Do dano moral e seus reflexos na discriminação homossexual

Do dano moral e seus reflexos na discriminação homossexual

Trata dos danos morais e a sua aplicação nas questões de discriminação homossexual.

O dano moral tem status constitucional garantido pelo art. 5º, incisos V e X da Constituição Federal, assegurando sua reparação quando do ato ilícito decorrer agravo à honra e à imagem ou a violação à intimidade e à vida privada.

O conceito pode ser buscado na jurisprudência pátria, in verbis: “O que o constituinte brasileiro qualifica como dano moral é aquele dano que se pode depois neutralizar com uma indenização de índole civil, traduzida em dinheiro, embora sua própria configuração não seja material. Não é como incendiar-se um objeto ou tomar-se um bem, de uma pessoa. É causar a ela um mal evidente.” (STF, 2ª T., Resp 172720-9-RJ, Rel. Min. Marco aurélio, v.u., j. 6.02.1996)

Não existem valores pré-fixados para quantificar o dano moral, mas o arbitramento deve ser feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, considerando-se o nível sócio-econômico do autor e ainda o porte econômico do réu, orientando-se pelo princípio da razoabilidade, valendo-se da experiência do Magistrado, que deve atentar-se à realidade da vida e as peculiaridades de cada caso ¹.

É muito importante que seja demonstrada a condição em que ocorreu o dano moral e a conseqüência gerada, isso porque a indenização tentará quantificar o sofrimento, a mágoa, a humilhação enfrentada pelo ofendido, ou seja, todos os valores que atingiram a honra subjetiva da pessoa.

O ofendido deve ficar atento a questão das testemunhas presenciais, que apenas terão valor probatório essencial se não forem parentes, esposa, companheiro, ou seja, a testemunha não poderá ter interesse na causa, pois, se tiver, terá seu valor probante diminuído pelo magistrado, sendo ouvida apenas como “informante”.

Embora a jurisprudência tenha criado um parâmetro do que são e quais os valores do dano moral, cada caso concreto deverá ser analisado profundamente, pois aquilo que é ofensa para uma pessoa poderá não ser para outra.

É importante lembrar que o valor da indenização, em tese, além de reparar o dano moral sofrido, deveria também servir como meio de desestimular a reiteração, por parte do ofensor, da prática ofensiva. Ocorre que os valores fixados, na maioria das vezes, não atingem economicamente as Pessoas Jurídicas ofensoras, pois são quantias irrisórias. As grandes empresas, por possuírem setores jurídicos próprios, costumeiramente recorrem às instâncias superiores, protelando o julgamento definitivo do feito e, não raramente, obtendo sucesso na diminuição do valor da condenação.

No tocante às ofensas aos homossexuais, um tema bastante complexo, os tribunais pátrios têm entendido haver reais danos em alguns casos, condenando os ofensores a pagarem as indenizações devidas. Todavia, essa postura dos tribunais é vislumbrada apenas em casos extremamente peculiares, por exemplo, os que seguem:

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul condenou um ofensor a pagar indenização por danos morais por entender que ele teria ofendido verbalmente seus vizinhos pela orientação sexual (Apelação Cível 70014074132).

Também, o mesmo Tribunal, condenou uma empresa ao pagamento de danos morais por ter constrangido, perante outros 20 concorrentes, um candidato a uma vaga de emprego, por sua orientação sexual. Nota-se nesse caso que o Tribunal agiu com excelência, pois ainda majorou o valor da indenização pela capacidade econômica da empresa ofensora (Apelação Cível 70013224752).

Deve-se agir com cautela ao intentar uma demanda de reparação de danos morais por dispensa em seleção de emprego, já que o critério considerado para a contratação do empregado é discricionário, ou seja, o contratante tem a liberdade de escolha. Portanto, a petição deverá estar bem instruída, com provas cabais e testemunhas do fato ocorrido, pois a alegação em defesa da empresa será justamente a discricionariedade na escolha. E, portanto, se não existem provas suficientes o Magistrado, seguindo o princípio do livre convencimento motivado, não tem como avaliar o caso e sentenciar uma condenação ao ofensor.

O dano moral em relação às ofensas aos homossexuais, assim como qualquer assunto que engloba esse tema, necessita de aprimoramento e estudo por parte de toda a sociedade, pois o Direito não está acompanhando a evolução social, conforme demonstra o nobre Desembargador Ruiter Oliva, em processo de pretensão de guarda do filho menor movido pelo pai (autor) em face da mãe (requerida), sob alegação de que esta mantinha relações homoafetivas:

Estando a mãe em melhores condições do que o pai, defere-se a ela a guarda do filho. Um eventual relacionamento homossexual da mãe não se constitui em óbice à essa guarda, pois esse tipo de relacionamento, na consciência atual da sociedade, já não se considera atentatório a moral ou revelador de deficiência ética.²


Levando-se em consideração as sábias palavras descritas acima, resta claro que o legislador brasileiro deveria tratar do assunto com maior profundidade, dando base jurídica aos operadores do Direito, já que o atual momento da sociedade, para os mais esclarecidos, é de não aversão às relações homoafetivas.

Mister se faz esclarecer, que deve haver extremo cuidado no ingresso da demanda junto ao Poder Judiciário, pois não se pode olvidar que a reparação de “danos morais” não representa um modo de enriquecimento célere e não trabalhoso, servindo sim para evitar e reparar as verdadeiras ofensas à honra subjetiva do ser humano e os verdadeiros ofendidos.

Desse modo, cabe tão-somente ao homossexual buscar os seus direitos, mesmo que demorem em ser reconhecidos, mesmo que sejam negados pelo judiciário uma, duas e quantas vezes forem necessárias, pois como salientou brilhantemente o Ilustre Ministro Humberto Gomes de Barros: “o homossexual não é cidadão de segunda categoria. A opção ou a condição sexual não diminui direitos e, muito menos, a dignidade da pessoa humana”. ³



1 - (STJ, 4ª turma, Resp. 240.441, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, v.u. j. 25.04.2000)

2 - (Embargos Infringentes n. 265.053-1 - São Paulo - 9ª Câmara de Direito Privado - Relator: Ruiter Oliva - 19.08.97 - M.V.* 732/302/05)

3 - (STJ, Resp238715/RS, RECURSO ESPECIAL 1999/0104282-8, 3ª Turma, DJ 02.10.2006 p. 263 RIOBTP vol. 209 p. 162).

Sobre o(a) autor(a)
Bruno Reis Fernandes
Advogado, Bacharel em Direito pela PUC Campinas, Pós-Graduado em Direito Público pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus, realizou curso de extensão na Escola Paulista de Direito, Sócio do escritório Antunes, Reis, Raposo e...
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