Do testemunho no processo administrativo disciplinar federal

Do testemunho no processo administrativo disciplinar federal

O Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União traz no seu art. 155, que durante a instrução do processo disciplinar, a comissão processante promoverá a tomada de depoimentos, acareações, investigações e diligências cabíveis.

O Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União [1] traz no seu art. 155, que durante a instrução do processo disciplinar, a comissão processante promoverá a tomada de depoimentos, acareações, investigações e diligências cabíveis, objetivando a coleta de provas, recorrendo, quando necessário, a técnicos e peritos, de modo a permitir a completa elucidação dos fatos.

Já o caput do art. 156 da Lei n.º 8.112/90 estabelece que a comissão de disciplina deverá citar pessoalmente o acusado sobre o processo administrativo disciplinar contra o mesmo instaurado, indicando o horário e local de funcionamento da comissão, de modo a assegurar-lhe o direito de acompanhar o processo desde o início, pessoalmente ou por intermédio de procurador legalmente constituído, arrolar e reinquirir testemunhas, produzir provas e contraprovas e formular quesitos, quando se tratar de prova pericial, bem como requerer diligências ou perícias.

Se o acusado, regularmente citado pela comissão disciplinar, não comparecer para exercer o direito de acompanhar o processo disciplinar, os trabalhos de instrução, na fase do inquérito administrativo a que se refere o inc. II do art. 151 da Lei n.º 8.112/90, prosseguirão sem a sua presença, por ser tal acompanhamento um direito que o acusado pode renunciar tácita ou expressamente, sem prejuízo do direito de defesa, que pode ser amplamente exercido no momento próprio, conforme assinala a Lei n.º 8.112/90, art. 161, § 1º.

Determina o art. 156, § 1º da Lei n.º 8.112/90 que o presidente da comissão disciplinar poderá motivadamente denegar pedidos considerados impertinentes, meramente protelatórios, ou de nenhum interesse para o esclarecimento dos fatos. “Se a decisão for de indeferimento, é salutar que se faça a devida motivação, sob pena de ferir mortalmente o processo”, [2] chama atenção o Professor Léo da Silva Alves. Quando houver dúvida sobre o pedido, é salutar que o presidente da comissão disciplinar devolva ao acusado o respectivo pedido, solicitando que o mesmo revele o interesse para o esclarecimento dos fatos.

Será indeferido pelo presidente da comissão pedido de prova pericial, quando a comprovação do fato independer de conhecimento especial de perito, como assim revela a Lei n.º 8.112/90, art. 156, § 2º.

O art. art. 157, caput, da Lei n.º 8.112/90, determina que:

As testemunhas serão intimadas a depor mediante mandado expedido pelo presidente da comissão, devendo a segunda via, com o ciente do interessado, ser anexada aos autos”. (Grifo nosso)

Essas testemunhas deverão ser intimadas a depor com, no mínimo, três dias úteis, conforme consagra o art. 26, § 2º da Lei n.º 9.784/99 [3], subsidiária da Lei 8.112/90. Léo da Silva Alves [4] defende que a expressão “intimar”, utilizada no processo disciplinar está tecnicamente imperfeita, haja vista que o instituto está de desacordo com a natureza do ato que ele representa. O autor leciona que a testemunha deveria ser notificada e não intimada para prestar depoimento. Luiz Augusto Paranhos Sampaio [5] ensina que “intimar” vem do latim “intimare”, etimoligacamente, significa “interpelar”, “notificar”. José Armando da Costa ao falar das espécies de atos de comunicação sustenta que “Em sentido jurídico-processual mais acurado e dentro de rigorosa técnica terminológica, deveriam ocorrer no processo disciplinar as seguintes comunicações: a) Citação, que deveria ser elevada a efeito uma vez apenas, logo após a publicação da portaria instauradora do processo, a fim de que, com a ciência do acusado, fosse validamente formada a relação processual disciplinar; b) Notificação, que seria realizada, por várias e necessárias vezes, para dar ciência ao acusado sobre as diligências que iriam ser providenciadas pela comissão; e c) Intimação, que deveria ser dinamizada para dar conhecimento ao imputado a respeito das acusações articuladas na instrução com vista à preparação da defesa escrita, a qual deverá ser oferecida dentro do prazo regulamentar”. [6]

Durante toda a fase de instrução, o acusado ou seu procurador deverá ser notificado da intimação das testemunhas para que possam exercer o direito de acompanhar os depoimentos.

Para o Professor Antônio Carlos Palhares Moreira Reis [7] ao existir mais de um procurador constituído nos autos, a intimação de um deles apenas é bastante para caracterizar a comunicação dos atos processuais.

Segundo determinação do Código de Processo Penal – CPP em seu artigo 206, a testemunha, quando for servidor público, não poderá eximir-se da obrigação de depor, podendo recusar-se a fazê-lo o ascendente ou descendente, o afim em linha reta, o cônjuge, ainda que desquitado, o irmão e o pai, a mãe, ou filho adotivo do acusado, salvo quando não for possível, por outro modo, obter-se ou integrar-se à prova do fato e de suas circunstâncias.

Por outro lado, quando a testemunha for uma pessoa estranha ao serviço público será solicitado seu comparecimento para prestar esclarecimentos sobre os fatos objeto do processo administrativo disciplinar que o mesmo tiver conhecimento. Essa regra vale, também, para o servidor público aposentado.

É de bom alvitre, se mencionar que não existe no Direito Administrativo Disciplinar uma determinação legal que possa obrigar uma testemunha de fora do serviço público atuar como testemunha. Não há também nenhuma disposição da lei que estabeleça a previsão da condução forçada por parte do particular. Ivan Barbosa Rigolin defende que o Administrador Público não tem o poder de obrigar uma pessoa estranha ao serviço público a testemunhar em um processo administrativo disciplinar, com essas palavras: “... o caso do processo administrativo disciplinar, onde a autoridade pode apenas convidar, solicitar que compareça, mas nunca obrigar nem impor comparecimento”. [8]

Léo da Silva Alves pensa diferente, quando defende que a obrigação de depor se estende ao particular e justifica:

Todo processo, judicial ou administrativo, tem de ser pautado pela busca da verdade e pelo alcance da justiça. Não se pode deixar uma instrução mal feita; não se pode apenar um inocente; não se pode patrocinar a impunidade sob o pretexto de que a prova encontra-se no conhecimento do particular, fora do alcance da Administração Pública. A cidadania tem direitos e tem deveres. Assim como o homem tem o dever de alistamento eleitoral e de alistamento militar, o cidadão tem a obrigação de contribuir com a promoção da justiça, onde ela esteja em jogo, por ser valor de ordem pública”. [9]

Ao tratar desse assunto da obrigação do particular em depor, vimos na prática que se torna inviável conduzir com eficiência um processo administrativo disciplinar sem a participação dessa testemunha, quando a verdade pode estar em suas declarações para a comissão processante. Advogado que haja uma alteração no parágrafo único do art. 157 da Lei Nº 8.112/90 acrescentando-se ao texto existente a obrigatoriedade do testemunho de particulares.

O presidente da comissão processante deverá advertir a testemunha sobre o cometimento do crime de falso testemunho tipificado no art. 342 do Código Penal - CP. Aliás, o art. 342 do CP foi alterado pela Lei n° 10.268 [10], de 28 de agosto de 2001, in verbis:

Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral”.

O presidente deverá, também, alertar o depoente das hipóteses de suspeição ou impedimento previstas em lei, especialmente se é amigo íntimo ou inimigo capital do acusado, conforme estabelece o art. 210 do Código de Processo Penal - CPP. Esses atos deverão ser feitos antes de se iniciar a inquirição da testemunha.

Júlio Fabbrini Mirabete assim sintetiza o seu pensamento sobre as advertências às testemunhas:

As testemunhas serão ouvidas cada uma separadamente das outras, a fim de que não se influenciem com os depoimentos anteriores. A falta de incomunicabilidade entre elas, porém, é mera irregularidade. Dever da testemunha é o de prestar um depoimento verdadeiro. O testemunho pode ser falso porque: o depoente afirma algo que não corresponde à verdade; o depoente nega ter conhecimento daquilo que sabe; o depoente oculta a verdade, não a afirmando ou negando. Para evitar o falso testemunho à lei determina que o juiz advirta o depoente sobre as penas aplicadas ao falso testemunho. O informante, porque não presta compromisso de dizer a verdade, não comete o crime previsto no artigo 342 do Código Penal”. [11]

O depoimento será prestado oralmente e reduzido a termo, não sendo lícito à testemunha trazê-los por escrito, sendo permitido breves consultas a apontamentos, é assim que se encontra, no art. 158 da Lei n.º 8.112/90.

Quando houver contradição entre depoimentos das testemunhas deverá ser feita uma acareação entre os depoentes, como está no § 2º do art. 158 da Lei n.º 8.112/90.

O art. 159, § 2º da Lei n.º 8.112/90 preconiza que:

O procurador do acusado poderá assistir ao interrogatório, bem como à inquirição das testemunhas, sendo-lhe vedado interferir nas perguntas e respostas, facultando-se-lhe, porém, reinquiri-las, por intermédio do presidente da comissão”.

No final da inquirição o depoimento deverá ser assinado pela testemunha ouvida, pelo trio disciplinar e pelo acusado e seu procurador, se presentes. Todas as folhas do depoimento deverão ser rubricadas por todos os presentes.



[1] Lei N° 8.112 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, das Autarquias e das Fundações Públicas, de 11 de dezembro de 1990).

[2] ALVES, Léo da Silva. Prática de processo disciplinar. Brasília: Brasília Jurídica, 2001, p. 207.

[3] Art. 26, § 2º da Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999, pertencente ao Capítulo IX – Da Comunicação dos Atos, reza:

Art. 26 - O órgão competente perante o qual tramita o processo administrativo determinará a intimação para ciência de decisão ou a efetivação de diligência.

§ 1º- omissis

§ 2º- A intimação observará a antecedência mínima de três dias úteis quanto à data de comparecimento.

[4] ALVES, Léo da Silva. Prática de processo disciplinar (n. ii), p. 166.

[5] SAMPAIO, Luiz Augusto Paranhos. Processo administrativo. Goiânia: AB, 2000, p. 68.

[6] COSTA, José Armando da. Teoria e prática do processo administrativo disciplinar. Brasília: Brasília Jurídica, 1999, pp. 142-143.

[7] REIS, Antônio Carlos Palhares Moreira. Estudos de direito constitucional e de direito administrativo. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2001, p. 75.

[8] RIGOLIN, Ivan Barbosa. Comentários ao regime único dos servidores públicos civis. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 264.

[9] ALVES, Léo da Silva. Prática de processo disciplinar (n. ii), p. 167.

[10] Altera dispositivos do Decreto-Lei no 2.848, de 07 de dezembro de 1940 - Código Penal.

[11] MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de processo penal interpretado: referências doutrinárias, indicações legais, resenha jurisprudencial: atualizado até abril de 1999. São Paulo: Atlas, 1999, p. 291.

Sobre o(a) autor(a)
João Barbosa Martins
Funcionário Público
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