União homoafetiva como hipótese de inelegibilidade

União homoafetiva como hipótese de inelegibilidade

Análise do ponto de vista da Filosofia do Direito no que tange a configuração da União homoafetiva como causa de inelegibilidade.

Nas últimas eleições, do ano de 2004, o Tribunal Superior Eleitoral proferiu uma decisão proibindo a candidatura da Sra. Maria Eulina Rabelo à prefeitura, pelo fato dela ter uma união homoafetiva com a atual prefeita da cidade. Tal decisão gerou uma certa inquietação no meio jurídico por seu conteúdo inédito na história do direito brasileiro. Por tal feito, podemos fazer uma análise do ponto de vista da Filosofia do Direito, abordando como a corrente positivista e jusnaturalista se portariam diante de tal situação.

Diante de um pensamento positivista, ao julgar esse caso, se veria claramente que a candidatura da prefeita não deveria ser cassada. Isto porque a lei é clara ao excluir as relações homoafetivas do ordenamento jurídico. Quanto à inelegibilidade, o art 14 § 7° diz que: São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes, consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição”. No que tange à proteção familiar o art. 226, § 3° da Constituição Federal diz que: “... é reconhecida a União Estável entre homem e mulher como entidade familiar...”. Se a Constituição Federal que é a norma máxima do ordenamento jurídico brasileiro se refere a homem e mulher é por que não considera a união estável entre homossexuais. Corroborando com a Constituição, esta o Código Civil, onde os arts. 1514 e 1565, que tratam de casamento, também fizeram menção a homem e mulher, assim como, quando se trata da União Estável (art. 1723), do concubinato (art. 1727) e da adoção (art. 1622).

Ora, o direito é norma estatal e se baseia em critérios objetivos. Se a norma trata como inelegíveis o cônjuge e os parentes consangüíneos e afins e essa mesma norma não reconhece a relação homossexual como entidade familiar, a regra da inelegibilidade não atinge, nem de maneira reflexa, candidata à prefeita, ou seja, considerando o Princípio da Legalidade, não incumbe ao intérprete ampliar o elenco de inelegibilidades, o que conduziria na interferência da vontade do legislador.

Já sob a perspectiva jusnaturalista, nota-se que neste caso deve incidir a hipótese de inelegibilidade. Isto porque, apesar de não ter normas reguladoras sobre o tema, a homossexualidade é uma realidade e as relações afetivas entre pessoas do mesmo sexo são um fato. Fazendo uma análise do art. 226 § 3° da Carta Magna percebe-se que não há a proibição expressa das uniões entre homossexuais. Este dispositivo vedaria essa possibilidade se dissesse “... é reconhecida a União Estável somente entre homem e mulher”. Destarte, há neste dispositivo uma lacuna, eis que não há norma expressa sobre este ponto específico, não existindo, portanto, a impossibilidade de ocorrência das referidas uniões estáveis entre homossexuais. Na presença da lacuna da lei e sendo constatado que estas relações tem como base, o afeto, a comunhão da vida e a intenção de constituir família há que se recorrer a analogia, aos costumes e a equidade, por isso é possível se comparar a União Estável às uniões homossexuais.

O Direito não é uma ciência exata, não é apenas aquilo que esta nos códigos, possibilitando que as regras existentes em nosso ordenamento sejam interpretadas e complementadas, objetivando amparar todos os casos concretos em consonância com as constantes modificações sociais. A Constituição diz que são objetivos fundamentais da República promover o bem de todos sem descriminações de qualquer natureza, então se as uniões homoafetivas são uma realidade que se impõe e não podem ser negadas, não há como deixar de amparar juridicamente tais situações.

No tocante a finalidade dos critérios de inelegibilidade, vê-se que eles foram estabelecidos visando impedir que se formem grupos hegemônicos nas instâncias políticas locais, rejeitando qualquer prática que possa monopolizar o acesso aos mandatos eletivos. Tratando-se de hipótese em que a candidata mantém uma relação estável de cônjuge com a atual prefeita, haveria ai a possibilidade do uso inadequado da máquina administrativa em benefício da candidatura e por isso é que deve incidir a causa de inelegibilidade.

Sobre o(a) autor(a)
Giselle Cardoso de Andrade
Estudante de Direito
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