Responsabilidade consumerista no âmbito do Mercosul

Responsabilidade consumerista no âmbito do Mercosul

Aborda resumidamente o conceito de consumidor e fornecedor pelos Estados-Membros do Mercosul e a disciplina da responsabilização consumerista por vício do produto no âmbito do Mercado Comum do Sul.

C om a livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os países do Mercosul, conforme convencionado no "Tratado de Assunção", em 26 de março de 1991, e em vigor desde 29 de novembro de 1991, o alcance da relação de consumo ampliou-se, de forma que o contexto internacionalizado entre fornecedor e consumidor ganhou proporções significativas, mormente quanto a responsabilização legal diante da ocorrência de defeitos e vícios que os consumidores estão sujeitos quando da relação com um fornecedor de algum dos Estados-Partes do referido Tratado, quais sejam: a República Argentina, a República do Paraguai e a República Oriental do Uruguai. Note-se, ainda, que os países envolvidos serão ampliados com a liberalização comercial a viger entre 2006 e 2010 com o Chile, Bolívia e a Comunidade Andina, conforme os acordos celebrados.

Assim, cumpre definir, previamente, quais sejam os sujeitos da relação consumerista em cada Estado. O Brasil e o Uruguai entendem que são dois: o consumidor que é qualquer pessoa, física ou jurídica, que adquira bens ou serviços, desde que seja o destinatário final, sendo que o direito uruguaio acrescenta que isto se aplica a uma relação de consumo ou em função dela. E o fornecedor, que é aquele que oferecerá os bens ou serviços ao consumidor, fruto de sua atividade produtiva, de montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização, inclusive a prestação de serviços, podendo ser pessoa física ou jurídica, pública ou privada, sendo que o Uruguai acrescenta a possibilidade de ser nacional ou estrangeira, e ao contrário do Brasil, não admitem entes despersonalizados.

Para o direito argentino e paraguaio, os sujeitos podem ser os consumidores ou usuários, que para a Argentina são as pessoas físicas ou jurídicas que contratam a título oneroso, para consumo final, ou benefício próprio ou de seu grupo familiar ou social, a aquisição ou locação de coisas móveis, a prestação de serviços e a aquisição de imóveis destinados à moradia, desde que a oferta seja pública e dirigida a pessoas indeterminadas; e os usuários, que são os destinatários do serviço público. Já para o Paraguai, consumidor e usuário, são entendidos como "toda persona física o jurídica, nacional o extranjera que adquiera, utilice o disfrute como destinatario final de bienes o servicios de cualquier naturaleza".

Noutro pólo, na Argentina, estão os fornecedores, que são todas as pessoas físicas ou jurídicas, públicas ou privadas, que, de modo profissional, ainda que ocasionalmente, produzam, importem, distribuam ou comercializem coisas ou prestem serviços a consumidores e usuários. E no Paraguai, o proveedor, entendido como "toda persona física o jurídica, nacional o extranjera, pública o privada que desarrole actividades de producción, fabricación, importación, distribución, comercialización, venta o arrendamiento de bienes e de prestación de servicios a consumidores o usuarios, respectivamente, por los que cobre um precio o tarifa".

No tocante ao defeito dos produtos, o direito pátrio sustenta-os em três formas: de criação, de fabricação e de informação. O defeito gera um potencial risco à segurança física ou psíquica do consumidor, ensejando obrigação de indenizar se este vir a se efetivar. Respondem no direito brasileiro pela ocorrência de defeitos o fornecedor real, que é o fabricante, o fornecedor presumido, que é o importador e comerciante de produto autônomo, e fornecedor aparente, ou seja, aquele que assume o produto ou serviço como seu, inserindo sua própria marca, logotipo, identificação de firma. Tal responsabilidade é objetiva e solidária, inclusive é cabível a cumulação de danos morais e materiais, salvo se comprovada culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Também respondem quanto a ocorrência de vícios, que está relacionado com a quantidade e qualidade dos bens ou serviços.

O artigo 40 da lei de defesa do consumidor da Argentina assim previa: "si el daño al consumidor resulta del vicio o defecto de la cosa o de la prestación del servicio responderá el productor, el fabricante, el importador, el distribuidor, el proveedor, el vendedor y quien haya posto su marca en la cosa o servicio. El transportista responderá por los daños ocasionados a la cosa com motivo o en ocasión del servicio. La responsabilidad es solidaria, sin prejuicio de las acciones de repeticón que correspondan. Sólo se liberará total o parcialmente quien demuestre que la causa del daño le ha sido ajena", todavia este artigo, segundo Leonir Batisti, foi vetado para evitar um aumento no preço dos produtos para que o fornecedor pudesse suportar tais ônus, e ilogicamente, porque o dispositivo não permitia excluir a responsabilidade em casos em que não havia culpa do agente.

Desta forma, a responsabilidade por danos será resolvida pelo direito comum, com a identificação da antijuridicidade, fator de atribuição, o dano e a relação de causalidade adequada. O direito consumerista paraguaio, embora omisso quanto aos vícios, deixa patente que se for encontrado produto com defeito grave ou que constitua um perigo considerável, ainda que utilizado de forma adequada, a autoridade de aplicação da lei de defesa do consumidor do Paraguai obrigará ao fabricante ou fornecedor a retirá-lo e trocá-lo ou modificá-lo, ou ainda, substitui-lo por outro produto, e derradeiramente compensar o consumidor se isto tudo não for possível. No Uruguai há responsabilidade do fornecedor, fabricante ou importador, pelo dano resultante de vício ou risco do produto ou prestação de serviço, que se resolverá pelo Código Civil. Trata-se de responsabilidade subjetiva.

Verifica-se que o CDC brasileiro ainda é referência para o Mercosul, muito embora destaque-se com louvor a expressa inclusão à categoria de consumidor as pessoas físicas ou jurídicas "nacionais ou internacionais" pelo direito paraguaio, e a responsabilização pelo dano oriundo de vício do produto ou serviço, constante na lei de relações de consumo do Uruguai.

Sobre o(a) autor(a)
Alexandre Sturion de Paula
Mestre em Direito Processual Civil pela UEL.
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