Laboratório vai indenizar propagandista obrigado a provar remédios em reuniões de trabalho
A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso da Eurofarma Laboratórios S. A. contra a condenação ao pagamento de R$ 100 mil de indenização a um propagandista vendedor que era obrigado a consumir remédios de laboratórios concorrentes em reuniões de trabalho. A empresa já havia sido condenada anteriormente por dano moral coletivo em razão da mesma prática.
Degustação
Na reclamação trabalhista, o propagandista disse que havia trabalhado para a Eurofarma durante oito anos, na região de São Carlos, Ibaté e Pirassununga (SP). Segundo seu relato, nas reuniões mensais, era compelido a conseguir amostras de remédios dos concorrentes (muitos somente autorizados com prescrição médica, como antibióticos, corticoides, antialérgicos, gastrointestinais e xaropes para tosse) para que fossem degustados, com o argumento de que deveria que conhecer o sabor, o aroma e o gosto residual dos medicamentos comparados. Ele argumentava que uma “simples prática de marketing e vendas” o expunha a riscos de saúde.
Cobaias
O juízo da 2ª Vara do Trabalho de São Carlos (SP) condenou a Eurofarma ao pagamento de R$ 25 mil de indenização, e o valor foi majorado para R$ 100 mil pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP). Na avaliação do TRT, a prática da empresa, comprovada em diversos depoimentos, configura abuso, ao utilizar os empregados como cobaias.
Desprezo
Prevaleceu, no julgamento, o voto do ministro Brito Pereira pelo não conhecimento do recurso. Entre outros pontos, ele destacou que, de acordo com o TRT, a conduta da empresa revela um “total desprezo” com a dignidade humana e com a condição social dos seus colaboradores, que, “premidos diariamente pela situação econômica e pelo risco do desemprego”, se submetem a uma “condição de subserviência tão indigna e vexatória que não se deseja nem mesmo ao mais cruel dos criminosos".
Para o ministro, diante desse quadro, não se pode afirmar que a indenização deferida esteja fora dos limites da razoabilidade, da extensão do dano e da proporcionalidade, sem o reexame de todo o conteúdo da prova e de nova valoração, procedimento vedado, nessa fase processual, pela Súmula 126 do TST.
Dano moral coletivo
Em outubro de 2020, a Terceira Turma do TST condenou a Eurofarma ao pagamento de R$ 1 milhão por danos morais coletivos pela mesma prática. A ação civil pública, proposta pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) a partir da denúncia de três propagandistas de Teresina (PI), envolvia 1.500 profissionais espalhados pelo país.
Processo: RRAg-12127-42.2016.5.15.0106
RECURSO DE REVISTA. VALOR DA
INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL.
"Constatada a aparente violação do
artigo 944 do CC, dá-se provimento ao
agravo de instrumento para determinar
o processamento do recurso de
revista".
RECURSO DE REVISTA. VALOR DA
INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. O valor
da indenização por dano moral foi
fixado com base nos fatos descritos
pelo Tribunal Regional, consistentes
em que os empregados propagandistas
da reclamada, como o reclamante,
compareciam a uma reunião por mês, na
qual tinham a obrigação de "degustar
medicamentos concorrentes e os
fabricados pela reclamada, e encenar
propagandas com o gerente, na frente
dos demais" e que "todas as
testemunhas confirmaram que os
propagandistas, como o reclamante, já
degustaram medicamentos durante
reuniões, para fins de comparação com
os produtos da concorrência, o que
configura abuso por parte da empresa,
que utiliza seus empregados como
cobaias, em patente violação à saúde
e dignidade do trabalhador, ensejando
a reparação pelo dano moral. Neste
aspecto, a conduta da empresa e de
seus prepostos, ao exigir de seus
empregados - e no caso específico do
reclamante - a ingestão de
medicamentos sem prescrição médica e
sem que as condições de saúde o
exijam, revela um total desprezo com
a dignidade humana e com a condição
social dos seus colaboradores, os
quais, premidos diariamente pela
situação econômica e pelo risco do
desemprego, submetem-se a uma
condição de subserviência tão indigna
e vexatória, que não se deseja nem
mesmo ao mais cruel dos criminosos".
Diante desse quadro, não se pode
afirmar que a indenização por dano
moral deferida ao reclamante no valor
de R$ 100.000,00 (cem mil reais),
esteja fora dos limites da
razoabilidade, da extensão do dano e
da proporcionalidade, sem reexaminar
todo o conteúdo da prova e promover
uma nova valoração, procedimento
vedado nesta fase processual, nos
termos da Súmula 126 desta Corte.
Recurso de Revista de que não se
conhece.