A aplicação das máximas de experiência no Direito Processual do Trabalho
Analisa a utilização das máximas ou regras de experiência no direito processual do trabalho, especificamente em relação à matéria probatória, procurando apontar as funções tradicionais, bem como as mais atuais, das regras de experiência nesse campo.
O presente artigo tem por objetivo analisar a utilização das máximas ou regras de experiência no direito processual do trabalho, especificamente em relação à matéria probatória, procurando apontar as funções tradicionais, bem como as mais atuais, das regras de experiência nesse campo.
O tema foi escolhido levando-se em consideração dois motivos principais: a ausência, na doutrina nacional, de sistematização abrangente e atual sobre as funções das máximas de experiência no direito processual do trabalho e a pretensão de utilização do estudo como mecanismo para reacender o debate sobre o uso consciente das máximas de experiência pela jurisprudência.
A Consolidação das Leis do Trabalho prevê a utilização das máximas de experiência no procedimento sumaríssimo, especificamente em seu artigo 852-D: O Juiz dirigirá o processo com liberdade para determinar as provas a serem produzidas, considerado o ônus probatório de cada litigante, podendo limitar ou excluir as que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias, bem como para apreciá-las e dar especial alor às regras de experiência comum ou técnica”
Não se trata, porém, de ferramenta adstrita ao procedimento sumaríssimo. Com efeito, as máximas de experiência constituem recurso tradicional na apreciação da prova, sendo mencionadas no artigo 335 do Código de Processo Civil, de aplicação subsidiária, cuja redação manteve-se inalterada desde seu advento em 1973. Tal disposição legal estabelece: “Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a essa, o exame pericial”.
Conforme se verá, a utilização das máximas de experiência vai além da tradicional valoração das provas produzidas, podendo funcionar, a partir de uma visão publicista e instrumentalista do processo, como mecanismo para abreviar a solução das demandas, fazendo com que a prestação jurisdicional cumpra seu papel, que é a pacificação social com justiça.
MÁXIMAS DE EXPERIÊNCIA – CONCEITUAÇÃO PRELIMINAR
Deve-se a Friedrich Stein o estudo pioneiro e amplo sobre as máximas de experiência no âmbito do direito, o qual foi publicado no livro Das Private Wissen des Richters [1]. Embora produzido no final do século XIX, seu estudo ainda é fonte fundamental de referência, nos dias atuais, para a análise da matéria. As máximas de experiência são assim definidas pelo autor:
São definições ou juízos hipotéticos de conteúdo geral, desligados dos fatos concretos que se julgam no processo, procedentes da experiência, mas independentes dos casos particulares de cuja observação foram induzidos e que, além destes casos, pretendem ter validade para outros novos [2] (STEIN, 1999, p. 27, tradução nossa).
Com o objetivo de aclarar o conceito, cumpre mencionar a advertência de Friedrich Stein, no sentido de que a declaração de experiência sobre uma pluralidade de casos está longe de ser uma máxima de experiência [3]. É que esta exige mais que a mera repetição de casos, necessitando que se verifique “algo independente que nos permite esperar que os casos vindouros, ainda não observados, produzir-se-ão da mesma forma que os observados” [4] (STEIN, 1999, p. 25, tradução nossa). Somente assim pode-se fixar a máxima de que “as pessoas que se encontram em determinada situação se conduzem de maneira determinada” (STEIN, 1999, p. 25, tradução nossa) [5].
Dessa forma, é importante salientar, inicialmente, que as máximas de experiência não se referem exclusivamente às vivências pessoais do juiz. Ao contrário, as noções que expressam devem pertencer ao patrimônio comum. Significa dizer que as máximas de experiência devem tratar de fenômenos que possam ser observados por todos, mesmo que não concretamente conhecidos por todos. Deve-se, ainda, frisar que não se trata de uma simples concatenação de acontecimentos, mas da verificação do caráter genérico e abstrato de uma seqüência de fatos, capaz de conduzir ao entendimento de que a máxima seria válida para casos posteriores [6].
A partir da sistematização empreendida por Stein, podem ser fixados os pontos fundamentais para a caracterização das máximas de experiência, em seu conteúdo jurídico: a) as máximas de experiência caracterizam-se pela generalidade, podendo ser encontradas sob a forma de teses hipotéticas ou de definições que decompõem uma palavra ou um conceito em suas partes constitutivas; b) para a criação de uma máxima de experiência, sob a forma de tese hipotética, é indiferente a quantidade de casos observados, porém, os fatos devem ter algo relevante e comum que os ligue, permitindo concluir tratar-se do que ordinariamente acontece; c) as máximas de experiência devem estar submetidas a um constante processo de reformulação, a partir da observação tanto dos casos que deram origem à sua formação como dos posteriores; d) as máximas de experiência se extraem por indução e se aplicam por dedução; e) as máximas de experiência são sempre relativas, variáveis no tempo e no espaço, estabelecendo, entretanto, um juízo a priori; f) em todos os casos, as máximas de experiência admitem prova em contrário pela parte eventualmente prejudicada.
O presente artigo procura analisar as funções das máximas de experiência no campo probatório no direito processual do trabalho, o que se procede em dois itens específicos. O primeiro, relativo às funções tradicionais das máximas de experiência no campo da prova, consistentes em mecanismos para entender as alegações e depoimentos das partes, meios de apreciação do material produzido nos autos e auxílio na conexão entre indícios e fatos. O item seguinte, por seu turno, cuida das inovadoras funções das máximas de experiência, referentes a sua utilização como mecanismo para inversão do ônus da prova ou para verificação da evidência ou impossibilidade de um fato.
FUNÇÕES TRADICIONAIS DAS MÁXIMAS DE EXPERIÊNCIA NO CAMPO PROBATÓRIO
A primeira função tradicional das máximas de experiência é sua utilização pelo Juiz como mecanismo para entender e interpretar as alegações e depoimentos das partes. Essa atuação é relevante porque as máximas de experiência podem ser definições ou juízos esclarecedores sobre expressões utilizadas. Desse modo, ao interpretar as alegações das partes, o juiz levará em conta as máximas de experiência sobre o uso da linguagem. Com isso, pode compreender a definição de certas palavras em ambientes específicos ou os significados peculiares de termos segundo o lugar ou o dialeto (STEIN, 1999, p. 24).
Dispensável é lembrar que o conhecimento do significado de tais termos é essencial ao juiz para a adequada compreensão do material probatório colhido em audiência. Nesse contexto, as máximas de experiência sobre o uso da linguagem têm função fundamental, permitindo a correta compreensão dos depoimentos colhidos, bem com uma maior aproximação entre julgador e jurisdicionados.
As máximas de experiência exercem, por outro lado, papel fundamental na análise das provas apresentadas, particularmente na formação do juízo de verossimilhança, essencial para o convencimento do julgador [7]. Com efeito, um dos mais importantes momentos processuais é, sem dúvida, o da valoração da prova, feita pelo julgador com base no conjunto probatório trazido aos autos. E é justamente nesse momento que as regras de experiência atuam dentro da seqüência de raciocínio do julgador.
No sistema da persuasão racional, as máximas funcionam como critério para impedir a criação de “verdades” desvinculadas de qualquer critério de verossimilhança. Não apresentam, entretanto, caráter obrigatório e vinculante ou desvirtuador da própria apreciação. Assim, as regras de experiência atuam, dentro do sistema vigente da persuasão racional, como elemento auxiliar na análise das provas produzidas, agindo diretamente na valoração das provas pelo juiz.
Ainda dentro da aplicação tradicional das máximas de experiência no campo da prova, destaca-se a terceira função elencada, que é a ligação entre indícios e fatos. É que muitas vezes os fatos não conseguem ser demonstrados de forma direta. Tal se dá por diversas razões, principalmente a “irrepetibilidade do comportamento humano e a impossibilidade de se adentrar às conjecturas mentais de cada indivíduo ( FORNACIARI, 2004, p.24).
Nessas hipóteses de impossibilidade de verificação direta do fato, o convencimento do juiz é embasado em indícios alegados e comprovados pelas partes. Nessa conexão entre o indício e o fato a ser provado atuam diretamente as máximas de experiência, extraídas da observação, pelo juiz, do que ordinariamente ocorre em casos semelhantes [8].
Assim, as máximas de experiência atuam como elemento de ligação entre os indícios e os fatos que se deseja provar, em caso de inexistência de presunção legal incidente na hipótese. É essa, portanto, a sua terceira função tradicional no campo probatório.
FUNÇÕES INOVADORAS DAS MÁXIMAS DE EXPERIÊNCIA NO CAMPO PROBATÓRIO
Ultrapassada a análise das funções tradicionais das máximas de experiência no processo, passa-se ao estudo das funções mais atuais, consistentes na sua utilização como mecanismo para inversão do ônus da prova ou verificação da evidência ou impossibilidade de um fato.
A aplicação das máximas de experiência como critério para a análise da prova pode conduzir à inversão do ônus da prova num determinado caso concreto sob exame. Assim, se o fato apresentado é, de acordo com a observação do que ordinariamente acontece, verossímil e plausível, enquanto a tese da parte contrária é de todo inverossímil, deverá ocorrer a inversão do ônus da prova, a qual ficará a cargo da parte que alegar a tese desprovida de verossimilhança.
Atualmente, exige-se do juiz uma participação ativa diante da produção probatória. Tal postura pode até culminar com a inversão do ônus da prova. É que “um dos principais fundamentos que informa a teoria do ônus da prova é o da igualdade da posição dos litigantes no processo” (SANTOS, 2002, p. 97). Inexistindo tal igualdade material, pode-se, validamente, promover a inversão do ônus da prova, como no caso das relações de consumo, às quais se aplica o artigo 6º, inciso VIII, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, já referido.
No entanto, há outras hipóteses de desequilíbrio entre os litigantes que autorizam a inversão da atribuição do ônus da prova. Dentro desse contexto, as máximas de experiência funcionam como mecanismo de análise da verossimilhança das teses. Seu objetivo é não permitir que defesas inverossímeis funcionem como simples instrumento de negação dos fatos que ensejam o direito da parte contrária, para dificultar a tutela jurisdicional pretendida.
Diante de uma tese defensiva meramente negativa, mas com conteúdo altamente inverossímil, deverá o juiz proceder à inversão do ônus da prova, passando-a à parte que alegar a tese. Evita-se, com isso, que a dificuldade de uma parte de produzir sua prova, leve a uma decisão teratológica, fundada na rígida divisão do ônus da prova, porém contrária à observação comum.
Assim, as normas de divisão do ônus da prova, insculpidas no art. 818 da CLT e 333 do CPC, devem ser aplicadas a partir da perspectiva de que o processo tem por objetivo a pacificação [9] com justiça [10]. Nesse aspecto, as máximas de experiência funcionam como critério balizador da verossimilhança, capaz de inverter, se necessário, o ônus da prova [11].
Tema correlato ao da inversão do ônus da prova é a constatação da evidência ou impossibilidade de um fato, segunda função inovadora das máximas de experiência. Desse modo, o reconhecimento de que um fato é evidente ou, ao contrário, impossível é elemento para que se possa declarar inadmissível, porque inútil, a prova que se apresenta para demonstrar sua veracidade.
É claro que o juiz deve ter muita cautela na definição, a priori , dos fatos considerados “impossíveis” ou “evidentes”. Contudo, em situações excepcionais, pode-se dispensar a produção de provas, quando, a partir da observação do que ordinariamente acontece, a alegação dos fatos em que se funda o pretenso direito for intuitiva ou, ao contrário, de todo impossível.
Cite-se, como exemplo, a hipótese de o autor pleitear o pagamento de horas extras com base na jornada de vinte e quatro horas diárias, em todos os dias da semana, sem intervalo e sem folga, durantes meses a fio. Outro exemplo de utilização das máximas de experiência para ensejar a impossibilidade de reconhecimento de um fato é dado por Karl Larenz: “Pela experiência de funcionamento do mercado, do habitual comportamento econômico dos compradores de terrenos, o julgador sabe que estes atribuem normalmente grande importância à aptidão do terreno para construção na sua decisão de comprar e particularmente no preço oferecido”. A partir da máxima citada, o autor extrai a conclusão de que “não seria, por exemplo, aceitável que, uma vez que a aptidão de um terreno para construção foi considerada como qualidade do mesmo essencial no comércio, vir negá-lo num caso concreto” (LARENZ, 1978, p.313-315)
As máximas de experiência funcionam, portanto, como critério na análise da verossimilhança da alegação ou na verificação do caráter consagrado de determinado fato, permitindo uma mais rápida instrução e eficaz solução da lide.
CONSIDERAÇÕES FINAISApós todas as considerações precedentes, pode-se extrair a seguinte síntese das idéias desenvolvidas:
As máximas de experiência são definições ou juízos hipotéticos firmados pela observação de casos singulares. Todavia, são alçadas à condição de princípios autônomos, podendo ser utilizadas nas demais hipóteses assemelhadas.
Inúmeras funções são atribuídas às máximas de experiência no campo do direito probatório: mecanismos para que o julgador possa entender e interpretar as alegações e depoimentos das partes; instrumentos para apreciação dos meios probatórios; elementos de conexão dos indícios com os fatos; meios de determinação da impossibilidade ou evidência de um fato e subsídios para a inversão do ônus da prova.
As três primeiras funções mencionadas constituem as aplicações tradicionais das máximas de experiência no campo da prova. Nesse aspecto, as máximas de experiência, dentro do sistema da persuasão racional, funcionam como instrumento para promover o adequado entendimento das formulações das partes e testemunhas. Além disso, constituem meio para a valoração da prova e mecanismo de conexão de indícios e fatos, sendo, dessa forma, essenciais para o convencimento do julgador.
Ainda no campo probatório, dentro da perspectiva instrumentalista do processo, as máximas de experiência são importantes para a formação do juízo de verossimilhança no julgador. São também mecanismos capazes de promover a inversão do ônus da prova em favor daquele que apresentar tese mais factível, em relação à parte adversa, se esta apresentar alegações desprovidas de plausibilidade.
As máximas de experiência também desempenham a função de verificação da evidência ou impossibilidade de um fato, contribuindo para a celeridade da instrução probatória. Nesse sentido, pela observação do que ordinariamente acontece, o juiz pode ter condições de proferir julgamento, dispensando a produção de prova do que se sabe impossível, salvo prova consistente em contrário. Com tal procedimento, abrevia-se a solução final do conflito, atendendo-se, assim, à finalidade de tempestiva pacificação social, sem prejuízo à busca da verdade.
Muito embora a CLT somente se refira às máximas de experiência em dispositivo relativo ao procedimento sumaríssimo, tal ferramenta é plenamente aplicáveis no procedimento ordinário, tendo em vista o disposto na art. 335 do CPC, de aplicação subsidiária.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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STEIN, Friedrich. El conocimiento privado del juez. 2. ed. Tradução de André de la Oliva Santos. Bogotá: Temis, 1999.
NOTAS[1] Em português: O conhecimento privado do juiz.
[2] Texto original: Son definiciones o juicios hipotéticos de contenido general, desligados de los hechos concretos que se juzgan en el proceso, procedentes de la experiencia, pero independientes de los casos particulares de cuya observación se han inducido y que, por encima de esos casos, pretenden tener validez para otros nuevos. (STEIN, 1999, p.27).[3] A observação de Friedrich Stein também é objeto de estudo da lógica. Com efeito, uma das falácias mais comuns nos processos argumentativos reside no fato de se chegar a conclusões a partir de dados insuficientes e não significativos. Assim, os casos devem ser repetidos e representativos. Outrossim, é preciso estar atento à relação de causalidade entre eles, para que se possa chegar a uma conclusão verdadeira.
[4] Texto original: Algo independiente que nos permite esperar que los casos venideros, aún no observados, se produzirão da mesma forma que os observados ( STEIN, 1999, p. 25).[5] Texto original: Las personas que se encuentran en una determinada situacíon se conducen de una manera determinada (STEIN, 1999, p. 25)
[6] O fundamento das máximas de experiência é, em última análise, a normalidade. Contudo, há que se ressaltar a advertência de Lorenzo Carnelli, no sentido de que existe não apenas uma, mas várias “normalidades”: “A normalidade será, em princípio, um termo ideal, mas na vida prática não há normalidade, senão, antes normalidades e, às vezes, normalidades aparentes ou fortuitas, matéria confusa de observação falível, para ser reduzida a cálculos não menos passíveis de erro” (CARNELLI, 1957, p.185-186).[7] Sérgio Sahione Fadel exemplifica esse juízo de verossimilhança, que atua na apreciação das provas e alegações fantasiosas das partes: “Normalmente, o devedor relapso e inadimplente cria histórias fantásticas de exigências descabidas do credor, do pagamento de juros extorsivos, de condições leoninas etc. É esse o lugar comum nas suas defesas. Ordinariamente acontece isso e, sem embargo dos depoimentos das testemunhas que“viram”ou presenciaram a transação, o juiz não as leva em conta” (FADEL, 1974, p.196).
[8] Exemplos da utilização das máximas de experiência na ligação de indícios a fatos são dados por Pontes de Miranda: “São muitas as regras de experiência comum, tais como as que se tira do fato de estar alguém com tóxicos no bolso ou em mala, ou ser traficante, ou de ser encontrado com a arma com que o suspeito teria matado ou ferido alguém, ou se nela falta uma bala, igual à encontrada, ou de estar com a mão ferida o que, na escuridão, lutou com aquele que teve de defender-se contra o furto” (PONTES DE MIRANDA, 1997, p. 280).[9] O direito processual torna o conflito procedimentado e não real, ou seja, conflito regulado, protocolado, que só pode ser tratado dentro do processo e, em princípio, a decisão final representa para as partes um poder jurisdicizado, que impede o prosseguimento do conflito.
[10] Convém assinalar, porém, que a justiça tem significado e conteúdo amplo. Na realidade, o que está muitas vezes em jogo são interesses em tese juridicamente protegidos, porém contraditórios, que exigem uma definição objetiva do critério do justo naquele caso concreto. Por outro lado, frisem-se, no conceito de justiça, suas diversas modalidades, que foram sendo teoricamente construídas no decorrer da história. Desta forma, pode-se falar em Justiça distributiva - que se relaciona à repartição dos benefícios entre os membros da sociedade; Justiça Comutativa - que governa as relações entre particulares; Justiça Geral - disciplina o dever das partes para com o todo e constitui a outra face da Justiça Distributiva e Justiça Social – que se relaciona à repartição das riquezas e às distorções sociais.[11] O direito alienígena, principalmente o alemão e o anglo-americano, fornece institutos aplicados no âmbito probatório. Muito embora não sejam especificamente estudados sob a ótica de inversão do ônus da prova, esses institutos demonstram como a aplicação das máximas de experiência permite uma melhor distribuição da carga probatória. No direito anglo-americano, o processo civil conhece a figura dos prima facie cases. Segundo Black, trata-se de instituto utilizado nos “litígios em que os fatos ocorridos revelam um grau de credibilidade tal que o antagonista fica com o encargo de produzir prova em contrário à convicção proporcionada ao julgador pela credibilidade prima facie [...]” (Apud ARAGÃO, 1984, p. 122). Também o direito alemão tem aplicado o instituto, principalmente na apuração de relações de nexo causal ou nas hipóteses em que os fatos descritos pela parte contravêm o que normalmente acontece. Nesse último caso, “sobre ela recai o ônus de comprová-los, pois em tal caso a chamada prova prima facie favorece a outra parte” (ARAGÃO, 1984, p. 124).