STJ define que falta de contumácia no não recolhimento de ICMS afasta configuração de crime

STJ define que falta de contumácia no não recolhimento de ICMS afasta configuração de crime

Com base no entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do RHC 163.334, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que a falta de recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em operações próprias, quando não é contumaz, não configura comportamento criminoso.

Em consequência, o colegiado absolveu um contribuinte que, por deixar de recolher o imposto em um único mês, havia sido condenado por crime contra a ordem tributária (artigo 2º, inciso II, da Lei 8.137/1990).

A relatora do recurso especial do contribuinte, ministra Laurita Vaz, explicou que a Terceira Seção, ao julgar o HC 399.109, em 2018, pacificou o entendimento de que o não recolhimento do ICMS em operações próprias deveria ser considerado crime.

Na época, a seção entendeu que, se o fato apontado pela denúncia se enquadra na descrição do delito de apropriação indébita tributária, e não há excludente de ilicitude, é inviável a absolvição sumária do réu sob o fundamento de que a falta de recolhimento do ICMS nessas operações deveria ser considerada conduta não imputável como crime.

Contumácia e dolo

Entretanto, a ministra mencionou que o STF, em dezembro do ano passado, fixou como tese jurídica que incorre no tipo penal do artigo 2º, inciso II, da Lei 8.137/1990 o contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente de mercadoria ou serviço.

"Portanto, nos termos do atual entendimento do Pretório Excelso, inafastável a conclusão de que, conquanto o fato deletério atribuído ao ora agravante, a princípio, se subsuma à figura penal antes mencionada, a ausência de contumácia – o débito com o fisco se refere a tão somente um mês – conduz ao reconhecimento da atipicidade da conduta e, por conseguinte, à absolvição do réu", concluiu a relatora.

AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.867.109 - SC (2020/0063833-1)
RELATORA : MINISTRA LAURITA VAZ
AGRAVANTE : ANDREI DIZ ACOSTA
ADVOGADOS : CRISTIAN RODOLFO WACKERHAGEN - SC015271
RAFAELA BUENO - SC047090
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENAL.
CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. TESE DE AFRONTA AOS
ARTS. 332 E 1.022 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INOVAÇÃO NO
AGRAVO INTERNO. DESCABIMENTO. ALEGAÇÃO DE AFRONTA A
DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. INVIABILIDADE DE ANÁLISE NA
VIA DO RECURSO ESPECIAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. SENTENÇA
CONDENATÓRIA. SUPERVENIÊNCIA. QUESTÃO PREJUDICADA.
DOLO ESPECÍFICO. DESNECESSIDADE. TESES DE INEXISTÊNCIA DE
DOLO E INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. INVERSÃO DO
JULGADO. SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
ART. 2.º, INCISO II, DA LEI N. 8.137/90. NÃO RECOLHIMENTO DE
ICMS. TIPICIDADE DA CONDUTA. NECESSÁRIO COMPROVAR
TAMBÉM A CONTUMÁCIA. ENTENDIMENTO DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL PLASMADO NO RHC N. 16334/SC. CONDUTA
QUE SE RESTRINGIU AO NÃO RECOLHIMENTO DO ICMS RELATIVO
A UM MÊS (NOVEMBRO/2016). ATIPICIDADE RECONHECIDA.
PRECEDENTE. AGRAVO REGIMENTAL PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A tese de afronta aos arts. 332 e 1.022 do Código de Processo Civil,
não foi suscitada no recurso especial, constituindo inovação recursal, descabida no
âmbito do recurso interno, pela preclusão consumativa.
2. Quanto à apontada contrariedade ao art. 5.º, incisos II, XXXIX, XLVI,
LIV e LV, da Constituição da República, não incumbe ao Superior Tribunal de
Justiça, nem mesmo para fins de prequestionamento, examinar supostas ofensas a
dispositivos constitucionais, sob pena de usurpação da competência atribuída pelo
texto constitucional ao Supremo Tribunal Federal.
3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido
de que a superveniência da sentença torna superada a tese de inépcia da
denúncia.
4. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, para o
delito previsto no inciso II do art. 2.º da Lei n. 8.137/80, não há exigência de dolo
específico, mas apenas genérico para a configuração da conduta delitiva.
5. Para se alcançar conclusão distinta daquela esposada pela Corte a
quo, no tocante à alegada inexistência de dolo na conduta, seria imprescindível o
revolvimento dos fatos e provas acostados ao caderno processual, desiderato esse
inviável na via estreita do apelo nobre, a teor da Súmula n. 07/STJ.
6. A modificação do julgado, de modo a fazer incidir na hipótese a citada
excludente de ilicitude, implicaria reexame do conjunto fático-probatório acostado
aos autos, o que encontra óbice na Súmula n. 7 do Superior Tribunal de Justiça.
7. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do
HC n. 399.109/SC, pacificou o entendimento de que o não recolhimento do ICMS
em operações próprias é fato típico.
8. Todavia, o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do RHC
n. 163.334/SC, cujo acórdão ainda está pendente de publicação, fixou a seguinte
tese jurídica: "O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de
apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da
mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei nº
8.137/1990".
9. Na hipótese dos autos, portanto, inafastável a conclusão de que,
conquanto o fato deletério atribuído ao ora Agravante, a princípio se subsuma à
figura penal antes mencionada, a ausência de contumácia – o débito com o
fisco se refere a tão somente 1 (um) mês –, conduz ao reconhecimento da
atipicidade da conduta e, por conseguinte, à absolvição do Réu com esteio no
inciso III do art. 386 do Código de Processo Penal.
10. Agravo regimental parcialmente provido para absolver o Réu.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma
do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por
unanimidade, dar parcial provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Sra. Ministra
Relatora. Os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro e Antonio
Saldanha Palheiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 25 de agosto de 2020(Data do Julgamento)
MINISTRA LAURITA VAZ
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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