Os limites do Ministério Público na investigação criminal

Os limites do Ministério Público na investigação criminal

Muito se tem discutido acerca da possibilidade dos membros do Ministério Público presidirem a investigação criminal, criando-se desta forma a figura do Promotor-Investigador.

Muito se tem discutido acerca da possibilidade dos membros do Ministério Público presidirem a investigação criminal, criando-se desta forma a figura do Promotor-Investigador.

Alguns defendem a possibilidade da condução da investigação criminal pelo Ministério Público, por haver previsão legal para tanto, quais sejam os arts. 129, VI da Constituição Federal e 26, I, "a" e "b" e II da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público.

Contudo, ao contrário deste entendimento, o referido dispositivo constitucional e infraconstitucional, nos prelecionam exatamente o inverso, se não vejamos:

"Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
VI - expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva." (
Constituição Federal)

"Art. 26. No exercício de suas funções, o Ministério Público poderá:

I - instaurar inquéritos civis e outras medidas e procedimentos administrativos pertinentes e, para instruí-los:

a) expedir notificações para colher depoimento ou esclarecimentos e, em caso de não-comparecimento injustificado, requisitar condução coercitiva, inclusive pela Polícia Civil ou Militar, ressalvadas as prerrogativas previstas em lei;

b) requisitar informações, exames periciais e documentos de autoridades federais, estaduais e municipais, bem como dos órgãos e de entidades da administração direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios" (Lei nº 8.625/93)

Com uma simples leitura dos dispositivos legais em epígrafe, é de se verificar que referido entendimento não encontra guarida em nosso ordenamento jurídico, pois, nota-se que o disposto no art. 26, I, a e b, aplica-se somente nos inquéritos civis, jamais aos inquéritos policiais.

Assim, sob o aspecto jurídico, as interpretações sistemática, lógica e, até mesmo gramatical do art. 129 da Magna Carta, não nos permite extrair outra conclusão, senão a de que o Ministério Público não possui poderes para a investigação criminal. O texto constitucional é claro e expresso ao indicar, como função institucional e ministerial, a promoção da ação penal pública, do inquérito civil e da ação civil pública.

Desta forma, fica evidenciada a vedação, tanto constitucional, como infraconstitucional do Ministério Público de presidir a investigação criminal, função esta privativa dos Delegados de Policia de carreira, sendo prerrogativa destes a formação do Opnio Delicti , conforme nos prescreve o art. 144, § 4º da Constituição Federal, ex vi:

"Art. 144...

§4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incubem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares."

O Ministério Público possui a garantia constitucional de requisitar, a policia judiciária, a instauração do inquérito policial, supervisionando toda a atuação da policia na tramitação deste, ou seja, atuando no controle externo da atividade policial, mas nunca como condutor da investigação criminal.

É de se notar que o Legislador constitucional não atribuiu ao Ministério Público o poder de conduzir a investigação criminal, a fim de manter o equilíbrio com as demais instituições (Polícia Judiciária, Poder Judiciário e Advocacia) envolvidas na apuração das infrações penais.

Ademais, o Ministério Público já detém o poder do Jus Puniend do Estado e admitindo ainda a possibilidade de conduzir a investigação criminal, estaríamos afrontando o princípio constitucional do devido processo legal. Sendo oportuno citar as lições de Canotilho, in, Direito Constitucional - 3ª Edição - P. 406:

O conjunto de garantias constitucionais que, de um lado, assegura, as partes o exercício de suas faculdades e poderes processuais e, de outro, são indispensáveis ao correto exercício da jurisdição. Garantias que não servem apenas aos interesses das partes, como direitos públicos subjetivos (ou poderes e faculdades processuais) destas, mas que configuram, antes de mais nada, a salva guarda do próprio processo objetivamente considerando, como fator legitimante do exercício da jurisdição).”  [1]

Além de todos os dispositivos legais aqui citados, aos quais de forma alguma asseguram o poder investigatório do Ministério Público, devemos ainda colacionar o art. 13, II do código de Processo Penal, ex vi:

"Art. 13. Incubirá ainda à autoridade policial:

II- realizar diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público”.

Destarte, por óbvio, o Ministério Público não detém o poder de conduzir a investigação criminal, possui sim a titularidade da ação penal pública, da ação civil pública e a condução da investigação do inquérito civil. Cabendo, apenas aos membros do Ministério Público requisitar à autoridade policial a realização de diligências, mas jamais como executor destas, vez que agindo desta forma, estaríamos afrontando os princípios esculpidos em nossa Magna Carta, o que não se pode admitir no Estado Democrático de Direito.

Christiano Biggi Dias


[1] CANOTINHO, José Joaquim Gomes de. Direito Constitucional, 3ª Edição – p. 406

Sobre o(a) autor(a)
Christiano Biggi Dias
Bacharel em Direito
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