, ou seja, o avalista obriga-se no mesmo nível de seu avalizado. Já, na fiança, a responsabilidade é subsidiária, o fiador garante o débito de outrem, colocando seu patrimônio para lastrear a obrigação, porém o titular do débito garantido é um terceiro.

A propósito da discussão trago a à baila os ensinamentos doutrinários de Silvio de Salvo Venosa, in Direito Civil, 4.ª ed. Contrato em espécie, f. 428, que elucida a diferença entre aval e fiança:

"O aval também é garantia pessoal, regulado, no entanto, pelos princípios cambiários e com a fiança não se confunde. Aval é declaração unilateral cuja finalidade é garantir pagamento de título de crédito. No aval, não há contrato. Trata-se de obrigação autônoma e literal, como toda obrigação cambial. A outorga conjugal é requisito essencial para a fiança, o que não ocorria no aval, até o Código de 2002, que passou a exigi-la, revirando os princípios cambiários tradicionais. No novo sistema, tanto o aval quanto a fiança exigem a vênia conjugal (art. 1.647, III). Ademais, a solidariedade é princípio fundamental do direito cambiário, atingindo conseqüentemente o aval. Na fiança, a responsabilidade do fiador é subsidiária; a solidariedade entre fiador e afiançado somente pode ser concebida por expressa disposição contratual na esfera civil, sem, contudo, a mesma amplitude do instituto na esfera cambial. Também não se confunde a fiança com a assunção de dívida, pela qual o assuntor assume a dívida de outrem, com modificação subjetiva na relação jurídica."

Por fim, com o presente, espero que doravante ao incumbir-se de quaisquer destes encargos, estejam cientes de seus aspectos e respectivas conseqüências.

BIBLIOGRAFIA:

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. Volume I. São Paulo: Saraiva, 2000.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. Contratos em espécie. São Paulo, 4ª Ed. São Paulo: Atlas, 2004.

Sobre o(a) autor(a)
Jefferson Ursioli Lopes
Advogado e Consultor Jurídico, Sócio do escritório Urcioli Advogados, mestrando Direito Civil e especialista em Direito Civil e Processo Civil pela EPD, com extensões nas áreas de direitos do consumidor, contratual, bancário...
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