Comerciante tem o dever de encaminhar produto defeituoso à assistência técnica

Comerciante tem o dever de encaminhar produto defeituoso à assistência técnica

Por maioria, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o comerciante que vende um produto com defeito fica responsável por recebê-lo e encaminhá-lo à assistência técnica, independentemente do prazo de 72 horas após a compra, mas sempre observado o prazo decadencial do artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

O colegiado negou recurso apresentado pela Via Varejo contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que considerou a empresa responsável pelo encaminhamento do bem defeituoso à assistência técnica e a condenou a pagar danos patrimoniais aos consumidores, além de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 150 mil.

No recurso especial submetido ao STJ, a Via Varejo sustentou que o CDC não obrigaria o comerciante a coletar produtos com defeito nem a prestar assistência técnica no lugar do fabricante, pois este é quem possui a expertise técnica para fazer o conserto.

A empresa afirmou ainda não ter a obrigação legal de trocar mercadorias defeituosas no prazo de 72 horas, pois a legislação determinaria sua responsabilidade solidária somente se o produto, dentro da garantia, não fosse reparado em 30 dias. Por fim, pediu a redução da indenização.

Solidariedade

O relator do recurso, ministro Moura Ribeiro, lembrou que o STJ tem posição firme no sentido da responsabilidade solidária de toda a cadeia de fornecimento pela garantia de qualidade e adequação do produto perante o consumidor (AgInt no AREsp 1.183.072). Assim, respondem pelo vício do produto todos os que ajudaram a colocá-lo no mercado, do fabricante ao comerciante, passando pelo distribuidor.

Para o ministro, a solidariedade entre os integrantes da cadeia, prevista no artigo 18 do CDC, impõe à Via Varejo a obrigação de coletar e encaminhar para reparo os produtos adquiridos em suas lojas que apresentem defeitos de fabricação.

Moura Ribeiro mencionou precedente no qual a Terceira Turma estabeleceu que, havendo assistência técnica no mesmo município, o comerciante não seria obrigado a encaminhar o produto ao serviço especializado (REsp 1.411.136). Porém, segundo o ministro, tal posição deve ser revista.

Lógica de proteção

Para o magistrado, sendo indiscutível a caracterização da empresa varejista como fornecedora, nos termos do CDC, mesmo que haja assistência técnica no município, ela tem a obrigação de intermediar a reparação ou a substituição do produto – o que não significa dizer que deva reparar ou substituir o bem por seus próprios meios.

"Não deve prosperar o argumento por ela utilizado de que a intermediação dos produtos submetidos a reparo, com a coleta em suas lojas e remessa ao fabricante e posterior devolução, corresponde a medida mais gravosa ao fornecedor, se comparada à possibilidade de o consumidor encaminhar o produto diretamente ao fabricante, nas hipóteses em que assim a loja orientar", ressaltou.

O ministro destacou que a lógica do CDC é proteger o consumidor. Impedir que ele possa entregar o produto defeituoso ao vendedor para que este o encaminhe ao conserto no fabricante significaria impor dificuldades ao seu direito de possuir um bem que sirva aos fins a que se destina – comentou.

Escolha do consumidor

Segundo Moura Ribeiro, a mais recente posição da Terceira Turma sobre o tema, no julgamento do REsp 1.634.851, foi considerar que o comerciante, por estar incluído na cadeia de fornecimento, é responsável por receber os produtos que apresentarem defeito para encaminhá-los à assistência técnica, e essa obrigação não está condicionada ao prazo de 72 horas após a compra.

"Nesse julgado, ainda ficou pontuado que cabe somente ao consumidor a escolha menos onerosa ou embaraçosa para exercer seu direito de ter sanado o defeito do produto em 30 dias, podendo optar por levá-lo ao comerciante que o vendeu, à assistência técnica ou, ainda, diretamente ao fabricante", afirmou.

Ao manter a indenização coletiva de R$ 150 mil, o ministro explicou que os valores fixados a título de danos morais são baseados na análise de provas, e por isso não podem ser revistos em recurso especial, salvo quando irrisórios ou exorbitantes.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.568.938 - RS (2015/0199988-7)
RELATOR : MINISTRO MOURA RIBEIRO
RECORRENTE : VIA VAREJO S/A
ADVOGADOS : CARLOS FERNANDO COUTO DE OLIVEIRA SOUTO - RS027622
ROBERTA FEITEN SILVA - RS050739
DIOGO SQUEFF FRIES E OUTRO(S) - RS069876
LUIZ EDUARDO JARDIM VILAR - RS089217
ANDRÉ FERRARINI DE OLIVEIRA PIMENTEL - RJ184279
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
EMENTA
DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO.
RECURSO ESPECIAL MANEJADO SOB A ÉGIDE DO CPC/73.
SOLIDARIEDADE DA CADEIA DE FORNECIMENTO. ART. 18 DO CDC.
DEVER DE QUEM COMERCIALIZA PRODUTO QUE POSTERIORMENTE
APRESENTE DEFEITO DE RECEBÊ-LO E ENCAMINHA-LO À
ASSISTÊNCIA TÉCNICA RESPONSÁVEL, INDEPENDENTE DO PRAZO
DE 72 HORAS. OBSERVÂNCIA DO PRAZO DE DECADÊNCIA. DANO
MORAL COLETIVO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE.
MODIFICAÇAO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7 DO
STJ. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO
PROVIDO.
1. Inaplicabilidade do NCPC a este julgamento ante os termos do
Enunciado Administrativo nº 2 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão
de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973
(relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser
exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as
interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal
de Justiça.
2. Por estar incluído na cadeia de fornecimento do produto, quem o
comercializa, ainda que não seja seu fabricante, fica responsável,
perante o consumidor, por receber o item que apresentar defeito e o
encaminha-lo à assistência técnica, independente do prazo de 72 horas
da compra, sempre observado o prazo decadencial do art. 26 do CDC.
Precedente recente da Terceira Turma desta Corte.
3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou o
entendimento de que os valores fixados a título de danos morais, porque
arbitrados com fundamento no arcabouço fático-probatório carreado aos
autos, só podem ser alterados em hipóteses excepcionais, quando
constatada nítida ofensa aos princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade, mostrando-se irrisória ou exorbitante, o que não
ocorreu no caso. Incidência da Súmula nº 7 desta Corte. Precedentes.
4. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Após o voto do Sr. MINISTRO MOURA RIBEIRO, conhecendo em parte
do recurso especial e, nesta parte, negando-lhe provimento e o voto divergente do Sr.
Ministro Marco Aurélio Bellize, vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as
acima indicadas, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal
de Justiça, por maioria, conhecer em parte do recurso especial e, nesta parte, negar-lhe
provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Votou vencido o Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze.
Os Srs. Ministros Nancy Andrighi (Presidente), Paulo de Tarso
Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva, ressalvando seu entendimento, votaram com o
Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 25 de agosto de 2020(Data do Julgamento)
MINISTRO MOURA RIBEIRO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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