O Bem Jurídico-Penal Difuso

O Bem Jurídico-Penal Difuso

Em sentido amplo, bens são coisas materiais ou objetos imateriais que possuem um valor. Portanto, compreendem tudo aquilo que nos é valioso, razão pela qual são disputados e estão expostos a algum perigo.

Em sentido amplo, bens são coisas materiais ou objetos imateriais que possuem um valor. Portanto, compreendem tudo aquilo que nos é valioso, razão pela qual são disputados e estão expostos a algum perigo. Entre eles o direito seleciona aqueles que são dignos de proteção e os erige a bens jurídicos[1].

Bem jurídico, portanto, é todo aquele protegido pelo direito. Segundo conceitua FRANCISCO DE ASSIS TOLEDO, são "valores éticos-sociais que o direito seleciona, com o objetivo de assegurar a paz social, e coloca sob sua proteção para que não sejam expostos a perigo de ataque ou lesões efetivas"[2].

Nessa linha, o mencionado autor define bem jurídico-penal como "aquele que esteja a exigir uma proteção especial, no âmbito das normas de direito penal, por se revelarem insuficientes, em relação a ele, as garantias oferecidas pelo ordenamento jurídico, em outras áreas extrapenais"[3].

O referido autor ainda ensina que, mesmo em relação aos bens jurídico-penalmente protegidos, o direito penal restringe sua tutela a certas espécies e formas de lesão. Portanto, não abrange todos os bens jurídicos, nem todos os possíveis modos de agressão.[4]

Para analisar o conceito de bem jurídico-penal, devemos verificar a definição de interesse difuso dada por nosso ordenamento jurídico:

Interesses ou direitos difusos são os "transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato"[5].

Diferenciam-se dos coletivos que são os "transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base"[6].

Também não se confundem com os individuais homogêneos que são os "decorrentes de origem comum"[7] e compreendem "os integrantes determinados ou determináveis de grupo, categoria ou classe de pessoas que compartilhem prejuízos divisíveis, oriundos das mesmas circunstâncias de fato"[8].

Além da ausência de vínculo associativo, de alcançar uma cadeia abstrata de pessoas, do vínculo fático entre os titulares, os interesses difusos têm como características a ocorrência de lesões disseminadas em massa e a potencial e abrangente conflituosidade[9].

Verifica-se, portanto, que a sociedade evoluiu, transformou-se e ficou muito complexa. Com toda essa transição, houve uma avanço de novas formas de criminalidade, especialmente no tocante a interesses difusos, como os delitos econômicos e ambientais. Assim, o direito penal tradicional tornou-se insuficiente para resolver esses novos conflitos surgidos modernamente.

"A sociedade de massa trouxe fenômenos sociais e jurídicos que não poderiam ser adequadamente resolvidos dentro da legislação então vigente, fundamentada na proteção individual"[10]. Por essa razão, atualmente, a tutela penal dos interesses difusos é uma necessidade indispensável, pois visa proteger bens valiosos para a sociedade.

GIANPAOLO POGGIO SMANIO propõe a seguinte classificação de bens jurídico-penais[11]:

a) de natureza individual, "são os referentes aos indivíduos, dos quais estes têm disponibilidade, sem afetar os demais indivíduos. São, portanto, bens jurídicos divisíveis em relação ao titular". Como exemplos, podem ser citados: a vida, a integridade física, a propriedade e a honra.

b) de natureza coletiva, "que se referem à coletividade, de forma que os indivíduos não têm disponibilidade sem afetar os demais titulares do bem jurídico. São, dessa forma, indivisíveis em relação aos titulares". Estão compreendidos dentro do interesse público. Podem ser citados como exemplos a incolumidade pública e a paz pública.

c) de natureza difusa, "que também se referem à sociedade em sua totalidade, de forma que os indivíduos não têm disponibilidade sem afetar a coletividade. São, igualmente, indivisíveis em relação aos titulares". Contudo, trazem uma conflituosidade social que contrapõem diversos grupos dentro da sociedade. São exemplos o meio ambiente, as relações de consumo, a saúde pública e a economia popular.

Verifica-se, portanto, que a diferença entre os bens jurídico-penais de natureza individual e os de natureza coletiva e difusa é que estes são indivisíveis em relação aos titulares e os indivíduos não têm disponibilidade sem afetar os demais titulares, enquanto aquele é divisível e os indivíduos têm disponibilidade sem afetar os demais[12].

A distinção entre os bens jurídico-penais de natureza coletiva e os de natureza difusa é que em relação a estes há uma conflituosidade social que contrapõem os grupos dentro de uma sociedade. Na proteção ao meio ambiente, por exemplo, estão contrapostos interesses econômicos industriais e o interesse na preservação ambiental, e na proteção das relações de consumo estão contrapostos os fornecedores e os consumidores[13].

Podemos concluir então que, bem jurídico-penal difuso é aquele relevante para a sociedade, do qual o indivíduo não pode dispor sem afetar a coletividade, indivisíveis em relação aos titulares, que trazem uma conflituosidade social que contrapõem diversos grupos sociais.

BIBLIOGRAFIA

MAZZILLI, Hugo Nigro. A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo. 10.a ed. ver., ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 1998.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal, v. 1. 7.a ed. rev. e amp. São Paulo: Atlas, 1993.

SMANIO, Gianpaolo Poggio. Tutela Penal dos Interesses Difusos. São Paulo: Atlas, 2000.

TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios Básicos de Direito Penal. 5.a ed. São Paulo: Saraiva, 1999.


Notas:

[1] Francisco de Assis Toledo, Princípios Básicos de Direito Penal, p. 15-6.

[2] Princípios Básicos de Direito Penal, p. 16.

[3] Princípios Básicos de Direito Penal, p. 17.

[4] Princípios Básicos de Direito Penal, p. 17.

[5] Lei n.o 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), art. 81, parágrafo único, inc. I.

[6] Lei n.o 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), art. 81, parágrafo único, inc. II.

[7] Lei n.o 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), art. 81, parágrafo único, inc. III.

[8] Hugo Nigro Mazzilli, A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, p. 6.

[9] Gianpaolo Poggio Smanio, Tutela Penal dos Interesses Difusos, p. 27.

[10] Gianpaolo Poggio Smanio, Tutela Penal dos Interesses Difusos, p. 22.

[11] Tutela Penal dos Interesses Difusos, p. 108.

[12] Gianpaolo Poggio Smanio, Tutela Penal dos Interesses Difusos, p. 108.

[13] Gianpaolo Poggio Smanio, Tutela Penal dos Interesses Difusos, p. 108.

Sobre o(a) autor(a)
Douglas Dias Torres
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