Os tributos como ferramenta da tutela dos bens ambientais

Os tributos como ferramenta da tutela dos bens ambientais

Utilizando do princípio da seletividade em favor do ambiente, o Estado estimula, com alíquota menor, a produção de produtos dentro de um padrão de sustentabilidade, desestimulando a produção de produtos nocivos ao meio ambiente com o aumento da alíquota.

O Estado tem, entre seus deveres fundamentais, o tributo, que é meio para obtenção de receitas, utilizadas por ele, para atender suas necessidades e desempenhar suas atividades, que é exigida de quem tenha gerado o tributo, fato gerador.

A definição de tributo não foi trazida pela Constituição Federal e sim pelo Código Tributário Nacional em seu artigo 3º, o qual transcrevo:

Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Da Constituição Federal extraímos a ideia de tributos como ferramenta da tutela dos bens ambientais, conforme observa-se no:

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (...)

§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. (...)

Nasce aqui, o Direito Ambiental Tributário[1], passo a seguir, tratar de alguns de seus princípios.

1. Função socioambiental da propriedade

O artigo 5º em seu § XXIII, da Constituição Federal de 1988 determina que a propriedade deve usada de forma social, isto é, ter destinação economicamente útil, fim produtivo que é a satisfação das necessidades sociais de forma a não prejudicar o meio ambiente.

Desta forma, podemos entender a propriedade sob duas óticas, a primeira é a função social consistente na necessidade da plena utilização, a fim de otimizar os recursos, fazendo com que a propriedade seja utilizada, tanto pelo proprietário como pelo possuidor; a segunda ótica é a de que a propriedade atinja os objetivos de justiça social, na busca de uma sociedade mais equilibrada e igualitária, moradia a todos.

2. Seletividade e essencialidade

Os princípios da seletividade e o da essencialidade, velhos conhecidos do direito tributário clássico, são redimensionados no direito ambiental tributário, em razão do bem tutelado, o meio ambiente ecologicamente equilibrado.

O tributo seletivo é aquele em que as alíquotas são diferenciadas em função do objeto constante na hipótese de incidência, não importa o contribuinte e sim as características do bem ou serviço que será tributado.

As alíquotas do tributo são fixadas com função ecológica, pautando-se no princípio da essencialidade, fazendo com que o produto tenha tributação acentuada de acordo com a necessidade de consumo que o mesmo exerce sobre a população, por exemplo: produtos que tem como matéria prima o fumo tem alíquota maior do que aqueles produtos que tem como matéria prima a farinha de trigo; de forma inversa os produtos que favoreçam o controle da poluição (produção orgânica, biodegradáveis, etc), acabam tendo um alíquota proporcional a proteção que  é auferida.

Utilizando do princípio da seletividade em favor do ambiente, o Estado estimula, com alíquota menor, a produção de produtos dentro de um padrão de sustentabilidade, desestimulando a produção de produtos nocivos ao meio ambiente com o aumento da alíquota.

3. Progressividade

O princípio de progressividade do tributo consiste no gradual aumento de alíquotas, na medida que se expande a base tributária, fazendo com que o contribuinte que possui melhores condições econômicas seja onerado com maior tributação.

A progressividade do imposto está prevista no inciso II, do Art. 182, da Constituição Federal que foi regulamentado pelo artigo 47 da lei 10.257/01, prevendo diferenciação dos tributos sobre imóveis urbanos e das tarifas relativas a serviços públicos urbanos, em atenção ao “interesse social”.

Um bom exemplo de aplicação da progressividade tributária é o artigo 47[2] da Lei nº. 10.257/01, que regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição, na medida em que prevê a diferenciação dos tributos sobre imóveis urbanos, bem como das tarifas relativas a serviços públicos urbanos, conforme o atendimento do “interesse social”.

Este princípio foi recentemente discutido na cidade de São Paulo em razão do projeto de lei do Vereador Paulo Fiorilo, que prevê a aplicação da progressividade principalmente nos imóveis da região central da cidade, defendendo que: “o projeto torna o IPTU mais justo, pois reduz as alíquotas nos bairros periféricos, onde há carência de infraestrutura e investimento, e a aumenta nos bairros mais valorizados[3]

Sob o prisma ambiental, podemos aplicar a progressividade nas normas de zoneamento urbano, para estimular a ocupação do solo em zonas mistas (homogêneas – residencial, comercial e industrial), incentivando o indivíduo a possuir espécies nativas em sua propriedade, oferecendo como incentivo desconto sobre o valor do IPTU.

4. Princípio do poluidor-pagador.

A ideia do princípio do poluidor-pagador foi amplamente discutido na década de 70, do século XX, tanto que na Declaração da Conferência da ONU no Ambiente Humano, realizada em Estolcomo, entre 05/16 de junho de 1972, trouxe a ideia do poluidor-pagador[4], nessa época o Brasil não tinha interesse em assinar este tratado, devido estar no início de seu processo de industrialização.

O Brasil, somente veio a assinar declaração sobre o tema quase 20 anos depois, na conferência da ECO/92 realizada no Rio de Janeiro, que consagrou o desenvolvimento sustentável, tratando no princípio 16 sobre o princípio do poluidor-pagador, o qual transcrevo:

As autoridades nacionais devem procurar promover a internacionalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais.

Ressalte-se que este princípio está amplamente agasalhado pelo §3º, da Constituição Federal, que de acordo com o processo de fabricação (não reintrodução do produto ao meio ambiente) ou de o produto não ser biodegradável, aumenta sua tributação.

Este princípio visa eliminar as chamadas “externalidades negativas” que são a produção ou o consumo de determinados bens que afetam de forma negativa os produtores/consumidores não envolvidos na compra deste bem[5].

Vale ressaltar que este princípio não cria direito ao poluidor em poluir, pois se assim o fosse bastaria degradar e depois pagar as despesas -  sofreria o meio ambiente, pois uma vez degradado jamais voltaria a ser o mesmo; na verdade postula o princípio que os custos da produção de uma atividade que causará poluição será arcado pelo poluidor[6], inclusive as despesas de prevenção, reparação e repressão da poluição.

Enfim, o princípio do poluidor-pagador determina ao Poder Público que gradue a tributação, gerando assim, duas situações: 1ª) gera incentivo as atividades (processos produtivos ou de consumos) que são “ecologicamente corretos; 2ª) gera desestimulo a atividades que empregam tecnologias atrasadas, e acabam por lesar o meio ambiente.

5. Bibliografia

Fiorillo, Celson Antonio Pacheco; Ferreira, Renata Marques. Direito Ambiental Tributário. Brasil: 3ª edição, Editora Saraiva, 2010.

Fiorillo, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. Brasil: 14ª edição, Editora Saraiva, 2013.

Lemos, Patrícia Faga Iglecias. Resíduos Sólidos e Responsabilidade Civil pós-consumo. Brasil: 2ª edição, Editora Revista dos Tribunais.

http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2227/Externalidade-negativas-ambientais-e-o-principio-do-poluidor-pagador

http://www.redebrasilatual.com.br/politica/2013/10/vereadores-de-sao-paulo-aprovam-projeto-que=altera-cobranca-do-iptu-3238.html

[1] Fiorillo, Celso Antonio Pacheco; Ferreira, Renata Marques Ferreira, DIREITO AMBIENTAL TRIBUTÁRIO, 3ª Edição, página 59: “Daí falarmos em Direito Ambiental Tributário, em que as normas fiscais deverão ser interpretadas e conformadas a partir dos critérios e princípios que estruturam o direito ambiental brasileiro em suas diferentes ramificações, e não em Direito Tributário Ambiental,

[2] “Art. 47. Os tributos sobre imóveis urbanos, assim como as tarifas relativas a serviços públicos urbanos, serão diferenciados em função do interesse social.

[3] Fonte: http://www.redebrasilatual.com.br/politica/2013/10/vereadores-de-sao-paulo-aprovam-projeto-que-altera-cobranca-do-iptu-4348.html

[4] "Recomendação sobre os princípios diretores relativos aos aspectos das políticas ambientais, sobre o plano internacional" – fonte: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2227/Externalidade-negativas-ambientais-e-o-principio-do-poluidor-pagador

[5] Na obra RESÍDUOS SÓLIDOS E RESPONSABILIDADE CIVIL PÓS-CONSUMO, Patrícia Faga Iglecias Lemos, assim ensina: “(...) estaremos diante de uma externalidade negativa toda vez que parte dos custos decorrentes da produção e do consumo de um bem forem direcionados para indivíduos alheios a esta cadeia de produção e consumo. No caso dos recursos ambientais, podemos afirmar que haverá um externalidade negativa toda vez que um impacto ambiental gerado pela produção e plo consumo não for suportado pelos agentes diretamente beneficiados pela atividade produtiva. Isso significa que os custos ambientais estarão sendo transferidos para a coletividade, tendo-se em vista que os bens ambientais são bens de uso comum do povo.

[6] Ensina Celso Fiorillo, na obra CURSO DE DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO: “Este princípio reclama atenção. Não traz como indicativo “pagar para poder poluir”, “poluir mediante pagamento” ou “pagar para evitar a contaminação”. Não se podem buscar através dele forma de contornar a reparação do dano, estabelecendo-se uma liceidade para o ato poluidor, como se alguém pudesse afirmar: “poluo, mas pago”. O seu conteúdo é bastante distinto.

Sobre o(a) autor(a)
Júlio César Poli
Advogado. Pós-graduando em Direito Ambiental Empresarial da FMU - SP
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