Novo sindicato deve manter direitos e deveres de negociação coletiva firmada por antecessor
A 2ª Turma do TST decidiu que as obrigações previstas em acordo coletivo firmado entre a Associação Feminina de Educação e Combate ao Câncer (Hospital Santa Rita de Cássia), de Vitória (ES), com o sindicato que representava seus empregados devem ser mantidas pela entidade que o sucedeu, após desmembramento. Para o colegiado, a representação do sindicato mais antigo se transfere ao sindicato mais novo, ao menos em relação ao grupo desmembrado de trabalhadores.
Convenções coletivas
Na ação, movida contra o Hospital Santa Rita de Cássia, de Vitória (ES), o Sindicato dos Técnicos e Auxiliares de Enfermagem do Estado do Espírito Santo (Sitaen) pedia o pagamento de horas extras aos técnicos e auxiliares de enfermagem a partir da 10ª hora diária de trabalho, a contar de junho de 2015 - mês em que se tornou representante da categoria. Para isso, argumentou que as convenções coletivas firmadas com o Sindicato dos Estabelecimentos de Saúde do Estado do Espírito Santo (Sindhes) previam a jornada de 10X36.
Acordo
O hospital, por sua vez, apontou que um acordo coletivo firmado em fevereiro de 2013 com a entidade que representava a categoria anteriormente - o Sindicato dos Trabalhadores em Hospitais, Clínicas Médicas e Odontológicas, Laboratórios de Análises Clínicas, Patológicas e Bancos de Sangue, Filantrópicos e Privados no Estado do Espírito Santo (Sintrasades) - previa jornada de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso. Para o empregador, as obrigações estabelecidas nessa negociação coletiva, homologada judicialmente, somente poderiam ser alteradas por meio de nova convocação dos trabalhadores ou por ação rescisória.
O hospital ainda questionou a legitimidade do Sitaen, alegando irregularidades no ato de constituição da entidade.
Jornada mais vantajosa
Ao decidir sobre o caso, o juízo da 3ª Vara do Trabalho de Vitória entendeu que as negociações coletivas posteriores se sobrepunham à mais antiga e determinou o pagamento das horas adicionais. Também considerou o Sitaen legítimo para o ajuizamento da ação.
O entendimento foi mantido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (ES), que considerou que o acordo coletivo que autorizava a jornada de 12x36 fora superado pelas convenções firmadas pela nova entidade sindical, com escala mais vantajosa para os trabalhadores.
Coisa julgada
Inconformado com a decisão, o hospital sustentou, no recurso de revista, que o acordo homologado em juízo representa coisa julgada (decisão definitiva) e produz efeitos para os trabalhadores, e não para o sindicato que o firmou. Assim, reiterou que a negociação coletiva somente poderia ser rescindida por meio de ação rescisória ou alterada, conforme previsão do próprio acordo, por meio de nova manifestação da categoria.
Sucessão
A desembargadora convocada Margareth Rodrigues Costa, relatora do recurso, assinalou que os efeitos da coisa julgada são restritos às partes. Contudo, entendem-se como partes não apenas as que atuam originariamente no processo (no caso do acordo coletivo, o Sintrasades e o hospital), mas também os sucessores (o Sitaen).
Em seu voto, ela apontou que a sucessão de entidade sindical - em que a representação do grupo de trabalhadores se transfere do sindicato mais antigo ao mais novo - não elimina do mundo jurídico as obrigações firmadas anteriormente. Elas permanecem vigentes no prazo e nas condições estabelecidas no acordo judicial firmado e homologado.
Com esses fundamentos, a Turma acolheu a preliminar de coisa julgada levantada pelo hospital e extinguiu o processo, sem exame do mérito. A decisão foi unânime.
Processo: RR-1751-24.2017.5.17.0003
RECURSO DE REVISTA – VIOLAÇÃO À COISA
JULGADA – ACORDO HOMOLOGADO EM
JUÍZO – TRÍPLICE IDENTIDADE – SINDICATO
SUCESSOR – MANUTENÇÃO DOS DIREITOS E
DEVERES DO SUCEDIDO. Entende-se por
limites subjetivos da coisa julgada a
determinação das pessoas sujeitas à
imutabilidade e indiscutibilidade da sentença
que, nos termos do art. 502 do Código de
Processo Civil, caracterizam a eficácia de coisa
julgada material. Estabelece o art. 506 do CPC
que a sentença faz coisa julgada entre as
partes às quais é dada, não beneficiando, nem
prejudicando terceiro. A regra fundamental,
pois, é no sentido de que a coisa julgada, com
as características de imutabilidade e
indiscutibilidade a que se refere o art. 502 do
CPC, é restrita às partes. Entende-se, porém,
como partes, para fins de determinação dos
limites subjetivos da coisa julgada, não apenas
as que se confrontaram no processo como
autores e réus, mas também os sucessores das
partes, a título universal, o substituído, no caso
de substituição processual e, em certos casos,
o sucessor a título singular, como o adquirente
da coisa litigiosa. Na espécie, a sucessão de
entidades sindicais revela exata hipótese de
delimitação subjetiva da coisa julgada, eis que
emerge do inequívoco estabelecimento de uma
sucessão sindical, na qual a representação do
sindicato mais antigo se transfere ao sindicato
mais novo, ao menos em relação ao grupo
desmembrado de trabalhadores, eis que a
outorga do registro sindical, em detrimento da
representação mais ampla anterior, resulta na
obtenção de personalidade sindical que
assume, em lugar da outrora mandatária, a
representação da categoria, não eliminando do
mundo jurídico as obrigações firmadas pela
representação anterior, que persistirão
vigendo no prazo e nas condições
estabelecidas pela coisa julgada formada pelo
acordo judicial, em relação à categoria
profissional, ainda que desmembrada, tudo
como corolário da continuidade jurídica. Assim,
a decisão regional, ao afastar o comando da
coisa julgada por considerar o sindicato autor
como terceiro estranho à lide, sendo este
verdadeiro sucessor da entidade sindical
signatária do acordo judicial, desatende os
princípios da garantia da coisa julgada,
encerrando mácula aos arts. 103, III, do CDC e
5º, XXXVI, da Constituição da República.
Recurso de revista conhecido e provido.