BB terá de indenizar empregado chamado de "desonesto e blefador"
O Banco do Brasil terá de indenizar por danos morais um empregado que
foi ofendido no curso de uma reclamação trabalhista pelo advogado
contratado pela instituição. Ao contestar a inicial da ação trabalhista
na qual eram cobradas horas extras, o advogado do banco escreveu que o
bancário mentia "descaradamente", referindo-se a ele como "desonesto,
astuto e blefador". As expressões foram riscadas do processo por ordem
do juiz da 2ª Vara do Trabalho de Mossoró (RN). Em primeira instância,
o valor da indenização foi fixado em 600 salários mínimos (R$ 144 mil).
O TRT do Rio Grande do Norte (21ª Região) manteve a sentença. O BB
recorreu ao TST, mas a Primeira Turma rejeitou o recurso (não
conheceu). Com isso, está mantida a decisão regional. O relator do
recurso foi o ministro João Oreste Dalazen.
No recurso ao TST, a defesa do BB argumentou que a instituição não
poderia ser responsabilizada pela indenização, pois não praticou nenhum
ato ilícito. Alegou ainda que o advogado, ao utilizar as expressões
tidas como desabonadoras, encontrava-se no exercício regular e
inviolável de sua profissão. Para o BB, o dano moral alegado pelo
trabalhador não decorre de relação trabalhista e sua reparação deveria
ser pleiteada por meio de ação civil contra o advogado, único
responsável pelo conteúdo de suas peças processuais.
O banco invocou o princípio da inviolabilidade do advogado previsto
na Constituição (artigo 133) e no Estatuto da Ordem dos Advogados do
Brasil. O artigo 2ª do estatuto dispõe que "no exercício da profissão,
o advogado é inviolável por seus atos e manifestações" e o artigo 7º
afirma que "o advogado tem imunidade profissional, não constituindo
injúria, difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua
parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem
prejuízos das sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos que
cometer".
Para o relator do recurso, entretanto, essa inviolabilidade não é
absoluta, "consubstanciando-se em relativa imunidade penal nos crimes
contra a honra". Dalazen explicou que, no plano civil, não se pode
eximir o constituinte (contratante) de responder por indenização em
virtude da "destemperança verbal do advogado em juízo", sob a forma de
grave ofensa moral assacada contra a parte contrária. "A bela e
espinhosa profissão de advogado não constitui para ele um 'bill of
indemnity', tampouco sinal verde para o seu cliente, sob o manto
diáfano da imunidade do causídico mandatário, forrar-se à
responsabilidade pelo ultraje à honra do antagonista perpetrado em seu
nome", afirmou Dalazen.
Na contestação, o advogado do BB afirmou que o bancário só estava
entrando com a ação trabalhista – "diga-se de passagem esdrúxula,
impertinente, desproprositada e reveladora do seu mau procedimento" -
pelo fato de ser detentor de estabilidade provisória, já que era
"atrelado a um vetusto sindicato que nunca nem nada fez pela categoria
bancária" (Sindicato dos Bancários de Mossoró e Região). "Esquece-se
que o banco pode muito bem suspender seu contrato de trabalho, adentrar
com inquérito judicial trabalhista para apuração de sua falta grave
(falsa alegação em juízo de prestação de horas extras) e após
comprovada a aludida falta, com trânsito em julgado, demiti-lo
sumariamente, como recomenda a legislação vigente. Aguardará o
reclamado o desenrolar da instrução e, tão logo comprovada a sua
litigância de má fé, providenciará o que expendeu linhas acima",
escreveu.
Ao contestar a condenação ao pagamento da indenização, o BB afirmou
que o processo tem "natureza dialética", não havendo nas palavras
"desonesto, astuto e blefador" gravidade que possa justificar a
condenação por dano moral, ainda mais quando são utilizadas pelo
advogado para exercer o seu ofício. "Não se pode negar que os espinhos
são indignos vizinhos das rosas, no entanto, estão ali no mesmo espaço,
partilhando os mesmo ramos e o mesmo tronco. Assim, tendo o processo
natureza dialética, a palavra, às vezes, pode se constituir na
manifestação das paixões, e se transmudar num compreensível espinho,
partilhando com o argumento, a igual sorte da lide".