Queremos pagar mais imposto de renda

Queremos pagar mais imposto de renda

Muitas vezes pagamos várias vezes por produtos não recebidos. Exemplificando, pagamos ao governo federal, estadual e municipal por saúde e educação, mas não os recebemos de nenhum destes vendedores.

A pouca vontade de pagar impostos parece estar na natureza humana tanto quanto o instinto de reprodução. Muito embora conheça diversas pessoas que se abstenham em relação ao instinto de reprodução e acredite que comumente é plenamente verdadeiro o ditado que diz que “toda regra tem sua exceção”, ainda não tenho notícia de qualquer registro de alguém que contrarie a primeira regra: não se gosta de pagar impostos.

Pagamos impostos porque a priori não temos escolha. É necessária a contribuição de todos os membros da sociedade para que o governo possa reverter benefícios para a sociedade como um todo. Mas embora todos nós, ou quase todos, saibamos dessa realidade, gostaríamos que os demais colaborassem por nós, permitindo que pudéssemos nos livrar desse desagradável encargo.

À vista destes fatos e do título deste artigo, deve estar o leitor duvidando da sanidade mental do autor, mas espero poder comprovar que, mesmo afirmando que “queremos pagar mais imposto de renda”, encontro-me ainda no perfeito gozo de minha lucidez.

O Brasil, notório por diversos aspectos, como por exemplo o carnaval, o carnaval e o carnaval (não é tão fácil encontrá-los, mas que eles existem, existem), nunca teve dentre seus aspectos notórios e/ou notáveis uma justa e eficiente tributação, principalmente sobre a renda.

Enquanto no Brasil a tributação sobre a renda representa uma parcela quase pífia da arrecadação, na quase totalidade dos países desenvolvidos a tributação sobre a renda representa a parcela mais significativa da dos valores auferidos pelo governo a título de impostos. Mas, ao contrário de tantos adeptos de importação de “soluções pré-fabricadas”, não defendo que devamos proceder de determinada maneira tão-somente porque a maioria das pessoas, no caso países, o faz. Contudo, se a experiência apresenta-se bem sucedida para a maioria dos que a implementam, passa esta a merecer, no mínimo, uma análise mais crítica

Dentre as funções do Estado moderno encontram-se a de prover, para a população, saúde, acesso à educação, segurança, dentre outros. Como pagamos nossos impostos para que o Estado possa cumprir suas funções, na verdade estamos pagando por saúde, educação, segurança, conservação das estradas, etc, todavia o Estado-governo, talvez devido à sua pouca idade e maturidade, encontra-se em um estado de irresponsabilidade adolescente e vem se esquecendo de entregar os “produtos” que nos vende.

Como não temos a opção de deixar de adquiri-los do governo, nem tampouco é razoável que vivamos sem estes “produtos”, ao não nos entregar o Estado o que foi por nós adquirido, somos compulsoriamente compelidos a adquiri-los novamente.

Pagamos impostos para que o governo proporcione educação, mas se quisermos conceder a nossos filhos uma educação que respeite o nome que recebe, temos que pagar novamente por isso.

Concedemos ao governo recursos para que este possa proporcionar-nos saúde, mas se quisermos minimizar a possibilidade de entrarmos andando em um hospital e dele sairmos carregados, não podemos contar com a rede pública, no mínimo teremos que contratar um plano de saúde.

Confiamos valores ao governo para que esta possa nos prover segurança, mas, como isso não ocorre, temos que contratar vigilantes e instalar sistemas de segurança no condomínio no qual residimos ou na empresa na qual trabalhamos, temos que pagar seguro de automóveis e residencial em valores mais consideráveis devido ao alto índice de furtos e roubos de veículos, temos que despender recursos com blindagem de veículos para reduzir o risco sermos assaltados e/ou seqüestrados. Somos também levados a contratar serviços que conduzem nossos filhos à escola e os trazem porque estes, com certeza, algum dia terão no mínimo seu tênis roubado caso façam este trajeto em transporte coletivo.

Incumbimos ao governo conservar nossas estradas, mas temos que arcar com todos os custos de danos provocados pela situação em que estas se encontram, além de pagarmos mais caro pelos “produtos” que compramos, que tem seu valor majorado para cobrir os custos advindos do transporte por estas “Highway’s”.

Se formos analisar mais amplamente, muitas vezes pagamos várias vezes por “produtos” não recebidos. Exemplificando, pagamos ao governo federal, estadual e municipal por saúde e educação, mas não os recebemos de nenhum destes vendedores.

Os recursos recebidos pelo governo e que deveriam ser aplicados em educação, saúde, segurança, etc., são na verdade despendidos, em sua maior parte, em atividades-meio, e não se pretende aqui culpar funcionários públicos.

Fazendo um paralelo, o governo comporta-se como um restaurante que possui 30 cozinheiros e apenas um garçom. Os serviços prestados são de péssima qualidade enquanto os preços cobrados apresentam-se exorbitantes. Somente há duas soluções possíveis, ou demite-se a maioria dos cozinheiros, de modo que seja reduzido o custo do restaurante e, conseqüentemente, os preços praticados no mesmo, ou contrata-se mais garçons, de modo sejam os serviços prestados com qualidade ao menos razoável.

O grande problema da primeira alternativa é que, no Brasil, reduzir a massa de cozinheiros apresenta-se constitucionalmente quase impossível, estimular que se aposentem não resolve em nada o problema, visto que se continua a pagar a eles o mesmo salário.

Resta então a segunda, a de contratar-se mais garçons, ou seja, saindo do paralelo, possibilitar que tenha o governo mais recursos para investir em sua atividade-fim, a saúde, a educação, a segurança etc.

Essa solução seria absolutamente inviável se já não estivéssemos pagando novamente pelos mesmos serviços que não nos são prestados.

Essa forma de prestação ineficiente de serviços públicos tornou-se um modo maléfico de cobrar maior “imposto de renda” de quem tem maiores rendimentos, explica-se: Quanto maior o poder aquisitivo, maior o gasto duplo com “produtos essenciais”. Por outro lado, quanto menor o poder aquisitivo, menos se vive, posto que se deixa de comprar “produtos essenciais”, criando-se até um contra-senso, como podem viver pessoas que não conseguem acessos a produtos, tais como saúde, educação, segurança, dentre outros, essenciais a uma vida digna?

Na verdade pagamos muito mais “impostos” do que somos capazes de imaginar, a “carga tributária” em relação ao PIB é proporcionalmente muito maior do que apresentam os dados econômicos.

Quando, após termos pago ao governo por algo que este deveria e não nos oferece, somos levados a adquirir estes “produtos” de terceiros, os valores despendidos nessa nova aquisição representam, para quem os paga, uma tributação adicional sobre a renda.

Queremos pagar mais imposto de renda, na verdade queremos pagar o mesmo que já pagamos (ao governo e a terceiros), desde que seja melhor utilizado do que hoje o é.

Talvez não deva falar por todos, então falo por mim: Quero pagar mais imposto de renda, porque acredito que o governo é capaz de administrar tais recursos de modo mais eficiente do que o que hoje ocorre. E, antes que me esqueça, também acredito em Papai Noel.

Sobre o(a) autor(a)
Dênerson Dias Rosa
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