A greve da justiça estadual de São Paulo

A greve da justiça estadual de São Paulo

A greve do Judiciário é legal?

A greve dos serventuários do Tribunal de Justiça de São Paulo preocupa os escritórios de advocacia a população em geral, pois “O administrado faz jus ao efetivo funcionamento das repartições públicas, não podendo seu direito ser suprimido por GREVE de servidores.” (TRF 4ª R. – REO-MS 2002.70.08.000636-9 – PR – 1ª T. – Relª Desª Fed. Maria Lúcia Luz Leiria – DJU 18.06.2003 – p. 538).

Assim, “Não cabe ao particular arcar com qualquer ônus em decorrência do exercício do direito de greve dos servidores, que, embora legítimo, não justifica a imposição de qualquer gravame ao particular.” (STJ – RESP – 179255 – SP – 2ª T. – Rel. Min. Franciulli Netto – DJU 12.11.2001 – p. 00133), vez que “O direito de greve assegurado pela Constituição não pode ser exercitado de forma abusiva, de modo a prejudicar o particular e o público em geral.” (TRF 5ª R. – REOMS 80204 – (2001.85.00.004024-9) – SE – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Ridalvo Costa – DJU 15.10.2003 – p. 1201).

A última vez que isso ocorreu foram meses sem expediente forense, onde a Justiça que tarda, ficou totalmente inerte.

De certo que a Constituição Federal (CF) garantiu ao servidor público civil o direito à greve, nos termos e nos limites definidos em lei complementar (art. 37, VII). Posteriormente, a Emenda Constitucional (EC) 19/98, alterou a expressão “lei complementar” por “lei específica”.

O Supremo Tribunal Federal (STF), por diversas vezes, entendeu tratar-se o art. 37, VII, de norma de eficácia limitada, absolutamente dependente de legislação ulterior, porque a CF deixa claro que o direito será exercido “nos termos e limites definidos em lei complementar” (hoje específica), pois não se tem, em tal caso, norma de eficácia contida ou restringível, mas, na verdade, norma de eficácia limitada ou reduzida. Assim, o direito de greve dos servidores públicos ainda não seria válido no país, uma vez que não editada até a presente data a respectiva lei regulatória. (ADIn 339/RJ, de 17.07.1990, no MI 20/DF, de 01.05.1994 e também no MI 438/GO, de 11.11.1994). (Nota em itálico entre parênteses nossa).

Portanto, “O preceito constitucional que reconheceu o direito de greve ao servidor público civil constitui norma de eficácia meramente limitada, desprovida, em conseqüência, de auto-aplicabilidade, razão pela qual, para atuar plenamente, depende da edição da lei complementar (hoje específica) exigida pelo próprio texto da Constituição. A mera outorga constitucional do direito de greve ao servidor público civil não basta ante a ausência de auto-aplicabilidade da norma constante do art. 37, VII, da Constituição – para justificar o seu imediato exercício. O exercício do direito público subjetivo de greve outorgado aos servidores civis só se revelará possível depois da edição da lei complementar (hoje específica) reclamada pela Carta Política. A lei complementar (hoje específica) referida que vai definir os termos e os limites do exercício do direito de greve no serviço público constitui requisito de aplicabilidade e de operatividade da norma inscrita no art. 37, VII, do texto constitucional.” (STF – MI 20 – DF – T.P – Rel. Min. Celso de Mello – DJU 22.11.1996; No mesmo sentido: STF – MI 20.4 – DF – TP – Rel. Min. Celso de Mello – DJU 22.11.1996 e ST 91/108). (Notas em itálico entre parênteses nossas).

Posteriormente o STF, por decisão proferida pelo Tribunal Pleno, firmou entendimento de que o inciso VII do art. 37 da CF é norma de eficácia limitada, dependente, portanto, de edição de Lei específica para complementar o seu conteúdo normativo (MI 20-DF, Relator Ministro Celso de Mello, DJU/I de 22/11/96).

Em outras palavras, ”O direito de greve do servidor público é previsto constitucionalmente (art. 37, inc. VII). Contudo, esse comando normativo é de eficácia contida, dependendo de norma regulamentadora, sem a qual qualquer movimento de paralisação do serviço público poderá ser considerado ilegal, (...). Com efeito, até o momento não há, no nosso ordenamento jurídico, qualquer Lei que regule o exercício do direito de greve em questão, (...)”. (TRF - 2ª R. – AMS 2001.02.01.020195-6 – RJ – 1ª T. – Rel. Juiz Luiz Antonio Soares – DJU 17.06.2003 – p. 104). (Grifo nosso).

O STF entende que o direito de greve do servidor público civil ainda continua dependendo de regulamentação, já o STJ (Superior Tribunal de Justiça) entende que esse direito pode ser exercitado amplamente enquanto não for regulamentado o inciso VII do art. 37 da CF, o que não importa na paralisação dos serviços sem o conseqüente desconto da remuneração relativa aos dias de falta ao trabalho, à míngua de norma infraconstitucional definidora do assunto. (STJ – ROMS 15662 – PR – 6ª T. – Rel. Min. Vicente Leal – DJU 07.04.2003).

Assim, “Subsiste a ilegalidade da greve de servidores públicos enquanto não se lhe estabelecerem, por meio de Lei específica, as condições e restrições para seu efetivo exercício, a rigor do que dispõe o art. 37, VII da CF/88, alterado pela EC nº 19, de 1998. 3. Tendo os servidores públicos faltado ao serviço em virtude de adesão ao movimento grevista, afigura-se incensurável o desconto dos dias de paralisação.” (TRF - 1ª R. – AMS 01259303 – MT – 1ª T.Supl. – Rel. Juiz Conv. Francisco de Assis Betti – DJU 17.10.2002 – p. 114). (Grifo nosso).

Assim sendo, o exercício do direito de greve pelos servidores públicos civis somente se revestirá de legalidade após a edição de Lei específica que defina os termos e limite desse direito, revelando, ainda, a legalidade do desconto dos dias não trabalhados pelos servidores em greve.” (TRF - 1ª R. – AG 01000218934 – AP – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Eustaquio Silveira – DJU 29.10.2002 – p. 186).

Portanto, mesmo que a greve seja reconhecida como legal, ainda assim é correto o desconto dos dias paralisados: “Não obstante a legalidade da greve, cujo direito decorre de um princípio constitucional, afigura-se legítimo o desconto dos vencimentos relativos aos dias parados porque previsto em Lei.” (TJPR – Mand Seg 0114277-2 – (5383) – Curitiba – O. Esp. – Rel. Des. Ulysses Lopes – DJPR 17.06.2002). No mesmo sentido:

“(...) O direito de greve, nos termos do art. 37, VIII, da CF/1988, é assegurado aos servidores públicos, porém não são ilegítimos os descontos efetuados em razão dos dias não trabalhados, uma vez que seu exercício não pode importar no sacrifício dos direitos subjetivos dos administrados, imposição do princípio da continuidade do serviço público. (TJES – AC 024980191316 – 2ª C.Cív. – Rel. Des. Jorge Góes Coutinho – J. 01.10.2002).

Em relação aos trabalhadores do setor privado existe lei regulamentando a greve, mas a Lei Federal nº 7.783/89 não é aplicável aos servidores públicos, vez que o art. 16 reza que: “Para os fins previstos no art. 37, VII, da CF, lei complementar definirá os termos e os limites em que o direito de greve poderá ser exercido.” E, por tratar-se de matéria complexa, que importa na identificação das atividades mais essênciais do serviço público, dos limites de uma eventual paralisação e a conciliação do direito de greve do servidor público civil com os princípios da continuidade e regularidade da Administração Pública, que não estão previstos na apontada Lei Federal.” (TJES – MI 100020010680 – TP – Rel. Des. Sérgio Luiz Teixeira Gama – J. 03.10.2002).

A finalidade da Lei regulamentadora é definir os limites do exercício regular desse direito, pois “O exercício do direito de greve, garantia constitucional assegurada aos servidores públicos, há de preservar a continuidade do serviço, sob pena de inconstitucionalidade do movimento grevista.” (TRF - 3ª R. – REO-MS 242655 – (2002.61.19.003150-3) – 6ª T. – Rel. Des. Fed. Mairan Maia – DJU 13.06.2003 – p. 400).

Preocupante aos advogados são os prazos para a prática dos atos processuais durante a greve do Judiciário, pois nem sempre o juízo aceita a alegação de que a deflagração da greve do Judiciário o impediu ou dificultou a praticar o ato (STJ – AGA 433309 – SP – 3ª T. – Rel. Min. Castro Filho – DJU 23.09.2002), trazendo, assim, prejuízos incomensuráveis aos advogados e ao seus clientes. Senão vejamos:

“(...) 1. Correta decisão do MM. Juiz a quo que não recebeu apelação interposta após o transcurso do prazo legal, vez que não restou demonstrada a paralisação dos serviços cartorários, nem motivo de força maior, apto a justificar a apresentação extemporânea do recurso. (...).” (TRF 1ª R. – AG 01000234288 – PA – 1ª T. – Rel. Des. Fed. José Amilcar Machado – DJU 19.05.2003 – p. 59).”

“(...) 1. Segundo precedentes desta Corte Regional incumbe à parte provar o motivo de não ter realizado o ato processual dentro do prazo legal, em razão de justa causa, a teor do art. 183 do CPC. 2. Não se verifica, no presente caso, a prova da greve realizada pelos servidores do Judiciário que impediu a parte de praticar o ato processual no prazo legal. (...).” (TRF 1ª R. – AG 01000195910 – BA – 5ª T. – Relª Desª Fed. Selene Maria de Almeida – DJU 10.07.2003 – p. 102).”

Pois em juízo não basta alegar, vez que “(...) Compete à parte comprovar, mediante certidão do setor competente, os dias em que não houve expediente forense em razão do movimento paredista, uma vez que a greve não atinge, de forma uniforme, a todos os órgãos do Poder Judiciário, nem paralisa as atividades de todos os setores de um mesmo órgão. Ausente a comprovação do nexo causal entre a interposição extemporânea do recurso e o movimento grevista, ressai a intempestividade do recurso interposto. (TST – ROAR 59966 – SBDI 2 – Rel. Min. Emmanoel Pereira – DJU 13.06.2003).” No mesmo sentido: TRF 2ª R. – AG 2002.02.01.034581-8 – RJ – 1ª T. – Relª Juíza Regina Coeli M. C. Peixoto – DJU 09.12.2002 – p. 251 e TRF 1ª R. – AG 01000244035 – GO – 2ª T. – Rel. Juiz Conv. Velasco Nascimento – DJU 18.12.2002 – p. 114.

Do mesmo modo “A greve dos serventuários da Justiça não serve para justificar o não comparecimento do advogado à sessão de julgamento (...)” (STF – HC 73.669 – MS – 2ª T. – Rel. Min. Carlos Velloso – DJU 23.08.1996). No mesmo sentido: TRT 23ª R. – RO 00250.2002.005.23.00-6 – (2552/2002) – TP – Rel. Juiz João Carlos – DJMT 07.11.2002 – p. 27.

Concluindo, a greve do Judiciário, embora seja um direito constitucional e contenha reivindicações legítimas, se não for feita de modo a não paralisar a prestação jurisdicional, ocasionará enormes transtornos e prejuízos à população, em especial aos advogados que terão que ficar de prontidão nos fóruns para não prejudicarem seus clientes, o que aumentará, diariamente e enormemente, a quantidade de pessoas nas dependências do fórum.

Sobre o(a) autor(a)
Marcio Adriano Caravina
Advogado em Presidente Prudente/SP, Coordenador do Projeto A OAB Vai a Escola e Presidente da Comissão de Informática Jurídica da 29ª Subsecção da OABSP.
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